Deckard - Histórias de outro mundo - Capítulo 05
Olhando para aquela mensagem, Deckard pôde perceber que a tela holográfica onde aparecia era a responsável pelo brilho azulado que estava vendo, desde que acordou. E percebeu que a mensagem não estava apenas em sua mente, mas estava à sua frente também.
Ver esse brilho azulado o trouxe de volta à realidade, fazendo Deckard perceber que não estava morto e, além disso, que havia algo de errado com seu corpo.
Não faltava nada, pôde isso perceber sem esforço; mas a sensação era diferente do usual. Sentia como se estivesse vendo o mundo de um nível mais abaixo do que estava acostumado.
Olhou seus braços e mãos, suas pernas e pés e percebeu que seus membros pareciam ser mais curtos do que deveriam.
— Será que eu encolhi, de alguma forma? Será que estou em um mundo de gigantes? — A curiosidade roubou sua atenção, o impedindo de se entregar ao desespero novamente.
Deckard olhou em volta e reparou no lugar em que estava. Uma pequena clareira, em meio à floresta, próxima à uma poça de água; que lembrava muito as minas de água que estava acostumado a encontrar durante as escavações.
Ele decidiu seguir em direção à água e olhou seu reflexo, temendo o que iria ver, mas nada o preparou para o que seus olhos encontraram. Era como se estivesse olhando pro seu eu de vinte anos, quando devia encontrar a face de um homem nos auge dos seus quarenta anos.
— E-eu… rejuvenesci? — não pôde deixar de se espantar, enquanto tocava seu rosto, para ter certeza de que aquilo era real. — Eu estou com vinte anos novamente?
Passado o choque inicial dessa descoberta, ele voltou sua atenção para aquela tela no alto de sua cabeça. Ela trouxe à sua memória o que ocorreu na caverna. Isso fez Deckard sentir uma leve dor na cabeça, enquanto relembrava.
Mas, suas lembranças não passavam de borrões. A única coisa que se recordou claramente foi do nome do deus romano da guerra e do show de luzes, antes de acordar naquele lugar.
Decidiu então descobrir o que essa tela podia fazer. Tentou tocar nela, tentou mexer com as mãos, mas não conseguiu. Então, tentou pensar em formas de usar ela. De repente, se lembrou dos jogos eletrônicos. Por um momento, nada pareceu o ajudar. Releu a mensagem, dessa vez, em voz alta.
Uma nova mensagem apareceu em frente ao seu rosto:
– DESEJA DISTRIBUIR PONTOS DE ATRIBUTOS ? –
Logo abaixo da mensagem, ele via opções piscando:
[SIM/NÃO]
Por curiosidade, decidiu escolher o sim.
Logo, outra tela foi mostrada e ele percebeu que essas telas holográficas eram acionadas por comando de voz ou quando lidas mentalmente.
— Isso deve poupar o constrangimento de ter que falar sozinho — disse, antes de perceber que já estava falando sozinho.
Começou a olhar as informações que a tela azulada trazia e a se sentir cada vez mais em um jogo de computador.
Decidiu analisar cada parte da tela, para ver se tinha alguma pista do que estava acontecendo.
Nome: Deckard Crowford
Idade: 20
Nível: 0
Status (Saúde): Saudável
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Profissão: Não atribuído
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Atributos:
Força: 9
Destreza: 10
Inteligência: 14
Carisma: 8
Magia: 8
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PONTOS NÃO DISTRIBUÍDOS: 5
Olhando para essas informações, Deckard se sentiu ainda mais perdido, por não saber o quão bom ou ruim seria, comparado com outras pessoas.
Olhando com mais atenção, percebeu que ainda haviam pontos para serem distribuídos. Cinco pontos não pareciam ser tantos assim, então decidiu seguir um padrão de atributos e dividi-los, de modo que seus atributos de força, carisma e magia atingissem dez pontos.
Mesmo não sabendo nada de magia, ele achou que seria uma boa ideia.
Assim que colocou mais um ponto em força, ele sentiu uma sensação estranha, como se um formigamento passasse pelo seu corpo. Mas, quando colocou pontos nos outros atributos, não sentiu nada. Talvez por serem atributos que não influenciam em capacidades físicas diretamente. Mas, ainda assim, estava decidido a manter um equilíbrio.
— Já tem algum tempo que estou aqui, mas até agora não vi nada além de mato e também não vi ninguém. — Ele percebeu que estava falando sozinho com uma frequência bem grande.
Pensou sobre isso durante algum tempo e se lembrou do seu sonho, da vila no pé das montanhas.
— Talvez eu devesse ir até lá — ponderou, falando em voz alta; pois não seria uma boa ideia ficar em uma floresta desconhecida, durante a noite. — se for realmente aquele lugar do sonho, talvez eu possa receber abrigo.
Deckard se pôs a caminhar, para tentar voltar pelo caminho que havia percorrido, porém parou logo em seguida, incomodado com a tela que ainda piscava acima de sua cabeça.
— Como eu tiro isso daqui, hein? — Ele não sabia se era algo único dele e não queria correr o risco de que outros vissem essa tela.
Olhou pra ela novamente em busca de uma resposta e, só então, percebeu um pequeno símbolo (?) no canto inferior dela. Resolveu tentar clicar nele mentalmente.
Uma tela com informações surgiu. Ao que parecia, essa tela tinha algumas abas, sendo elas:
Status (Atributos);
Inventário;
Habilidades (Magias);
Equipamentos (Armas e Armaduras).
Ele descobriu também que todas elas são acionadas através de comando mental, o que iria lhe ajudar muito. E, quando não estavam em uso, era só pensar em fechar, que elas sumiriam.
Agora iria ver o que havia naquela vila.
Ele andou durante um bom tempo, antes de chegar no ponto em que estava antes.
“Caramba, parece que corri bastante. ”
Não pôde deixar de pensar, surpreso.
Depois de cerca de meia hora andando, finalmente começou a se aproximar da vila, que nem parecia grande o suficiente para ser chamada assim. Era composta por cerca de dez ou quinze casebres, todos bem pequenos e humildes, com exceção de um, ligeiramente maior do que os outros.
Deckard entrou na pequena vila e, diferente do que esperava, não encontrou ninguém.
Entrou em todas as casas, e por mais que tenha procurado, não encontrou uma alma viva sequer. Tudo que encontrou foi uma faca velha, de aparência gasta, que decidiu pegar, junto de uma capa velha, esfarrapada. Assim que pegou os dois objetos, uma nova tela azul apareceu em sua frente, lhe dando um baita susto.
– DESEJA GUARDAR OS ITENS NO INVENTÁRIO? –
— Guardar — ele respondeu, se surpreendendo, ao ver os objetos sumirem das suas mãos — Oh, isso é bem útil.
Depois de não encontrar ninguém em nenhuma das casas menores, decidiu ir olhar na única que não havia entrado.
Entrando na construção maior, viu apenas uma cama velha, feita de palha, enrolada em um lençol encardido; alguns potes de argila e uma pequena panela velha. Depois de mais alguns minutos procurando, encontrou um velho cantil, que guardou no seu inventário, junto com a panela.
Encontrou também alguns poucos livros, bem surrados, que falavam sobre ervas e um que falava sobre alguns animais que poderiam ser encontrados nesse mundo.
A maior surpresa para Deckard aconteceu no momento em que abriu os livros e descobriu que podia ler o conteúdo, escrito em latim.
Ele decidiu sentar na velha cama e ler os livros. Quando terminou, percebeu que o fim da tarde já estava próximo. Além disso, se deparou com uma mensagem do sistema, outra vez.
DECIFRAR ESCRITA: Nvl. 1 ADQUIRIDA
— Finalmente, parece que consegui alguma coisa boa nessa vila — Deckard disse, surpreso com a tela que estava vendo.
Ele se sentiu feliz em saber que todos os anos estudando diferentes idiomas na Terra iriam lhe ajudar de alguma forma nesse lugar.
— Agora, preciso encontrar algo para comer e um pouco de água — Pensou, saindo para procurar.
Acabou não encontrando água e nem alimento na vila e se viu obrigado a voltar para a floresta, até o lugar onde encontrou a mina de água, para abastecer o cantil.
No fim, não foi tão difícil encontrar alimento, com a ajuda dos livros que encontrou na vila. Ele encontrou algumas plantas que pareciam com batatas e decidiu voltar para a vila, pois não queria arriscar encarar a floresta durante a noite.
No dia seguinte, pela manhã, decidiu explorar a floresta novamente, na esperança de encontrar algo útil.
Depois de muito procurar, encontrou o que pareciam ser rastros de algum animal. Sem conhecimento aprofundado da fauna e flora local, decidiu seguir com cautela, para não acabar encontrando algum animal que pudesse lhe colocar em risco.
Depois de mais algum tempo, viu dormindo, sob uma árvore com tronco bem largo, o que pareceu ser alguma espécie bem pequena de javali. As diferenças estavam no tamanho, próximo ao de um javali filhote e na coloração chamativa do animal.
Depois de olhar com atenção, Deckard pôde ver que haviam presas duplas em cada lado do focinho, formando um Y curvo, e seu pelo brilhava uma cor que estava entre o laranja vivo e o vermelho sangue. Ele abriu seu inventário e encontrou o livro sobre monstros. Buscou rapidamente e encontrou o que procurava, logo nos primeiros capítulos.
— Solaris Apri? Javali Solar — Leu em voz alta, vendo que a descrição batia com a do livro — Ainda bem que não é um monstro feroz e está dormindo, eu estou mesmo precisando de um pouco de carne.
Após ler mais um pouco, Deckard encontrou o ponto fraco dele e se preparou para abater o animal.
— Esses livros foram um achado e tanto. — não pôde deixar de se sentir feliz com a sua sorte.
Ele pegou a capa velha, com a ideia de cobrir o rosto do javali e impedi-lo de tentar fugir ou de contra-atacar e sacou a faca desgastada. Seu plano era chegar por trás do animal, sem ser notado. Assim que conseguisse, iria usar o momento de confusão do javali para dar o golpe final no animal.
— Quem diria que equipar uma faca assim iria me ajudar — Deckard se surpreendeu ao ver que a faca, mesmo naquelas condições, lhe deu um bônus de +1 de força.
Com os itens em mãos, ele fez o possível para se aproximar do javali sem assustá-lo. Respirou fundo, repassou o plano mentalmente e chegou bem perto.
Com um movimento rápido, ele embrulhou a cabeça do animal com a capa e deu um golpe com a faca, mirando a garganta dele. Por sorte, se tratava de um pequeno animal e não foi tão difícil matá-lo.
Esfolar e limpar também não seria um grande desafio, uma vez que ele tinha alguma experiência com isso na Terra e o animal não diferia muito de um javali.
Ele encontrou um cipó e um galho com um tamanho bom o suficiente e se preparou para voltar para a vila. Não havia andado muito, quando sentiu um arrepio pelo corpo, acompanhado por um rosnado que lhe gelou o sangue.
Deckard se virou para trás, apenas para ver um vulto enorme avançando como uma flecha em sua direção e acertando um golpe poderoso em sua cabeça. Uma vez mais, foi de encontro à sua nova e frequente companheira, a inconsciência.