As Paredes do Céu Negro - Capítulo 20
1
— Uff, uff…
— Já está cansado? Eu ainda nem te atingi — disse o gerente, imponente como uma estátua gigante.
A verdade é que o hematoma serviu apenas para distraí-lo por alguns segundos. Como ele não esperava receber qualquer dano de um oponente tão fraco, não pôde evitar o espanto quando viu o pequeno estrago causado por Enos. No entanto, continuava sendo um ferimento insignificante: o colosso sequer esboçou dor ou incômodo em algum momento.
O gerente mexeu no próprio pulso com a outra mão, estalando os ossos com habilidade invejável. Então, girando-o um pouco para finalizar o aquecimento, fechou a mão em um punho de rocha.
— Eu disse pra você, velhote. Eu não te atingi… — e, forçando as veias a saltarem no punho, completou: — …ainda.
O braço do gerente se moveu para trás, levando o punho sólido como uma pedra consigo. Ele estava se preparando para desferir o golpe de misericórdia, ao qual Enos não teria a chance de resistir mesmo com o seu corpo robusto de um adulto. Diante do espetáculo de músculos que o gerente apresentava em cada centímetro do seu corpo, a compleição física de Enos era comparável à de uma criancinha assustada.
— Não sei o que você é daquele moleque, mas é inegável que tem laços com ele e por isso o trouxe aqui. Imperdoável, considerando o que houve. Eu não tenho outra opção a não ser mandá-lo para fora desacordado.
— Eu não posso me defender?! Droga, eu não tenho nada a ver com a confusão de antes! Eu também sou uma vítima!!
— Blergh. Mentindo para se safar, você merece as amizades que tem.
— Uh?! Você não tá entendendo!!
O gerente estava inflexível quanto a entender o lado de Enos. Uma história extremamente mal-contada, se é que foi contada por alguém. Ele pensou que o homem podia o ter apontado como culpado meramente por estar fervendo de raiva, querendo um bom alvo para poder descontá-la. As pessoas ao redor não eram impeditivos!
“Ele nunca teve a intenção de me deixar ir ileso! Faz sentido, ele me atacou assim que nos vimos!”
— Adeus. Reflita sobre suas ações quando acordar no hospital.
— Ah, merda!!
O punho desceu como um meteoro na direção do rosto do homem. Por instinto, pôs-se na frente de Daniel para evitar que tivesse envolvimento no que iria acontecer, pois já havia notado como o gerente era um homem desequilibrado.
Os olhos fechados e a testa franzida, aguardou o impacto. Chegou a levantar a guarda, mas sabia que era um esforço vazio.
Batida!
Respinga! Respinga!
Alguém foi atingido com brutalidade no rosto. Porém, surpreendentemente, Enos estava intacto!
Gotas de sangue pingavam sem ritmo do nariz quebrado do gerente. No rosto, a marca de um impacto poderoso podia ser vista.
Todos olharam para o responsável por isso, incluindo aquele que fora atingido.
— Você!! — disse o gerente, ainda mais irritado do que antes.
— “Você” o caralho, seu pau no cu! Você ia bater num cliente mesmo?! O que diabos ele tem a ver com os problemas da minha irmã?!!
Um homem engravatado cuja idade devia estar na casa dos vinte anos se colocava frente a frente com o monstruoso gerente. Apesar da bravura, sua estatura total não passava dos cento e setenta e cinco centímetros. O blazer preto que vestia por cima da camiseta branca, aliados à calça social preta e aos sapatos chiques, informavam o seu status; não só isso, havia uma gravata com listras pretas e cinzas enrolada em seu pescoço. Era a representação perfeita de um executivo.
Os cabelos pretos estavam penteados em um belo e volumoso moicano. No rosto, por cima dos olhos e da pele branca, observava-se um óculos roxo-escuro sem lentes e de armação quadrada. Para complementar a imagem exótica, os músculos protuberantes saltavam por debaixo das roupas, dando-lhe um ar verdadeiramente imponente a despeito da baixa estatura.
— Gerente Luca, que porra é essa?! Explique-se!!
Luca pareceu se enfurecer ainda mais. Aproximando-se a passos lentos do engravatado, passou a encará-lo nos olhos. A aura terrível de Luca estava quase visível no mundo real. Conforme a distância entre eles diminuía, Luca limpou o sangue fresco na manga do uniforme.
— Por que eu te devo explicações do que faço ou deixo de fazer? Este é um assunto meu.
— Errado! Esse assunto é da minha irmã e somente dela! Você é a porra de um bisbilhoteiro maldito, isso sim.
— Bisbilhoteiro? Estou protegendo a honra dela.
— Protegendo a honra? Você tava prestes a bater naquele cliente!! — Indicou Enos com o dedo. — Em que mundo isso é proteger a honra de alguém? Você deve ter comido merda, gerente Luca!
— Meça as suas palavras, moleque. Você pode ser um executivo importante agora, mas não esqueça que fui eu quem te colocou nessa posição.
— A minha gratidão tá na casa do caralho agora. É melhor você parar com o seu chilique imediatamente ou eu vou quebrar o resto do seu corpo!
— Você acha que consegue? Fala sério. Não compare o seu golpe de sorte de agora com uma luta real.
— Se for contra um brutamontes sem cérebro que nem você, tenho certeza que sim. Então faz o favor de enfiar essa cordialidade fingida no rabo e cai fora daqui!!
A reação de Luca assustou a todos, exceto o engravatado.
Esfrega! Esfrega!
Os dentes dele rangiam violentamente. A sua raiva já havia passado do limite.
— Moleque maldito! Eu vou colocá-lo no seu lugar de direito à força, assim você com certeza vai entender com quem está falando.
A coragem do engravatado vacilou por um instante. Engolindo em seco, percebeu que Luca falava sério sobre combater fogo com fogo: a sua mão já estava apontada para a cara dele, fechada em um punho opressivo. As veias na testa e nos braços estavam prestes a explodir.
Glurp!
“Falei demais. Eu vou levar um socão desse cara por causa de um desconhecido? A Dália me ferrou mesmo!!”
O engravatado levantou a guarda mais sólida que pôde. E apesar da improbabilidade, cogitou se esquivar do golpe.
“Acho difícil. Ele fica muito mais rápido quando está sério.”
Então, o punho poderoso de Luca deu o primeiro indício de que iria descer. Apenas esse mínimo movimento o fez vacilar outra vez, recuando um passo. O estrago já fora feito.
“Tô morto pra caralho. Eu vou puxar seu pé essa noite, Dália!!”
O ataque, enfim, aconteceu. A velocidade era muito superior àquela utilizada contra Enos.
Mas a trajetória do soco foi interrompida logo que começou.
— Gerente Luca! Pare imediatamente!!!
A pessoa que apareceu na porta foi a própria Dália, com olheiras pesadas sob os olhos. Era incontestável que chorava há poucos minutos. Luca foi o primeiro a desviar a atenção para ela, incomodado com a interrupção.
Não contente, continuou:
— Não se atreva a bater no Dante! Porque se fizer isso… — parou por um momento, os olhos tristes fixos em Luca — …EU ME DEMITO!