Black Water - Capítulo 3
Duas ou três horas se passaram.
O deserto deu lugar a uma quieta floresta, banhada por pequenos raios de sol que atravessavam as folhas. Andavam por uma longa trilha que a dividia em direção a algo desconhecido.
Com um bloco de notas em mãos, Satoru anotava com satisfação ao olhar as arvores acima de si.
── O que você está escrevendo? ── Nozomi pergunta.
── O que vejo. ── Ele responde.
O vento ameno fazia balançar o cabelo da garotinha, que assim como o espadachim, observava a vegetação onde estava inserida.
── Olha só! ── Satoru corre em direção a uma arvore. Em seus galhos repousavam pequenas frutas avermelhadas. Ele as pega.
── O que é isso? ── A garota pergunta.
── É chamada de Pomona. Li em um livro que o gosto é muito bom. Pega. ── O moreno a oferece.
Nozomi observa a pequena fruta em suas mãos de forma curiosa.
Sua coloração vermelha soava desbotada. Mas o que a impedia?
Comeram. Porém, azeda. Totalmente azeda.
Em sincronia, a dupla cospe o resto da fruta.
── Você não disse que era boa?! ── Diz a pequena em meio a tosses.
── O livro dizia que era. Pelo menos agora Daichi tem algo para jantar. ── O cachorro late enfurecido com a fala do dono ── É brincadeira!
Nozomi ri, passando suas mãos de forma carinhosa no pelo do animal para acalma-lo.
Sua garganta agora estava seca como o deserto que haviam ultrapassado horas atrás. O moreno então abre sua mochila em busca de água.
── Merda. Vamos precisar de água. ── Satoru retira uma garrafa vazia ── Deve ter um rio aqui perto.
── Vamos beber água de um rio?
── E qual o problema?
── Pensei que humanos não podiam beber água de um rio.
── O que? Como a gente beberia agua então?
── De uma maquina super avançada que geraria água automaticamente, é claro! ── Diz ela animada.
O espadachim cai na gargalhada ── Quem te falou isso?
── O vovô.
── Seu avô ta meio velho. Não tem problema a gente beber água de um rio, Nozomi. Diferente do mar, as águas dos rios são doces.
── Por que a água do rio é doce e a do mar não?
── Isso eu não sei. Nunca tive um livro que explicava isso.
── Vocês pareciam ter bastantes livros. O ultimo livro que apareceu na minha comunidade foi queimado.
── É errado queimar livros, sabia?
── Ele não era muito útil, então usamos para fazermos uma fogueira. ── Eles passam a caminhar.
Nozomi sabia que boa parte dos livros foram escritos em uma época muito distante. Talvez nem fizesse sentido usa-los no mundo em que viviam.
Poderia ser tudo mentira de toda maneira.
Histórias contadas por pessoas antigas que fabulavam sobre um mundo que nunca existiu.
A humanidade um dia foi livre como dizia tais contos?
── Confesso que nunca fui um fã de leitura. Mas sempre fiquei pensando se o mundo que existia nessas histórias era real ou não. ── Diz Satoru ── E mesmo que seja mentira, isso não importa. Significa que o nosso mundo ainda tem coisas a oferecer! Você não acha?
A garota sorriu.
Satoru aparentava ser alguém um tanto positivista na maneira de enxergar o mundo. Certamente, ele não era um ingênuo.
Não.
Para sobreviver, e principalmente, lutar como havia lutado, a ingenuidade deveria ser colocada de lado. Então, por que? O que o fascinava tanto?
∞
A dupla improvável se deparou com um rio tempo depois.
A tarde chegava ao fim e um clima alaranjado pelo pôr do sol repousou por toda a floresta.
Beirando o rio, pequenas pedras formavam o solo onde Nozomi se sentou. O espadachim organizava sua mochila metros atrás ao lado de seu fiel cachorro.
Pegando uma das pedras, ela a lança em direção ao rio.
Pequenas ondas se formam na região do impacto e em seguida mais uma pedra é jogada.
Devido a sua pouca força, as pedras não conseguiam se distanciar tanto assim.
Mas era interessante.
Vê-las causar uma mudança de estado naquele calmo rio estranhamente a entretinha.
Contudo, ao observar o outro, uma figura de vestido branco a observava. Parecia uma mulher.
── Satoru! Tem alguém ali!
O moreno se levanta deixando sua mochila no chão.
── Onde?
── Ali! ── Nozomi aponta para o outro lado do rio, porém a figura já havia desaparecido ── Eu tenho certeza que vi alguém ali.
── Você deve ter confundido com algum animal. ── Diz ele ── Melhor irmos antes que escureça.
Olhando novamente para o local onde a estranha figura se repousou, Nozomi se questionou se aquilo fora uma alucinação ou um preludio de algo pior.
∞
O anoitecer chegou. E consigo o medo do desconhecido tomou conta de Nozomi. A pequena segurava timidamente a jaqueta do espadachim, sendo acompanhada por Daichi atrás de si.
Ao mesmo tempo, Satoru se culpava por tê-los colocado nessa situação. Talvez se não tivessem demorado tanto estariam já distantes da mata.
── Ah não. ── Diz o moreno ao sentir gotas caírem em sua cabeça ── Que droga de clima é esse afinal?!
── O que vamos fazer? ── Pergunta a pequena.
O moreno observa o ambiente e fita uma antiga construção a poucos metros.
── Vamos nos esconder ali até a chuva parar.
O grupo parte em debandada em direção ao local.
Em uma firme corrida, se viram acuados com o aumento da fria e tempestuosa chuva. Por sorte, a portão da abandonada construção estava aberto. Eles adentram.
── Bom, queríamos água, não é? Parece que conseguimos. ── De forma ofegante o espadachim diz ao fechar o portão.
Daichi chacoalha seu pelo em uma tentativa de se secar.
── Que lugar é esse? ── A garota estreita seus olhos em busca de enxergar algo.
Bancos espalhados pelo enorme recinto eram iluminados pela luz de janelas quebradas acima. Pingos molhavam os cantos e as paredes.
── Uma igreja. ── Satoru diz.
Um rangido acontece.
── O que é foi isso?
── Shuuu. ── O moreno coloca o dedo indicador em sua boca em sinal de silencio.
Calmamente, ele começa a caminhar.
Suas mãos vão em direção espada, que em poucos segundos é colocada no pescoço de seu alvo.
── Por favor não me mate! ── A figura grita ao sentir a ponta da arma em sua garganta.
Era uma garota.
── Quem é você? ── O espadachim a questiona.
── Alguém que certamente não tem forças para se defender de um espadachim. ── Ela sorri.
Trapos velhos de cor amarronzada e manchas de sujeira na bochecha. Cabelo negro preso em um mal amarrado rabo de cavalo, onde fios rudes escapavam.
Suas mãos estavam levantadas, em sinal de rendição.
Satoru afasta a espada, fazendo a estranha garota soltar o ar preso em seu peito.
── Ouvi um barulho aqui em cima então subi. Pensei que eram ratos, mas acabei achando algo até mais surpreendente, não é? Haha.
Ao ver o clima pesado que havia se formado e a não mudança de expressão do homem a sua frente, ela tosse de forma sem graça dizendo em seguida:
── Q-Que rude da minha parte! Me chamo Koume! Muito bem-vindos ao refugio do glorioso padre Grannus. Sintam-se em casa!