A Rosa Fantasma - Capítulo 10
— Acho que foi proveitoso deixar vocês a sós.
Aria atravessou a varanda e parou ao lado de Owen.
— Então, você estava ouvindo?
— Eu e toda a vizinhança. Vocês estavam gritando bem alto.
Os dois riram.
— Há pouco tempo, você perguntou que tipo de pessoa eu sou. A sua pergunta foi respondida?
— Hum… Acho que pude entender melhor a sua maneira de pensar. E, sinceramente, estou impressionada com o seu autocontrole. Não sei se conseguiria ficar tão calma em um lugar onde todos me odeiam. Como você suporta?
— Não tenho certeza. Acho que já aceitei o fato de que sou odiado por grande parte desse país e continuarei sendo independentemente dos meus atos caridosos. Fora o fato de que eu já sabia onde estava me metendo quando decidi entrar para a Legião.
— Nesse ponto, eu gostaria de ser igual ao senhor. Ter a capacidade de aceitar a realidade. — Aria fitou o horizonte, perdida em pensamentos. — Todos os dias, acordo pensando em ir embora daqui. Não gosto de Jothenville, não tenho boas memórias aqui, e tenho certeza de que nunca serei feliz nesse lugar. Entretanto, sou uma grande covarde. Não tenho coragem de largar tudo e correr através do desconhecido mesmo que isso me leve até a verdadeira felicidade.
Owen sorriu gentilmente.
— Não sou a pessoa mais indicada para dar conselhos, mas há algo em que acredito firmemente e queria que você soubesse. Todos nós possuímos um “lugar especial”, e, cedo ou tarde, acabamos o encontrando. Até mesmo eu, um grande pecador, conseguiu. Por isso, tenho certeza de que você também encontrará o seu verdadeiro lar algum dia.
— Pecador? — A loira sussurrou para si mesma. — Onde fica o seu lugar especial, Sr. Owen?
— Na colina com mais árvores de todo o Rio de Januário, próximo de um pequeno lago que tende a ficar avermelhado durante o entardecer. O único lugar em que consigo dormir sem ter pesadelos.
Aria estava prestes a questioná-lo sobre isso quando seus olhos encontraram a mão direita dele.
— Sangue… Senhor, a sua mão está sangrando!
Gotas vermelhas caiam sobre o piso da varanda. A loira arregalou ainda mais os olhos quando notou que havia uma mensagem gravada na pele dele.
“Você está na superfície? OBJC”
O legior fechou os olhos e pensou por um breve momento.
— Superfície? Ellen, o que você quer dizer com isso?
— Ellen?! A garota que veio junto com você?! O que significa “OBJC”?!
— O baile já começou.
Levou a mão ensanguentada até o bolso da calça e retirou de lá uma moeda. Depois, a posicionou de pé sobre o chão.
— Está ouvindo isso?
— O quê?
Dois segundos depois, a moeda pulou alguns milímetros e caiu.
— Terremotos.
O soldado correu em disparada, saindo das terras de Guilherme na direção da estrada. Sem entender o que estava acontecendo, a loira o seguiu de perto.
— Mais uma vez! Os tremores estão ficando mais fortes!
Dois minutos de correria depois, os dois pararam em uma área aberta próxima à muralha de Jothenville.
— O epicentro é aqui! — Sem se importar com a sujeira, o soldado se ajoelhou e encostou o ouvido direito no chão. — Em que tipo de encrenca você se meteu dessa vez, bruxa?
— “Você está na superfície…?” Espera um pouco! Isso quer dizer que ela está debaixo da terra?!
— Aparentemente, está acontecendo uma guerra aqui em baixo. — Levou as mãos à cabeça e agarrou os próprios cabelos. — Aaah! Por que você não consegue mandar um simples recado?! Da próxima vez, lembre-se de colocar mais detalhes! Eu não consigo adivinhar os seus pensamentos!
Owen levantou e começou a caminhar em círculos, murmurando e roendo a unha do seu polegar. Uma mania que deixava escapar sempre que ficava nervoso.
— Se eu estivesse preso debaixo da terra, como escaparia? E se eu não pudesse escapar? Conhecendo Ellen, ela apenas explodiria tudo até encontrar uma saída. Entretanto, considerando o final da mensagem, devo presumir que ela está enfrentando algum inimigo que a impede de fugir.
Owen arregalou os olhos como se tivesse esclarecido o mistério. Depois, voltou-se para Aria.
— Aconselho que feche os olhos. Presenciar o que farei agora não será nada agradável.
Em seguida, sacou o seu sensório e expandiu dez centímetros da lâmina.
— Espera um pouco! Não faça nenhuma loucura!
Mas já era tarde. O legior cortou a palma da sua mão direita profundamente, fazendo sangue jorrar pelo cascalho feito uma torneira.
— Inferno! Isso dói demais! — O líquido vermelho que se espalhou pelo chão começou a correr como se tivesse vida própria, desenhando um círculo largo com dezenas de símbolos dentro. — Ah… Aí está você…
Menos de um minuto depois, a pintura feita de sangue ficou completa e um forte cheiro de plástico queimando se espalhou pelo ar.
— Mas o quê?! — Assustada, Aria recuou três passos. — O que é tudo isso?!
Partindo do centro do círculo, o chão começou a derreter feito uma esponja mergulhada em ácido sulfúrico. A corrosão criava um poço que descia rapidamente rumo ao subsolo.
— Rápido, precisamos estancar o sangramento!
Owen tinha acabado de guardar o sensório quando a garota loira agarrou sua mão direita e a puxou para averiguar a gravidade do ferimento.
Aria tinha certeza absoluta de que o legior havia cortado várias veias importantes, causando aquela grave hemorragia. No entanto…
— Desapareceu. — Arregalou os olhos, perplexa. — Nada da mensagem ou do corte… Nem mesmo um arranhão…
Restava apenas a quantidade absurda de sangue que tinha sujado as roupas dele.