As Sombras de um Novo Começo - Capítulo 2
A claridade da manhã invadia o meu quarto pela janela, causando um forte aperto em meus olhos desprevenidos. Ao longe, conseguia ouvir o leve ruído das vozes e o cantarolar animado das aves, indicando o início de mais um dia comum em Ventaris.
Hoje seria o primeiro dia de aula, mas, sinceramente, eu só queria ficar deitado o dia inteiro e esperar pacientemente a passagem progressiva do tempo. No entanto, minha vontade não poderia ser realizada, pois não era inteligente faltar justamente no primeiro dia de aula, principalmente se considerasse que eu era um aluno novo.
Eram 6:30 da manhã, conforme marcava o relógio na parede. Considerando o horário de entrada, ainda estava bem cedo e sobraria tempo mais do que o suficiente para chegar ao colégio.
Enquanto pensava sobre isso, uma vontade incontrolável de bocejar surgiu em mim, fazendo-me espreguiçar demoradamente antes de me levantar. Bom, eu realmente preciso ir, não é?
Depois de ir rapidamente ao banheiro, comecei a me arrumar para sair. A escola ficava a apenas alguns minutos daqui, pelo que me lembrava do mapa, e, embora eu não conhecesse o caminho, sabia que não levaria muito tempo para chegar lá. No fim, seria uma boa e tranquila caminhada.
Após vestir ligeiramente o uniforme, fiz uma autoavaliação em frente ao espelho, analisando o caimento dele sobre o meu corpo. Eu não gostava de roupas muito largas, mas detestava que ficassem coladas em mim. Por um momento, fiquei apreensivo por Maya ter escolhido o meu uniforme, já que eu não era exatamente magro e também não a conhecia. Entretanto, ou as informações sobre eu ser “mediano” eram precisas demais ou ela tinha uma imaginação muito boa, pois, felizmente, a roupa coube perfeitamente. Sendo sincero, até que gostei.
Na verdade, com exceção da cor e alguns detalhes, os uniformes colegiais em geral são muito semelhantes por causa do design padronizado. Mesmo assim, entre todos, eu realmente prefiro esse, tanto pela cor quanto pela forma que ajustava-se ao meu corpo.
Puxando a bolsa que descansava sobre minha cama, fiquei um pouco surpreso ao sentir o peso dela, já que estava muito mais leve em comparação com ontem, mal parecendo carregar algo dentro.
No corredor do sexto andar, não senti nem mesmo a presença de um único ser, e apenas o calmo ar preenchia o lugar. Desde que cheguei aqui, não encontrei sequer um vizinho ou funcionário, com exceção de Elisa é claro, e isso não era nem um pouco ruim. Se minha mãe pudesse ouvir minhas observações agora, com certeza iria me repreender por pensar de tal forma. Ela sempre disse que eu precisava me enturmar mais, parar de ter medo de gente e sair às vezes, no entanto, e como ela deveria saber, foi tudo em vão, porque há coisas que não conseguimos mudar e talvez nem queremos.
Diante do elevador, meu principal desafio recentemente, considerei novamente os pequenos botões sob a tela transparente. Parecia que eu seria o primeiro a usá-lo hoje, já que não sentia sinais recentes de toque no painel. Apesar da minha inexperiência, acreditava que não haveria problemas, afinal, era praticamente o mesmo dispositivo e era só descer, não é?
Quando cheguei ao térreo, alguns minutos depois, provei-me estar completamente errado quanto à ausência de problemas com o elevador. A ideia de que descer é mais fácil nem sempre se confirma, e eu experimentei isso em troca do meu tempo.
Olhando para o lado, notei Elisa sentada atrás do balcão, debruçada sobre seus braços e soltando suspiros profundos. Aproximei-me dela para tentar acordá-la com o som dos meus passos; no entanto, a noite deve ter sido longa, porque ela não notou a minha presença e apenas continuou dormindo.
— Bom dia, Elisa. — disse, optando por outra abordagem quando já estava próximo o suficiente — Tudo bem? Ao que parece, você não conseguiu dormir direito.
— B-bom dia! — Ela acordou assustada. — Não, claro que não, senhor. Eu estou bem acord… — Suas explicações desesperadas pararam abruptamente quando percebeu seu engano.
Ela cruzou os braços, inchou as bochechas como uma criança e olhou para mim com indignação.
— Tudo bem? — perguntei novamente.
— E você ainda pergunta?! Isso não teve a menor graça, Sete.
— Imagino que não, mas eu não fiz nada.
— Como não?! — exclamou mais alto. — Você chega sutilmente e fala igual ao gerente do prédio! É óbvio que tudo isso foi premeditado!
— Não planejei isso. Você que estava dormindo demais. — argumentei.
— Planejou sim!
— Certo, desculpe-me por isso então. — acenei com as mãos para dispensar o assunto.
— Tudo bem, só não faça isso novamente.
Assenti, virando-me para as portas do prédio.
— Você já está saindo?
— Sim.
— Ainda não está muito cedo? — Elisa me questionou — O bonde não passará por agora.
— Sei disso, mas eu prefiro ir andando mesmo. — Virei-me para ela e acrescentei: — Tenha um bom dia.
— Hum… tá bom então. Boa aula.
A visão externa da cidade contemplou meus olhos quando sai do prédio. Agora, em ambiente aberto, conseguia sentir vividamente os raios de sol e ouvir perfeitamente os sons antes abafados pelas paredes e suavizados pela altura do apartamento.
Pela manhã, era normal uma agitação organizada. As pessoas andavam pela calçada , cumprimentando-se pelo caminho e seguindo para o trabalho ou qualquer outro lugar.
Verifiquei os dois lados da calçada, revisando mentalmente a trajeto que deveria seguir. De acordo com o mapeamento que vi pelo celular, primeiro precisava virar à direita assim que deixasse o prédio, andar por alguns metros e virar à esquerda em uma encruzilhada.
Claro, o percurso não era exatamente assim, afinal, isso era uma cidade. Não poderia esquecer dos quarteirões para as várias casas e prédios deste centro urbano. No geral, só precisava ficar atento para não errar o caminho que encontrar a escola não seria difícil, pois ela chamava muita atenção.
As poucas cidades que existiam nos quatro distritos eram banhadas de verde, sendo natural que cada construção exibisse um lindo e enfeitado jardim. Mas essa escola levava isso mais a sério, ganhando destaque nesse aspecto. O colégio em si não era tão grande assim, pois também não era necessário, mas o imenso jardim que o circundava era realmente enorme. Além disso, todo o campo era cercado por uma estrutura de ferro branca que o salientava dos demais.
Com essas características relevantes, não precisava de mais para achá-lo.
Comecei a caminhada devagar pela rua, sem me preocupar ativamente com o tempo. O percurso não demoraria muito, o que significava que logo estaria cercado por inúmeras pessoas, e eu não ansiava nem um pouco por isso. Por esse motivo, aproveitei esses poucos minutos para pensar em qualquer assunto que parecesse interessante.
Com essa ideia servindo como ponto de partida, várias outras inundaram a minha mente para um mundo pouco explorado. Nessa biblioteca de informações mal pensadas e mal compreendidas, uma em particular me chamava atenção: a diversidade ampla e bela do universo, juntamente com maneira que tudo era tranquilo e ao mesmo tempo complexo demais.
Eu gostava disso e já tinha pensado sobre, mas, embora não fosse um assunto novo, esquecê-lo era complicado. Viver em um sistema tão grande era algo extraordinário. Uma disparidade complexa com civilizações, habilidades, bestas e costumes diferentes, mas que era regida pela paz, a principal regra que envolvia praticamente tudo.
Talvez o tempo tenha mérito nesse cenário. Essas boas relações entre linhagens foram forjadas há milênios, o que explica o uso de uma única moeda e um único idioma. Certamente, não foi algo fácil de se conquistar, mas conseguir isso era realmente magnífico.
Mesmo que houvesse mundos que não se enquadrassem nessa descrição total de paz e boa convivência, existia outros que eram um exemplo, e o planeta em que vivo é um caso orgulhoso disso. Por quê? Porque não há vestígios de guerra desde os primórdios da nossa espécie, e somos uma civilização realmente pacifica, não só com outras civilizações.
Tão distraído com esses pensamentos quanto possível, mal notei a presença de outros alunos passando por mim, percebendo tardiamente que já havia chegado ao cruzamento onde deveria seguir por outro caminho.
O instituto já estava visível de onde eu estava, parecendo mais próximo e maior do que eu conseguia imaginar. A estrutura branca, formada por dois andares e um telhado tradicional de tom grafite, era adornada por várias janelas de vidro transparente. O gramado, de um lindo verde, com pinheiros dispostos de forma arranjada, parecia exalar alegria, fornecendo uma tranquilidade genuína ao local. Entre tudo isso, o amontado de alunos por todo lugar.
Continuei a analisar o redor e a massa de alunos enquanto caminhava pelo caminho que cortava o jardim. Pensando bem, depois de anos, eu deveria estar acostumado com essa rotina, porém isso não parecia suficiente para me deixar confortável em momentos como esse. Com toda certeza, me habituar com isso estava fora de cogitação.
No meio da multidão barulhenta, aos pés da curta escada que levava às portas da escola, notei um círculo de alunos a alguns poucos metros mim. Pela curiosidade palpável e sussurros que dali saíam, algo definitivamente estava acontecendo, mas mal conseguia ver o que era devido a quantidade de pessoas em volta.
— Pessoal, isso é sério? Divergências logo no primeiro dia de aula? — uma risada alta ecoou por todo lugar, abafando o som das conversas.
Descendo as escadas em direção à comoção, um homem alto e musculoso balançava a cabeça e gesticulava com as mãos negativamente.
Sua pela era de um tom um pouco mais clara que a minha, e o seu cabelo castanho estava aparado formalmente nas laterais. O uniforme que ele usava era semelhante ao nosso, mas a configuração era um pouco diferente. Provavelmente era algum funcionário da escola e, pelo seu jeito de agir, certamente um professor. Até arrisco dizer que ele leciona sobre artes de combate, baseando tal chute em seu físico.
— Vamos, vamos. Todo mundo circulando, as aulas já vão começar. — Sua voz grave, mas ao mesmo tempo apaziguadora, dispersou os alunos pouco a pouco.
Logo as três figuras centrais foram reveladas, mostrando dois garotos, um loiro e outro moreno, que estavam de costas para mim. Na frente deles, um jovem de altura mediana, assim como eu, os olhava com uma expressão calma, mas ao mesmo tempo intensa, promovendo-lhe um olhar imponente. Sua pele clara enfatizava a tonalidade esbranquiçada de seu cabelo liso levemente arrepiado.
— E então? Vão ficar parados aí? — Disse o homem.
Os dois meninos fecharam as mãos em punhos, todavia, desistindo de qualquer confronto, logo se viraram para sair. O homem os observou por um breve momento e depois voltou sua atenção para o cara que sobrou.
— O que aconteceu aqui, Yoshi?
— Calma aí, professor. Não foi culpa minha. — pronunciou ele, levantando as mãos em sinal de defesa.
— Não? — O professor ergueu uma sobrancelha como se duvidasse dele.
— Não, eu só advertir aqueles dois. Talvez você não saiba, mas eles são… esquentadinhos por causa das garotas.
O homem riu e colocou uma mão sobre o ombro do garoto.
— Certo, certo. Deve ser normal nessa idade.
— Você acha? — Yoshi fez uma expressão tão estranha que pude sentir o desgosto por tais ações.
— Sim, você não se lembra de ser assim?
— Graças a Deus, não. — murmurou, provocando gargalhadas mais altas no homem, que deu três tampinhas em suas costas antes de se afastar.
Ao que tudo indica, aquele possível professor possuía uma certa habilidade para resolver situações semelhantes e, além disso, deveria conhecer bem aquele garoto. Voltando minha atenção para Yoshi, o encontrei me encarando descaradamente, sem se importar que eu o tivesse percebido.
Mantive o olhar por alguns segundos, permitindo-me entrar nesse jogo trivial. No entanto, percebendo que não havia tempo a perder com isso, desviei o olhar e subi as escadas.
Ao entrar, não esperava que o pátio estivesse tão na cara dessa forma. O interior, com a mesma cor clara das paredes externas, exceto pelo piso escuro de madeira, era bem atraente. A área designada ficava logo à frente da entrada, bem no centro do colégio e a céu aberto. O lugar, arrumado com bancos nas extremidades, uma fonte sustentando uma estátua feminina e vários cartazes grudados às paredes, estava repleto de grupos de estudantes.
Agora que cheguei aqui, precisava apenas procurar pelo mural da minha turma, o que não seria tão complicado se eu não precisasse atravessar essa frota de pessoas à minha frente.
Sério, por que há tantos?
Suspirei e segui em frente, desviando de cada aluno possível e ampliando minha visão para procurar em cada folha uma lista com o meu nome.
Um tempo se passou, mas finalmente encontrei o pequeno quadro de avisos que exibia a série de nomes dos alunos das respectivas turmas do terceiro ano. Institutos como este, de nível médio, geralmente possuíam apenas duas turmas desse ano letivo, e foi um milagre conseguir uma oportunidade nesta escola pois só havia uma vaga, e cada sala só podia ter 24 alunos.
Então deve estar por aqui?
3° Ano-EM turma: 1
Alunos:
Não, aqui não está…
3° Ano-EM turma: 2
16 – Julia Flenn
17 – Kiara Mendes
18 – Sete Wynn
Certo, só preciso ver as aulas agora.
A primeira disciplina de hoje era sobre magia, e a sala ficava no térreo. O professor que lecionava sobre essa matéria se chamava George, um nome que, por algum motivo, parecia soar familiar.
Deixando para trás o pátio e a cacofonia desorganizada das conversas, iniciei aminha busca pelo “tranquilo” corredor. Alguns alunos passavam várias vezes por mim, e seria prudente perguntar para algum deles sobre o que eu queria saber. Entretanto, e naturalmente, hesitei em fazê-lo.
Enquanto procurava de porta em porta, avistei, ao longe e vindo em direção oposta, a aproximação de uma pessoa conhecida: Maya, a menina que havia me entregado o uniforme ontem. Ao lado dela, outras duas garotas que obviamente eu não sabia quem eram.
Ambas tinham a pele clara, e eram da mesma altura que Maya. Uma delas, loira, tinha cabelos longos e ondulados, com olhos azuis que brilhavam mesmo à sombra. A outra, de cabelos pretos e cacheados, possuía olhos que harmonizavam com a cor de seu cabelo.
Eu não me recordo de ler o nome de Maya na lista da turma dois, mas confesso que mal prestei atenção nos nomes que lá estavam, pra início de conversa. De qualquer forma, foi uma sorte ela ter aparecido.
Cruzei o olhar com o dela e me aproximei. Apesar de preferir evitar contato com os outros, precisava de sua ajuda se quisesse encontrar a sala que procurava.
— Bom dia, Maya. Como vai? — cumprimentei-a educadamente.
— Bom dia, Sete. Estou bem, obrigada. E você?
— Também estou bem.
As meninas ao lado dela trocaram olhares cúmplices e se aproximaram uma da outra, atrás de Maya.
— Esse é o menino estranhamente calmo a que Maya se referiu? — sussurrou uma delas.
Sendo sincero, não sei se tinham o objetivo de esconderem isso de mim. Mas, de qualquer forma, não estava interessado e só precisava saber as informações que procurava.
Maya pareceu envergonhada ao perceber que falaram alto demais, e bateu com os cotovelos nas duas meninas que, por sua vez, expressaram sua desaprovação, mas ficaram quietas.
— Por favor, me desculpe por isso.
— Tudo bem. — respondi, sem dar importância.
— Você precisa de ajuda?
— Sim, estou procurando a sala para as atividades de magia.
— Ah! Você está na turma dois? — perguntou animada.
— Estou.
— Ótimo — o sorriso dela se alargou — isso facilita as coisas. Estou indo para lá agora. Você se importaria de nos acompanhar?
— Não me importo, se estiver tudo bem para vocês.
— Claro que está! Mas antes de irmos, quero lhe apresentar minhas duas amigas: Isa — ela gesticulou para a menina loira — E Kiara — apontou para a segunda.
Kiara? Acho que me lembro desse nome.
— Meninas, esse é o Sete.
— Você já nos dis… — um leve baque interrompeu suas palavras — AI! Por que você me bateu de novo?
— Você fala demais, Kiara. — Maya repreendeu enquanto Isa ria, e Kiara esfregava com força sua cabeça.
Observá-las agindo dessa forma trouxe-me lembranças de Aylla. Provavelmente ela estava bem e deveria estar se divertindo com os seus amigos na escola agora.
Eu me sentia mal por ela. Sempre fomos próximos e ela contava muito comigo. No entanto, as coisas mudaram e eu espero que com tempo ela possa entender o motivo de eu ter ido embora.
— Bom, — Comecei — é um prazer conhecer vocês, Kiara e Isa.
A sala ficava ao fim do corredor, e alguns alunos já estavam lá. O lugar era grande, organizado de forma semelhante à um estádio. As mesas largas, com espaço para três pessoas, estavam dispostas em duas fileiras, como se fossem degraus, na extremidade oposta. O espaço onde eu estava era uma área vazia, sem qualquer objeto visível.
Observando o redor, percebi com atraso que Maya já estava sentada a uma das mesas com Isa e Kiara ao lado. Infelizmente, não consegui agradecê-la por ter me ajudado e não iria lá somente para fazer isso.
Como de costume, escolhi a última mesa à direita, com vista para as janelas, e apoiei minha cabeça sobre as mãos para admirar a paisagem através da vidraça translúcida. A essa hora da manhã, cada canto da cidade era iluminado pela luz, expondo as várias casas, prédios e pessoas passando pela rua. Algo tão normal e sutil, mas que ao mesmo tempo desviava a minha concentração.
Ainda assim, mesmo estando absorto nessa paisagem, senti quando alguém se sentou ao meu lado, mas não me importei em olhar para ver quem era.
— E então, Sete. Como vai?
A voz familiar trouxe memórias recentes, fazendo-me virar para o lado. Como imaginei, era ele, me olhando com um breve sorriso no rosto enquanto esperava uma resposta com expectativa.
— Ah, é! Não me apresentei ainda, eu me chamo Yoshi e é um prazer conhecer você.
Reparei o garoto por tempo, sem entender o motivo de sua aproximação inesperada. Dentre todas as situações prováveis, essa era uma que eu sequer imaginava, mas, que apesar disso, não deveria ser algo com o qual eu precisasse me preocupar.
— Bom dia, Yoshi. — mesurei, medindo minhas palavras — Dispensarei formalidades, visto que, aparentemente, você já me conhece, entretanto, agradeço a gentileza.
Ele se alegrou divertidamente e disse: — Sim, sim. Ouvi sobre a entrada de um garoto novo recentemente e não foi difícil descobrir que se tratava de você.
— Entendo. — respondi, desviando o olhar para a porta, mas corretamente para uma menina que havia acabado de entrar. Sua cabeça girava como um pião, parecendo uma coruja em busca por sua presa.
Suas características eram graciosas. Ela possuía um lindo e cumprido cabelo roxo, na mesma tonalidade de seus olhos agitados. A clareza de sua pele enfatizava sua expressão gentil, a destacando bastante em meio a outras pessoas.
Yoshi acompanhou meu olhar, e eu notei a rigidez se formar em seu corpo quando viu a garota.
— Sete, você se importaria de trocar de lugar comigo?
— Sim.
— Sério? Não seja assim, cara. — A menina sorriu quando o encontrou e começou a se aproximar rapidamente. — Você não gostaria de se sentar ao lado dela?
Balancei calmamente a cabeça para dizer: — Por que eu faria isso? Ao que parece, ela gosta de você, Yoshi. Seria… rude da minha parte atrapalhá-los.
Ele me olhou impaciente, a boca entreaberta enquanto considerava minhas palavras provocadoras.
— Bom diaa, Yoshi! — a menina disse, expressando altamente seus sentimentos — Faz tempo que não nos vemos, não é? Como você está?
— Bom dia, Julia. — respondeu, soando igualmente amável, nem parecia que queria trocar de lugar comigo, mas, pensando agora, por que ele queria evitá-la? — Sobre isso, acho que faz algumas semanas, não? De qualquer forma, estou bem, e você, Julia?
— Hum… deve ser. — concordou ela — Eu estou bem também e gostaria de saber se posso me sentar aqui?
— Claro, fique a vontade.
Com essas palavras, os dois entraram em uma calorosa conversa que não prestei atenção, apenas ouvindo as frases sem realmente compreendê-las.
A sala estava quase cheia e só restava uma mesa vazia à esquerda na primeira fileira, que aguardava pacientemente o trio de mulheres que acabavam de entrar no recinto em meio aos risos.
Uma delas, branca com cabelos cacheados de um tom castanho claro que chegavam brevemente aos ombros, era a mais animada enquanto caminhavam até a carteira vaga. A outra, uma garota com pele semelhante à minha, cabelos platinados compridos e olhos que exibiam um brilhante amarelo, apenas negava com as mãos em defesa do que quer fosse. A terceira, que estava entre as outras duas, também era branca, mas seu cabelo havana era escuro e ondulado, e seus olhos eram azuis em um tom claro que brilhava de forma cativante.
— Vejo que tem bons olhos, Sete. — Yoshi comentou ao meu lado, tentando instigar algo.
— Vejo que você está equivocado sobre mim. — respondi meramente.
— Entendo. — disse, encostando-se na cadeira — Mas não me entenda mal, o que quero dizer é que você tem um bom gosto. Ou estou errado?
Francamente, não sei qual o objetivo dele com esse assunto. Estava parecendo a minha mãe, incentivando-me a conhecer uma garota. Não vou negar que, quando adolescente, procurei tímida e inutilmente por uma garota, mas isso já era passado.
— De fato, elas são bonitas, se é a isso que esteja se referindo, no entanto, quanto a estar pensando sobre possíveis relacionamentos, digo que você está errado.
— Hum… você se julga diferente então?
— Diferente? — questionei — Não, não entenda assim. Não nego minhas vontades passadas, entretanto, não faço mais questão sobre isso.
Ele riu e eu me senti estranhamente desconfortável. Afinal, como chegamos a isso?
— Você é interessante, Sete. Isso era só um teste, mas percebo que aparentemente você não é… obcecado.
Soltei um leve suspiro e me virei para a janela novamente, ignorando ele e qualquer conversa que irradiasse da turma.
Poucos segundos se passaram quando o barulho da porta sendo fechada ecoou pela sala, silenciando os debates e finalmente promovendo quietude.
— Bom dia a todos. — uma voz forte se dispersou por todo o lugar — Peço perdão pela demora, estava em uma reunião conversando sobre assuntos importantes.
O professor, o homem da minha altura e magro que acabara de entrar, possuía uma cor pálida e cabelo preto formalmente penteado. Ele olhou pela sala, considerando cada um de nós enquanto formava sua próximas palavras.
— Sei que a maioria de vocês me conhece, mas vejo que há um novato aqui. — disse, olhando para mim — Felizmente, já sei o seu nome e imagino que você saiba o meu também, portanto, dispensarei apresentações, porque já perdemos tempo demais. — fez uma pausa, cruzando os braços sobre o peito antes de finalizar: — Continuando, sobre o conteúdo desse último ano letivo, gostaria de dizer que iremos revisar praticamente tudo sobre feitiços, habilidades, manipulação e uso da energia Gama. Dito isso, espero que estejam animados, pois a nossa primeira aula começa hoje.