Deckard - Histórias de outro mundo - Capítulo 02
Os dois se colocaram à caminho da caverna, que ficava a cinco minutos da base. Durante o caminho, Mariah revisou a planta da caverna, murmurando sozinha e fazendo anotações no celular, enquanto Deckard se manteve absorto em lembranças.
Ele se lembrava da faculdade, da formatura, a dificuldade em conseguir emprego em sua área e no convite da Discover, que mudou sua vida.
No primeiro momento, foi cético quanto à proposta, pois não era exatamente a maior empresa do setor; porém se consolidou ao longo dos anos e, graças a isso, Deckard colheu bons frutos dessa parceria. Foi o emprego dos seus sonhos e o que mudou sua vida, quando decidiu assinar o contrato, dez anos antes.
Ele mal poderia imaginar que mudaria novamente, no que ele pensava que seria a última escavação que participaria, antes de se aposentar da arqueologia e dar outro importante passo profissional.
— Chegamos — Deckard anunciou, assustando Mariah.
— Sim — Mariah finalmente tirou o rosto do computador e parou com os resmungos. Enquanto olhava pela janela, continuou: — E, para minha infelicidade, a chuva só piorou.
— Tenho um guarda-chuva grande no banco de trás. Pegue-o para mim, por favor.
— Aqui senhor — Mariah entregou o guarda-chuva.
— Tem uma capa de chuva atrás do meu banco, pode usar ela.
— Ah, obrigado senhor, vai me salvar.
Os dois desceram do carro em meio à chuva e foram em direção à guarita improvisada, que demarcava o perímetro e servia para manter possíveis curiosos fora.
— Bom dia, senhor Deckard — o guarda o cumprimentou com um aperto de mãos, assim que o viu.
— Bom dia, senhor Ramos, como está o trabalho hoje? — Deckard perguntou, estendendo a mão para responder ao aperto dele.
— O mesmo de sempre, doutor. O mesmo de sempre — disse, com seu costumeiro sorriso no rosto.
— Bom dia, senhora Mariah, vejo que conseguiu se esconder bem da chuva hoje.
— Bom dia, senhor Ramos. Foi graças ao senhor Deckard — Mariah respondeu, com um ar infeliz estampado em seu rosto.
— Bem, se nos der licença, senhor Ramos. Precisamos ir — Deckard disse ao guarda, seguindo em frente. — Quando eu terminar o trabalho, volto para tomar um café com você.
— Olha que eu vou cobrar, hein doutor — respondeu ele, liberando a passagem.
— Em todos esses anos, a coisa que mais me espanta em todas as escavações, definitivamente, é o bom humor dele — Mariah disse, com sua costumeira face emburrada, comum em dias de chuva. — Eu nunca vi esse homem sem um sorriso no rosto.
— Realmente, é de se admirar. Em todos esses anos, ele tem sido um bom amigo para todos os funcionários.
— Não me espanta que ele esteja à mais tempo que nós na empresa.
Finalmente chegaram à entrada da caverna, deixando o Sr. Ramos com seu inabalável bom humor e entrando na penumbra do local.
Depois de mais algumas centenas de metros, encontraram o responsável pelos auxiliares, examinando um mapa todo rabiscado.
— Senhor Deckard, não imaginei que o senhor estaria aqui tão cedo assim — disse o Sr. César, indo ao encontro dos dois.
— Bom dia, senhor César.
— Bom dia, senhor César — Mariah o cumprimentou também.
— Bom dia — respondeu ele, com um sorriso no rosto. — Isso sim que eu chamo de amor ao trabalho.
— Que nada, meu caro.
— Já que estamos aqui, vamos ao que interessa — disse, mostrando o mapa com muitas anotações e rabiscos. — Demos uma atualizada com o que pudemos perceber do local, mas estamos esperando o senhor para podermos entrar e explorar o restante.
— Então, vamos lá — Deckard respondeu, pegando o mapa e indicando para que ele fosse na frente.
Eles acompanharam o Sr. César até o lugar da descoberta. Chegando lá, se encontraram com os dois exploradores auxiliares, Carl e John. Dois irmãos que se jogariam no próprio Tártaro, em busca de novos lugares para explorar.
Carl, com seus 1,80m e seu perfil mais magro do que o de John; que era cerca de dez centímetros maior e uns bons dez quilos mais gordo do que Carl, parecia que haviam acabado de voltar de uma visita ao túnel. O que podia ser percebido graças às suas roupas estavam completamente empoeiradas. Pareciam tão absortos em um debate, tentando estimar a extensão do túnel, que nem perceberam a aproximação do grupo.
— Carl? John? — chamou César. — Aqui estão o senhor Deckard e a senhora Mariah.
— Senhores — responderam os dois, em uníssono, enquanto meneavam a cabeça em um rápido cumprimento.
— Bom dia — foi a resposta rápida de Deckard e de Mariah.
— Então, em que passo estamos? — Deckard perguntou, mais para limitar os assuntos desnecessários, do que para que o colocassem à par; uma vez que César já o havia feito durante o caminho.
— Só estamos esperando o senhor para entrarmos, doutor — disse Carl, enquanto virava e seguia rumo ao túnel. — Todas as informações que podíamos coletar do lado de fora já estão no mapa que o Sr. tem em suas mãos.
Assim que chegaram ao local, Deckard se recusou a perder tempo e já colocou o capacete em sua cabeça, acendeu a lanterna do mesmo e a lanterna de mão. Colocou o colete de segurança, pegou o rolo de corda e se preparou para tentar entrar.
— Mariah, avalie o lado de fora, junto com o César, por favor.
— Claro, senhor.
— Veja o que consegue descobrir da formação que manteve esse lugar escondido no primeiro momento.
— É pra já senhor, irei descobrir até o último segredo desse lugar — ela respondeu com os olhos já brilhando e esfregando as mãos, ansiosa pra começar. — Vamos lá, Sr. César.
— Então, aqui vamos nós também, doutor — disse John, enquanto pegava o restante do material de exploração e seguia Carl.
Agora que estava olhando para o túnel, Deckard percebeu que era um pouco menor do que esperava.
— Bem, doutor — Carl começou, com uma expressão sem graça. —sinceramente, só esperamos até agora devido ao tamanho dessa entrada, como pode ver.
— Bem, eu não podia arriscar ficar entalado, doutor — disse John, com um ar divertido — a minha cinturinha já não é mais a mesma, hahahah.
Após algumas risadas e um breve debate, Deckard e Carl se prepararam para entrar; uma vez que fazia parte das regras de segurança não permitir a entrada de alguém sozinho, por conta dos possíveis riscos.
Carl decidiu entrar primeiro e Deckard o seguiu, ansioso para ver o que os aguardava do outro lado.
A ansiedade era tão grande que Deckard podia ouvir as batidas de seu coração reverberando no túnel, como se um coração colossal batesse naquelas pedras.