A Ordem Espiritual - Capítulo 17
Primeiro Ato
— É isso mesmo? Por que você está zangado? Tem a ver com a gente? — disse Amai com entusiasmo enquanto caminhava pela calçada, acompanhada pelos altos muros que separavam o terreno da rua.
Ela segura o smartphone com firmeza, com os adereços na capa rosa balançando suavemente. Sua voz está cheia de animação enquanto conversa com o rapaz, transmitindo entusiasmo em cada palavra.
— Sim, infelizmente… Como isso vai funcionar? Com seu sobrenome, parece que você deve ser bastante ocupada, certo? — ele pergunta, sentado em sua maca, olhando para a sopa em uma bandeja sobre seu colo com uma expressão de descontentamento.
“Comida para defunto…”
— Infelizmente? Que nada! Vai ser muito divertido! Pelo menos você vai ter companhia… alguém para te fazer parecer menos estranho para os outros… — ela graceja, tocando os lábios com a mão, como se estivesse afagando sua voz. Sua expressão parece despretensiosa, quase brincalhona.
“Ele vai ficar uma fera…”
Enquanto pensa, suas bochechas coram levemente e seu olhar se intensifica.
— Estranho? — diz Yami.
No mesmo instante, a colher plástica em sua mão se parte ao meio com sua força desmedida, caindo na tigela e mergulhando na sopa quente, que espirra ao redor. O médico, que estava prestes a entrar na sala, observa a cena pela pequena janela de vidro na porta e, surpreso, recua com medo.
“Que diabos!
Por que logo uma garota?”
— Pois é… e você também vai deixar de ser um desastre comigo. Sério, como pode um exorcista tão habilidoso quase destruir uma escola inteira para exorcizar um demônio como aquele? — ela continua, enquanto caminha energicamente.
As árvores do outro lado do muro balançam suavemente ao vento, suas pétalas cor-de-rosa caindo ao chão e se espalhando aos seus pés. Elas criam uma bela pintura que contrasta com o clima cinzento e sombrio que domina o mundo.
— Ah… Eu… — ele perde o fôlego, tropeçando em suas palavras.
— Eu? Não adianta, Yamasaki, você é um garoto travesso. Que tal te chamar de diabinho trevoso? — ela interrompe, mal dando espaço para ele se defender. Conversar com ela é quase impossível para Yamasaki, o pior dos jogadores quando se trata de suas habilidades sociais.
— Vai se foder! Sério…
— Haha, que boca suja… Mas bem, não sou tão ocupada… Ser exorcista é minha vida — ela diz, deixando escapar um suspiro exausto. Então, ela para, aguardando alguns carros passarem antes de atravessar a rua, — Quando não estou treinando no refúgio da minha família, estou aceitando missões dos quadros públicos… — seus olhos brilham enquanto ela desabafa.
— Entendi…
— Bem, falamos quando tivermos alguma missão para fazer, certo? Vou deixar o resto com você… — ele responde, seguido por um bocejo.
— Espera!
Assim que ele encosta a cabeça no travesseiro, a voz da garota o desperta. E Yami se vê obrigado a se sentar, piscando algumas vezes para se recompor, enquanto encara a estante e a cadeira para visitas, vazia, na sala hospitalar.
— O que foi!?
Ela contrai os lábios instantaneamente, controlando-se para não se perder nas palavras e acelerar o coração do rapaz.
“Ele é como um café…
Amargo, mas viciante!”
— Não era nada! Vou te mandar uma mensagem quando confirmar tudo, combinado? — Amai responde, refreando seus pensamentos mais intrusivos.
— Combinado… Até a próxima… — ele responde, bocejando novamente.
— Até… Diabinho trevoso…
No mesmo instante, Yamasaki vira o rosto em direção ao smartphone à direita de sua face e, ao revirar os olhos, ouve o aparelho desligar.
“Finalmente…”
Assim que o smartphone desliga, ele relaxa, cedendo à exaustão. Sua visão embaça, e, com um baque suave, sua cabeça descansa sobre o travesseiro.
“Maldito Azaael…
Me deixa igual a um aparelho viciado…
A energia espiritual se esvai como se eu estivesse furado…”
A garota continua andando com passos apressados e murmurando, enquanto escolhe uma música em um aplicativo. Após atravessar mais uma rua, ela para na calçada e entra em um carro preto estacionado no final. O veículo tem um crucifixo prateado, com um brilho sobrenatural, preso ao para-choque dianteiro.
Quando o carro partiu, Rasen finalmente terminou de subir a escadaria, enquanto o relógio marcava 18h. Ele parecia aliviado ao chegar ao topo.
— Foram vinte e cinco dias… que pareceram cinquenta! — disse Romero enquanto se acomodava em uma poltrona desgastada no último apartamento do prédio.
O lugar estava cheio de livros espalhados pelo chão, além de um mapa sobre uma mesa empoeirada, tomada por cupins. E Rasen permaneceu de pé sob o arco da porta de entrada, observando o ambiente com atenção.
— Realmente mas, estou aqui agora! — Ele deu o primeiro passo, passando os dedos pelo mapa à sua frente.
— Fale-me sobre o que descobriu.
— Foi uma experiência reveladora… No monte Hierosolyma, senti a presença da luz de Gael ainda presente, como se a vontade dos fundadores permanecesse viva. Isso me faz perguntar: por que em Aija? — Ele continuou a caminhar pelo recinto, explorando-o, — As terras lá não são férteis, mas Niftar e o anjo escolheram fundar a Ordem naquele lugar; deve haver uma razão por trás disso…
Ao parar, ele pôde contemplar uma pintura que retratava um anjo cedendo lugar a um demônio. Havia luz em sua queda e escuridão nos céus ao redor.
— Enfim, voltei com mais perguntas do que respostas — disse, tocando um dos móveis antigos com firmeza, deixando marcas de dedos na camada de poeira que o cobria.
— Por mais que tentemos compreender, a verdadeira natureza desta realidade nos escapa; apenas arranhamos a superfície, deixando milhões de perguntas sem resposta — respondeu Romero, com o olhar brilhando como uma estrela nascente, maravilhado com as palavras de seu amigo. Era evidente que ele tinha uma ideia.
— Verdade…
Rasen então esfregou os dedos enquanto recita um trecho de um livro: “Nunc autem videmus per speculum in aenigmate, tunc autem facie ad faciem; nunc cognosco ex parte, tunc autem cognoscam sicut et cognitus sum…” Observando a poeira microscópica cair à sua frente.
— Isso nos força a reconhecer as limitações de nosso conhecimento superficial e a buscar modificar o destino… o simulacro da criação, a espiral que Schattenstein imaginou para um mundo perfeito… É a nossa melhor ideia, um mundo sem verdades absolutas, apenas harmonia!
— Mas, para alcançar isso, o que precisamos com minha espiral é de um estoque de energia negra… um estoque que supere os limites conhecidos — respondeu ele.
— Sim e, exatamente por isso estamos aqui, Rasen, neste lugar tomado por ratos. Meu plano é simples: roubar o Cubo da Maldição Eterna, um objeto de Nível Apocalipse armazenado e protegido no nível 17 da zona de contenção — revelou.
— É verdade, como pude esquecer? Lembro quando o cubo foi descoberto, forjado a partir do desespero dos homens. Disseram que há mais de cem demônios mundanos selados dentro dele… seria uma fonte de energia inigualável! — disse ele, compartilhando do entusiasmo de seu amigo, — Mas há dois problemas: como invadir sem ser interrompido por um exército de exorcistas e como lidar com tantas entidades? É um desafio até para mim… no máximo, conseguiria aprisionar dez com minha técnica inata expansiva… mas… — pensativo, refletindo sobre os obstáculos à sua frente.
— Eu sei… temos algumas semanas até lá, e só preciso de seis exorcistas. Meu plano é criar uma distração no dia da invasão da zona de contenção. Com sorte, isso fará com que todos os exorcistas se voltem contra nós. Se Milk for eficiente, conseguiremos enganar os celestiais por tempo suficiente — ele responde, interrompendo a conversa para encarar seu companheiro — mas, com o cubo, teremos que ser astutos. Na verdade, seremos os mais ousados! Você irá liberar todos os demônios, controlados ou não, e, conforme o caos se instala, a energia negra que será consumida em sua espiral virá do medo, terror e desespero que dominarão o ar!
Seus olhos pousam no mapa entre os livros enquanto ele termina de falar, delineando os próximos passos do plano.
“Energia em transformação, ainda não domada por um instinto… entendi!”
— Dois planos suicidas… — Rasen diz, após essa breve reflexão, observando a palma de sua mão onde a energia flui como uma espiral de dentro para fora. Então ele fecha a mão e olha para Romero, — Morrer pelo nosso ideal ou dar ao mundo uma segunda chance? Parece justo! — ele exclama, determinado.
— Assim somos, iluminados! — parafraseia, levantando-se energicamente da poltrona — bem, já que você chegou, que tal recrutarmos um rapaz comigo? Ele passou pelo mesmo caos que você…
— Eu? Não, Romero, não consigo convencer ninguém com essa minha cara… — responde, pegando o smartphone do bolso e soltando uma risada fria — E, na verdade, preciso fazer uma visita… você entende, não?
Romero sorri de lado ao ouvir isso, enquanto pega um de seus livros e o segura entre a cintura e o cotovelo direito.
— Claro, nos vemos mais tarde então, meu amigo…
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