A Adaga de Ouro - Capítulo 2
No caminho para a escola, Thomas não parava de observar as pessoas e pensar.
“Cada uma dessas pessoas tem sua própria história para contar e, apesar disso, somente observamos elas tomando seus caminhos cotidianos e seguimos com nossas vidas sem nos importar com mais nada. Vivemos de um modo um tanto egoísta. Bom, acho que falta pouco”, refletiu e em alguns minutos, chegou na escola.
O portão estava prestes a fechar, mas o segurança viu Thomas então esperou ele chegar mais perto e o advertiu:
— Dessa vez foi quase, Thomas! Você precisa aprender a ser mais responsável! — Seu tom era firme como o de um pai corrigindo o filho.
— É verdade, senhor Paul.
— Pode entrar, mas eu espero que não se repita — respondeu abrindo um sorriso meio forçado, sabendo que provavelmente seu aviso mais uma vez não seria nada eficiente.
O jovem atravessou o portão principal e antes de chegar perto do portão interno, foi interrompido novamente pelo porteiro.
— Se cuida, garoto!
— Pode deixar, tio!
Em seguida, continuou caminhando em direção ao portão interno da escola e entrou. Ali estava um corredor totalmente vazio.
“Era de se esperar”, pensou.
Todos os alunos já estavam em suas salas devido ao horário.
“Parece que vai ser assim de novo… o jeito é tentar entrar sem ser visto”
Assim, entrou sorrateiramente em sua sala buscando não ser notado, mas obviamente isso não funcionou.
A sala estava cheia e todos estavam olhando para a porta esperando ele entrar. Quando isso aconteceu:
— Hahahaha! — Gargalhadas dos alunos ecoaram por todo o recinto.
Naquele horário era para ser a aula de matemática, mas a professora estava um pouco atrasada então não havia quem pudesse intervir.
Thomas ignorou as risadas e sentou-se numa cadeira dos fundos. Para ele, esse tipo de recepção não era incomum. Na verdade, já estava até acostumado com isso.
Havia uma piada de mau gosto que todos da escola conheciam: Thomas Lange foi amaldiçoado por uma bruxa e condenado a sempre chegar atrasado. Chamavam-no de “O atrasado eterno”.
Em alguns segundos a professora chegou e vendo que todos estavam rindo, gritou:
— Silêncio!
Então todo mundo se calou, afinal, era a temida Cibelly que estava gritando.
E o silêncio permaneceu até ser preenchido novamente pelo som da porta se abrindo. Era outro aluno.
— Bom dia! O pneu do carro do meu pai furou e acabei tendo que vir andando, por isso me atrasei. Não que eu precise explicar, já que não me atraso sempre como algumas pessoas. — explicou para a professora e em seguida foi cumprimentado por todos da sala, exceto Thomas.
Vendo que foi o único a não cumprimentá-lo, caminhou até sua mesa e levantou a voz:
— E aí, atrasado eterno? Não ouvi você me dando um bom dia. Não é assim que se cumprimenta um colega que acabou de chegar?! — falou em tom caçoador.
— Cala a boca, Doug! Nem você nem ninguém nessa sala me cumprimenta normalmente!
— Mas é claro! Você sempre se atrasa, esperava o quê? Que te recebessem com rosas? Agora me dá um bom dia logo, garoto mal educado! — Doug bateu na mesa de Thomas ao dizer isso.
A professora, vendo que os garotos estavam brigando, resolveu intervir:
— Parem com isso! Doug, vá para seu lugar porque a aula já vai começar!
O forte garoto saiu de perto da mesa e se sentou perto de seus amigos.
Cibelly deu início a aula e, após alguns minutos, encerrou dizendo:
— E então, lembrem-se disso: o Teorema de Pitágoras afirma que o quadrado da hipotenusa de todo triângulo retângulo é igual à soma dos quadrados de seus catetos.
E assim, a aula de matemática terminou. Passaram-se mais algumas aulas e finalmente foi tocado o sinal para o intervalo.
Todos os estudantes se retiraram para lanchar com seus amigos, mas Thomas continuou na classe. Ele estava apenas esperando todo mundo sair para não descobrirem aonde ia: um banco escondido no jardim da escola. Aquele era o seu lugar preferido.
Pegou um pão que estava na mochila, foi até o jardim e sentou-se no banco.
Uma suave brisa preencheu o ambiente enquanto o sol aparecia cada vez mais dentre as nuvens.
“Esse é um ótimo momento para se deliciar e observar as flores…”
Seu momento de paz durou pouco. Logo foi interrompido por uma escandalosa voz:
— Ei! Você aí! — disse uma garota tentando chamar a atenção de Thomas.
O garoto apenas ignorou e continuou comendo seu pão demonstrando que não queria ser incomodado. Mas ela insistiu:
— Você não é o atrasado eterno? Por que te chamam assim?
Tentando acabar com isso logo, Thomas respondeu:
— Você não ouviu os boatos? É como dizem, fui amaldiçoado por uma feiticeira anciã e condenado a sempre chegar atrasado — Seu tom era sarcástico.
— Sério?!
— Você realmente acreditou nisso? É claro que não — disse ao se levantar — já terminei de comer e o sinal está para tocar então, se me der licença, vou para minha sala.
— Espera! Ainda falta um pouco até acabar o intervalo. Vamos conversar!
Thomas suspirou e pensou: “Eu realmente não sei lidar com esse tipo de pessoa… fazer o quê… vou apenas seguir com isso e ver o que ela quer.”
— Tudo bem… sobre o que quer conversar? — falou, quase se arrependendo de sua decisão.
— Ah! Que tal sobre o tempo? O tempo está lindo hoje, não? Olha o sol, e esse vento aconchegante. — Apontou para o sol e deu um giro para sinalizar sobre o vento.
“Ela parece ter a minha idade, mas se comporta como uma criança.”
— Você veio aqui só para isso? Por acaso eu deveria assumir que tenho uma stalker?
— Não, não! Por favor, me escute. Só queria conhecer aquele de quem todos falam na escola! Não sei se você sabe, mas é bem popular!
— Eu não chamaria isso de popularidade. Se para você ser zoado pela escola inteira é ser popular então talvez eu seja o novo popstar da geração.
— Hahaha! Você é bem engraçado, não? Aliás, me chamo Mia. É um prazer te conhecer pessoalmente, Thomas! — Ela estendeu a mão para cumprimentá-lo.
Thomas apertou a mão dela e respondeu gentilmente:
— Bom, ao menos você não continuou com aquele apelido ridículo. Obrigado! É um prazer te conhecer também.
O sinal tocou… e inesperadamente o céu começou a escurecer.
— Veja, Thomas, o sol está estranho! — disse Mia, apontando em direção ao astro luminoso.
Naquele momento, uma coloração estranha percorria todo o céu e, como apontado pela garota, o sol estava com uma cor diferente do normal. Era uma mistura de vermelho sangue com preto.
— É verdade, mas não deve ser nada demais. Desde 2030, fenômenos naturais desconhecidos têm se tornado cada vez mais frequentes. Pode ser só mais um desses. Aconselho ignorar isso e ir para a sala. Se for algo a mais provavelmente será noticiado mais tarde — falou tentando acalmar a garota, que estava nitidamente ansiosa.
— Você deve estar certo — respondeu ainda apreensiva.
Os dois se despediram e foram para suas salas.
Era quase o final do período e faltavam apenas duas aulas para a saída da escola.
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Na sala, Thomas já estava cansado das encaradas que levava e dos sussurros frequentes de seus colegas. Ele mal via a hora de ir embora.
A penúltima aula passou rápido e logo veio a última. Todos sabiam que essa aula era uma das mais entediantes. A professora era velinha e falava muito baixo para qualquer um ouvir.
Para a surpresa do garoto e dos outros alunos, uma nova lecionadora entrou. Ela era elegante e estava trajada com um belo vestido rosa.
— Boa tarde, me chamo Emma e serei sua nova professora de geografia. Sei que está bem no meio do ano e vocês já se acostumaram com a dona Lena, mas ela ficou muito doente para lecionar.
Um burburinho começou quando ela terminou de falar. Havia gente cochichando para todo lado: alguns estavam surpresos, outros felizes e alguns tristes.
Emma continuou a falar depois de se certificar de que todos já haviam parado de conversar e estavam atentos a ela:
— Como não temos muito tempo, hoje apenas iremos conversar e nos conhecer, tudo bem? Acredito que o princípio de toda relação é o respeito e a empatia. Para isso, é importante conhecer o outro. Isso não muda quando falamos da relação entre um aluno e um professor. — Suas palavras eram cuidadosamente escolhidas e sua voz era gentil.
A primeira impressão que tiveram sobre a nova professora foi de que era uma moça da alta sociedade, muito bem educada e comportada. Totalmente diferente da desleixada Lena.
— Muito bem, quero realmente conhecer cada um de vocês. Por favor, não sejam tímidos. Eu começarei perguntando apenas o nome, a idade e o sonho de cada um — disse ela enquanto passava pelas mesas anotando as respostas.
Quando chegou na vez de Thomas, ficou contente e abriu um sorriso. Foi a primeira vez que um professor lhe tratou tão bem.
— Seu nome, querido?
— Thomas. Thomas Lange…
— Hmm… um belo nome — falou enquanto anotava e continuou com as perguntas.
— Quantos anos você tem?
— Tenho quinze.
— Bem, é de se esperar — escreveu e fez a última pergunta. — Qual o seu maior sonho?
Essa pergunta não foi tão fácil para ele responder. Levou um tempo até reunir seus pensamentos.
“Meu maior sonho? Eu não tenho certeza. Sempre quis ajudar os outros de alguma maneira, mas não sei como. Não é como se houvesse algo que eu me considere melhor que os outros. Ah, sim. Acho que no fim também sou um pouco egoísta. Na verdade, meu maior sonho…”
— Meu maior sonho é permanecer para sempre com a minha família! — gritou subitamente.
— É um sonho difícil de se realizar, eu suponho — disse a tutora quase sussurrando e anotando.
Quando gritou, a sala inteira começou a rir e chamá-lo de criança. Mas ele não se importou nem um pouco.
Na verdade, estava firme naquilo que havia dito, como se realmente quisesse que aquele impossível desejo se realizasse.
Esse tempo foi o bastante para o sinal final tocar. Era hora de ir embora.
Todos caminhavam para fora do colégio conversando com seus amigos e ninguém nem mesmo estava se importando com o estranho fenômeno no céu.
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Já fora da escola, Thomas parou por um instante e observou a grande estrela com um mau pressentimento apesar de ter afirmado que deveria ser só mais algum fenômeno desconhecido.
A verdade é que estava assustado, mas não queria admitir. O que disse antes foi apenas para tranquilizar Mia.
Ele passou um pouco do horário então para não preocupar seus pais ainda mais, andou rapidamente em direção a sua casa.
Seu coração por algum motivo batia muito rápido. Estava extremamente ansioso. Pensou que fosse apenas o medo então só continuou andando normalmente.
Alguns minutos de caminhada e finalmente chegou na entrada de sua casa. Entrou no quintal, foi até a porta e girou a maçaneta…
Uma cena triste preencheu seu campo de visão. Sua mãe estava ajoelhada no chão da sala chorando e gritando:
— Por quê? Por quê? Por quê? O que eu fiz pra merecer isso? Por favor, me digam, deuses — Ela soluçava e limpava seu rosto toda vez que as lágrimas caiam.
— M-mãe?! — Seus lábios tremeram e seu coração começou a doer ao ponto de apertá-lo com as mãos na esperança de que a dor passasse.