A Herança do Assassinato - Capítulo 35
O medo fazia seu corpo tremer, como se estivesse em meio a uma tempestade de neve. A sensação de que a morte podia arrancar a vida de suas mãos a qualquer momento não desaparecia, como se mantivesse a lâmina de uma faca a poucos centímetros de seu coração, apenas esperando o momento certo para apunhalar. Algo bastante irônico para alguém que é conhecido pela alcunha de “Coveiro”.
O temido homem, se encontrava agora, aterrorizado semelhante a um veado recém nascido, que se depara com um novo e hostil mundo à sua volta, o qual nunca havia presenciado antes. Diego se mantém ajoelhado no chão gelado, encarando a madeira escura a todo momento, não desviando seu olhar nem por um mísero segundo que fosse, quase transformado em uma estátua.
Ele se encontrava em uma sala refinada, digna da mansão de algum magnata, contratando com seu aspecto miserável. O chão era feito de madeira; macia ao caminhar sobre que perguntava o ambiente com odor florestal; peles pertencentes a animais selvagens eram troféus expostos nas paredes, junto de belos quadros representando paisagens paradisíacas. A única fonte de luz local eram as chamas laranjas e quentes da enorme lareira, a qual tinha na sua frente duas poltronas cobertas por um couro brilhante, refletindo a luz que batia sobre ele. Uma delas estava vazia, porém na outra estava um homem.
Sua presença conseguiu preencher a sala por completo, mesmo que nenhuma palavra fosse proferida de sua boca. O sujeito se vestia de maneira impecável, com sapatos pretos engraxados de maneira magistral; calça e paletó na cor de proto tão sombrio que era difícil até mesmo enxergar, além de estarem perfeitamente passados, sem nenhum dobradura a mostra; a camisa parecia com a nuvem de um céu em ensolarado de tão clara e branca; e por fim tinha uma gravata da mesma cor do paletó enrolado em seu pescoço.
Enquanto tomava um copo de um uísque de sabor amadeirado, o homem se pôs de pé, caminhando em um ritmo calmo em direção a Diego, que ainda permanecia jogado contra o chão.
— Senhor, eu juro… — Diego soluçava durante sua súplica. — Nunca faria qualquer mal a organização ou ao senhor! Aquele homem… Eu não fazia ideia do poder daquele cara!!
Ainda sem dizer uma palavra que fosse, a figura oponente colocou seu copo na parte superior de uma mesa e se agachou diante do humilde subordinado.
— Pobre Diego, não precisa fazer toda essa cena — disse o homem em um tom de voz suave, quase hipnotizante. — Levante sua cabeça e me olhe nos olhos enquanto falo com você.
Assim como havia sido ordenado, Diego ergueu sua cabeça vagarosamente, se deparando com a encantadora face de seu líder. Sua beleza era difícil e se colocar em palavras, a pele lisa e pálida dava destaque os sus finos e avermelhados lábios, os olhos eram profundos, sendo negros como uma obsidana, mas ainda eram portadores de um inexplicavel brilho, e seu cabelo preto volumoso, que se estendia ate seu pescoço, crindo uma franja que cobria parcalmente sua testa.
— Mestre Edward… — sussurrou Diego, em uma rogação silenciosa.
— Eu lhe entendo, todos encontramos adversários os quais não conseguimos derrotar e não te odeio por isso — Edward levou sua mão até o rosto moribundo de Diego, o qual se encontrava úmido devido as suas lágrimas e suor. — Você é um membro preciso para a nossa organização.
Tal como um anjo brilhante, aquele homem trouxe uma felicidade incalculável para dentro do coração de Diego, que pode por um momento se encher de esperança por sua redenção.
— Por esse motivo que não posso ficar tolerando suas babaquices — Na questão de um segundo as penas das asas daquele esbelto anjo pareciam cair, revelando a verdadeira forma, obscura e medonha. — Você deve acabar com os opositores que aparecem na nossa região, sem qualquer tipo de cerimônia e graças a sua prepotência descobriram nossa localização — A mão de Edward sobe pelo rosto de Diego, encontrando seu cabelo, o qual fora puxado com extrema força, chegando ao ponto de parecer que seu couro cabeludo ia ser arrancado.
Enquanto erguia a cabeça de Diego a força, a expressão facial de Edward exibia um ódio incontrolável, sem nenhum tipo de abalo, enquanto o homem à sua frente se debatia em um ritmo frenético, tentando de alguma forma, se desvincular do agressor, entretanto, era inútil. O homem na sua frente já não era mais o arcanjo piedoso, o brilho em teu olhar desapareceu por completo, o que era causado na alma de Diego já não era mais esperança, as lágrimas anteriormente de felicidade, esboçaram o terror que sentia.
Diego teve sua face lançada contra o chão, gerando um som seco, dos ossos do crânio se chocando com a madeira. A ação se repetiu mais algumas vez, cada vez mais, manchando o chão com sangue
— Espero que compreenda minha situação — A voz de Edward permanecia em um tom sereno forçado, em uma tentativa de ocultar o descontrole emocional. — Você causou uma enorme bagunça e não posso mais confiar nos seus serviços, e acredite, isso está doendo mais em mim do que em você.
O que estava à sua frente não era um ser humano, muito menos um anjo. Aquilo era um demônio.
Edward então solta os cabelos de Diego e troca para o pescoço, o qual aperta com ambas as mãos. O coveiro tentava a todos custo se soltar, mas aquele homem era dotado por uma força indescritível.
Os outros membros da organização assistiam aquela cena macabra, aos sons dos fracos chemidos de Diego. A maioria já estava acostumada, afinal, aquilo era um grupo criminoso da Cidade de Baixo, momentos como estes eram rotineiros.
De pouco em pouco as forças iam escapando do corpo de Diego, que junto disso, foi parando de se debater, até ficar completamente imóvel. Sua morte havia chegado mais cedo do que o esperado e não tinha sido um momento nem um pouco agradável, o que era deixado claro na congelada expressão de terror na face do morador de rua, como se momentos antes de a alma deixar o seu corpo, tivesse um vislumbre de como seria o seu destino, ardendo nas chamas do inferno.
Com toda a delicadeza, Edward levou o corpo já sem vida de seu subordinado até o chão, o deitando na posição mais confortável que conseguirá encontrar.
— Espero que entenda, amigo, tudo isso foi para manter as coisas sob total controle — sussurrava Edward, para o cadáver. — Sem o controle, há o caos, e com o caos nossa sociedade entraria em total colapso. Como líder da Cube não posso permitir algo como isso acontecer.
Após isso, chamou por seus guardas, que entraram por uma enorme porta de madeira logo em seguida. eram dois homens grandes e robustos, vestiam ternos cobriam seus olhos com óculos escuros. Edward pede para eles levarem o corpo de Diego, e assim foi feito. Quando a dupla se retirou, uma mulher adentrou o recinto, sendo logo percebida pelo som de seus saltos altos. Vestia um blazer azul por cima de uma camisa branca,dando destaque às jóias em volta de seu pescoço, em suas pernas uma calça preta e justa. a senhorita permanecia estática com sua prancheta em mão, esperando pela atenção de seu chefe.
Edward pegou novamente seu copo e voltou até sua poltrona, onde ficou encarando a madeira da lareira arder em chamas, enquanto apreciava sua bebida. Não aparentava estar abalado, apenas reflexivo.
— Diga, Clarice…
A assistente ajeitou os óculos e começou e começou a falar:
— Sobre o incidente de mais cedo, o Senhor Nathan e a Senhorita Lilyan já nos deram um relatório sobre o inimigo. Temos agora algumas informações sobre o inimigo auto-intitulado, “Fox”. Devemos enviar um esquadrão de assassinos para caçá-lo?
Edward se manteve em silêncio por um breve momento, enquanto bebia e analisava as atuais possibilidades.
— O nosso inimigo atual não é qualquer um, pode derrotar o Diego em seu próprio território e mesmo ferido, deu trabalho para o Nathan e a Lilyan — falou Edward , enquanto encarava o crepitar de sua lareira. — Não sabemos muito sobre ele, quais são suas intenções e se tem algum aliado. Não devemos arriscar os nossos, seria como um tiro no escuro e eu não gosto disso. Para se capturar esse tipo de animal perigoso é preciso agir com inteligência e cautela. Sorte que eu tenho tudo isso de sobra.
***
O clima na Cidade de Baixo continuava o mesmo que qualquer outro dia. Brigas nas ruas, prostitutas oferecendo seus serviços, pessoas se drogando nas calçadas e entre outros delitos. Em um pequeno e asqueroso bar, homens tomavam bebidas e ingeriam alimentos de qualidade duvidosa. Ratos corriam escondidos entre as mesas, tomando cuidado para não caírem nos buracos das tábuas do chão ou para não serem pisoteado.
Em uma parede ao longe, cartazes com rostos de diversas pessoas estavam pendurados. Os rostos estampados eram dos mais diversos, indo desde crianças até um homem com um tapa olho, o qual tinha a maior recompensa, de sessenta mil Auras. Apesar dos valores consideráveis dado às cabeças de tais sujeitos, os papéis pareciam velhos e com diversos rasgos, indicando que todos estavam ali a bastante tempo e que ninguém nunca havia mexido neles, entretanto, de uma hora para outra tudo parecia ter mudado.
Um homem adentrou na taberna, não chamando muita atenção sobre sua pessoa. O careca e com barba rala, era um rosto conhecido, Targus, um dos cobradores da cidade, responsável por gerenciar os cartazes de procurados e entregar as recompensas aos caçadores. Ele vestia um colete de couro marrom sobre sua camisa branca, calças largas e cinzentas, cobrindo parte de suas botas, em seu cinto carregava um revólver e um facão, os quais ele sabia manusear muito bem. Na mão dele havia um papel, mas ninguém deu muita atenção e logo retornaram às suas atividades.
Em passos calmos, Targus caminhou até o quadro e procurados, o mesmo começou a pregar algo no quadro e o alto som do martelo ecoou pelas paredes do estabelecimento, incomodando aqueles ali presentes. Quando o homem terminou de bater o martelo, foi embora, sem dizer uma única palavra, pois não tinha mais nada a fazer ali.
Agora como todos tinham prestado atenção em Targus, foi inevitável não verem o novo item na parede.
— Nem fodendo — disse um dos bêbados, incrédulo com o que estava presenciando.
Ele, assim como outras pessoas na taverna estavam em dúvida se aquilo era mesmo real ou se era apenas a péssima cerveja criando alucinações.
Um novo cartaz de procurados tinha sido posto para exibição. O papel novo e dourado ganha destaque na parede imunda. A imagem desenhada em seu centro era de um sujeito com o rosto coberto por uma máscara de raposa e um manto escuro como o céu noturno, que escondia seus ombros e busto. O nome grifado logo embaixo era “Fox”, porém o que realmente estava causando toda a enorme comoção eram os números do pagamento.
— 127.000 Auras… — disse o homem, não acreditando nas suas próprias palavras, coçando os olhos para ter certeza de que estava enxergando direito. — Isso é mais que o dobro que a recompensa pelo Lion Caolho!!!
Do meio da multidão que se acumulou em questão de segundos, sai um rapaz alto e magro.
— Eu conheço o arrombado, ele atacou eu e o Gu, até quebrou a porra dos meus dedos!!! — gritou o magro, exibindo os dedos cobertos de ataduras, aquele era um dos bandidos que Dante havia interrogado no dia que encontrou a Cidade de Baixo.
Murmúrios começaram a correr pelo ar. Já tinha muito tempo que os criminosos da Cidade de Baixo se mostravam tão empolgados, afinal não era para menos, com todo aquele dinheiro seria possível que qualquer um deles saísse do lixão o qual chamavam de casa.
Foi então que toda a animação foi cortada como um pedaço de carne. Uma figura encapuzada se colocou de pé no fundo da taberna e logo em seguida começou a caminhar em direção a comoção. Seus passos eram tão pesados que a madeira abaixo de seus pés parecia que poderia quebrar a qualquer momento. Chegando próximo às outras pessoas, sem precisar dizer uma única palavra, elas abriam caminho, com claras expressões de medo em seus rostos. Aquele ser desconhecido era enorme, grande o suficiente para fazer o criminoso magricela parecer uma formiga perto dele, conseguindo chegar aos dois metros de altura com facilidade, além de ter ombros largos, parecendo uma gigantesca muralha ambulante.
O encapuzado parou ao estar de frente com o cartaz de procurado.
— “Fox”, não é mesmo? — falou o sujeito, com uma voz grave e masculina, mostrando uma óbvia curiosidade sobre o sujeito estampado. — Nunca ouvi falar de você antes, mas com certeza deve ter arranjado problemas com uma pessoa poderosa para conseguir um valor tão alto logo na sua estreia — Por debaixo do capuz pode se perceber um sorriso torto se formar no rosto daquele brutamontes. — Você vai ser um inimigo, no mínimo, interessante.
Os caminhos dos destinos estavam cada vez mais tortuosos e imprevisíveis. No futuro, qualquer desastre ou milagre era possível, mas apenas uma coisa era exata, a Cidade de baixo irá ficar ainda mais agitada daqui em diante.