Em Busca do Estrelato - Ato 3
Arthur
— Uma forma de atuar é se envolver nas próprias memórias para assim, conseguir as emoções necessárias que o papel pede, e eu consegui ver isso naquela garota claramente aquele dia. Muito impressionante.
— Então, porque a rejeitou?
Naquela grande sala no topo da sede principal da maior agência de talentos do país, busco tirar satisfação com a “manda-chuva” afinal, não se pode simplesmente ignorar um talento em potencial tão grande quanto o daquela garota.
A velha me observa atentamente com seus penetrantes olhos verdes. Ela está sentada atrás de uma vasta mesa de mármore polido, com os braços cruzados em sua postura característica. Atrás dela, uma enorme parede de vidro revela uma vista deslumbrante da cidade lá fora, estendendo-se até onde os olhos podem alcançar.
O interior do escritório é um reflexo do seu gosto refinado. As paredes são revestidas com um papel de parede em tons suaves de marfim, iluminadas por suntuosos lustres de cristal. No canto, uma lareira acesa adiciona um toque acolhedor à atmosfera geralmente austera.
A mesa de mármore é imaculadamente organizada, com uma caneta-tinteiro de ouro descansando sobre um bloco de notas de couro. Os assentos ao redor da mesa são estofados em couro, conferindo um ar de autoridade e elegância ao espaço. A sensação geral é de sofisticação e poder, uma sala que reflete bem a Alice.
Apesar de toda a tralha decorativa, não consigo sentir uma vibração nesse lugar. Está cheio, mas ao mesmo tempo tão vazio, como se estivesse faltando alguma alma ali.
Ela solta um breve suspiro após alguns segundos me olhando nos olhos fixamente, e então responde minha pergunta com outra.
— Você acha que atuar vai deixar aquela menina feliz?
Revirei os olhos.
— Isso de novo?
— Vocês diretores são todos iguais, só se importam com o projeto e mais nada.
Alice faz essa afirmação com uma tranquilidade que me tira brevemente do sério, enquanto se levanta, sem parar de falar.
—Essa garota vai se destruir seguindo esse caminho e eu posso sentir isso só de vê-la esboçar aquela expressão no dia da audição.
— Você se refere a um colapso emocional? — pergunto enquanto coloco minhas mãos no bolso – como você mesmo sofreu na sua época de ouro?
O rosto de Alice, uma máscara envelhecida e repleta de experiências, se contrai gradualmente com seus olhos verdes fulgindo com uma intensidade incomum. Ela é uma lenda viva, uma atriz que se destacou no mundo todo, com tantos prêmios que nem se pode contar. Mas essa era é agora uma sombra distante, uma sussurrada da memória.
Sua carreira brilhante cedeu espaço a uma agência de talentos, como se ela estivesse escapando de sua própria sombra. O que a atormentou tanto que ela abandonou o palco, onde uma vez reinou, e se refugiou atrás das cortinas do poder?
Ninguém sabe exatamente o que aconteceu, mas relatos nada detalhados dizem que ela teve alguns colapsos emocionais… Sua expressão irritada deixa claro que as feridas do passado não podem ser facilmente remexidas, um tabu que nenhum repórter ou fã jamais desvendou. E agora, naquele nosso pequeno confronto, ela quebra o breve silêncio que se formou.
— Se tornar uma pessoa diferente pode ser uma habilidade assustadora nas mãos de alguém emocionalmente instável — ela se aproxima de mim calmamente, me olhando nos olhos — E eu não criei a Galaxy para arruinar a vida das pessoas.
Dizendo essas palavras, Alice Hill caminhou com passos lentos em direção à sua mesa, com a luz do escritório destacando cada detalhe entalhado na madeira escura. Ao se sentar, o som suave do couro da poltrona, preencheu o espaço. Ela fez um sinal com as mãos, indicando que a reunião havia chegado ao seu fim.
Não tem muito o que fazer após esse gesto, a não ser desafia-la é claro! Caminhei decididamente até sua imponente mesa de mármore, meus sapatos ressoam no chão de madeira maciça. Minhas mãos se chocaram contra a superfície polida, um eco surdo reverberou na sala, e eu a encarei com um sorriso irônico que espelhava a tensão entre nós.
— Ela tem um talento impressionante e eu vou torna-la uma atriz.
— O que é uma atriz para você, Arthur?
Não entendi bem a pergunta, então só respondi de forma sincera.
— Não é óbvio? É aquela que traz emoção para as pessoas.
Não sei dizer que resposta ela esperava que eu desse, nem ao menos sei o que ela achou das minhas palavras, Alice me encarou profundamente com seus olhos cor de esmeralda, travamos uma pequena batalha, o fervor do meu olhar desafiava a serenidade do seu, gelo contra fogo! e após um breve momento, ela abaixou levemente a cabeça, fechou seus olhos por alguns segundos e então, me expulsou do lugar.
***
Descendo as escadas largas e imponentes do hall de entrada do colossal edifício, uma construção que se ergue como um titã de concreto, minha mente se enche de reflexões. Os pilares altos e elegantes conferem ao lugar um ar majestoso, como se fosse uma catedral de vidro e aço. Vidros brilhantes e um revestimento de mármore refletem as luzes do hall, acrescentando um toque de luxo ao ambiente.
Os fios distantes de conversas, passos apressados e o eco ocasional de saltos femininos preenchem o espaço, como a sinfonia de uma cidade, pessoas entram e saem, cada uma com seu próprio propósito, imersas em suas atividades diárias.
A realidade é que não faço a menor ideia do meu próximo passo, sem o apoio da Galaxy tudo acaba se tornando mais difícil…
Com a cabeça perdida em pensamentos, acabo não olhando por onde ando e esbarro em uma garota loira que cai ao chão, estendo minha mão para ajuda-la e a reconheço no mesmo instante afinal, um bom diretor sempre decora rostos já que para a escolha de um elenco, selecionamos uma pessoa em sete bilhões.
— Você é a Alya Hill, não é ? — pergunto, mesmo já sabendo a resposta.
— Sim, sou eu mesmo e você bem que podia olhar melhor para onde anda.
Marrenta igual à mãe.
— Espera! Você estava no mesmo grupo de garotas que a Kate nas audições da semana passada, não é mesmo ?
Ela ergue uma das sobrancelhas e me encara confusa por alguns segundos.
— Kate? Você diz a garota que desistiu?
Desistiu? Certamente tem uma confusão aqui, mas é uma confusão que posso me aproveitar.
— Alguém desistiu? – pergunto, curioso.
— Sim, fui encher o saco da secretaria da minha mãe para ver se eu havia passado e ela acabou me dizendo isso
— E sua mãe sabe disso?
— Não… — sua face de irritada pouco a pouco ficava mais animada, como se seu cérebro estivesse a lembrando gradativamente de mim – Espera ! Você não é um dos diretores da audição do outro dia?
Mantive minha postura relaxada ao confirmar, colocando uma das mãos em seu ombro.
— Certifique-se que sua mãe não saberá nada sobre isso.
Alya me encara confusa por um tempo e apenas confirma.
— Mas… Porquê?
Ela levanta a voz para perguntar enquanto nos distanciamos um do outro, minha resposta, de inicio, vem na forma de um gesto casual, levantando uma das mãos sem sequer me dar ao trabalho de olhar para trás.
— Uma oportunidade de ouro apareceu, Alya.
Kate
Chegando no prédio da Galaxy, onde também vai ser realizado a segunda fase das audições, eu novamente me surpreendo com a grandeza do local, nesse quesito, nada mudou. O edifício parecia ainda mais majestoso, com seus suntuosos corredores revestidos de mármore e iluminados por lustres cintilantes. Grandes janelas de vidro revelavam vistas panorâmicas do entorno urbano movimentado, amplificando a sensação de grandiosidade.
Acabo deixando meus irmãos com o “agente Mike” e a moça de cabelos cacheados, seu nome é Helena e eles aguardam em uma pequena sala de espera, enquanto eu vou até o lugar onde irei atuar na segunda fase, que fica bem ao lado.
***
Não sou do tipo de pessoa que entende toda a atmosfera da situação instantaneamente e consegue dizer quando o clima está ou não pesado entre um grupo de pessoas, na verdade, eu sou uma garota extremamente lerda. Porém, eu consegui sentir, no momento em que entrei nessa lugar, que o clima está meio tenso entre o Arthur e a senhora jurada da audição passada, eles trocam poucas palavras em voz baixa, mas os olhares assassinos são constantes entre os dois.
Estamos em um salão amplo, nossas respirações preenchem o vazio ao redor. A atmosfera é tensa, marcada pela expectativa. Os juízes são diferentes dos da última vez com exceção da senhora loira e do Arthur que ficam em frente. Nos bastidores, alguns homens com trajes técnicos e câmeras de gravação estão em posição.
Eu estou organizada no meio do sala com as demais garotas que passaram para o teste final, dentre elas a senhorita empatia que parece me devorar com os olhos, porém não vejo a Jéssica o que me deixa meio magoada, afinal ela foi super legal comigo e eu queria que ela tivesse passado.
— Como já sabem, vocês vão gravar uma cena nessa seleção final.
Essa foi a primeira palavra dos juízes dirigida a nós candidatas, desde que entramos no salão. Um dos jurados começa a falar e então dá uma pausa para que a senhora loira de continuidade.
— Uma pantomima, o que significa que vocês vão usar somente o corpo e o rosto para expressar o cenário que vamos narrar, entenderam?
Sua voz firme e olhar penetrante fez com que ficasse bem claro o que deveria ser feito e todas só esperavam o início da narração, mas antes de qualquer coisa ser dita, Arthur em um tom de deboche faz uma pergunta, encarando os olhos verdes daquela mulher que não aparentava estar de bom humor.
— Não tem nada a acrescentar, Alice?
Então esse é o seu nome.
Alice fica olhando fixamente para ele por alguns segundos até enfim soltar um suspiro, seguido da sua resposta.
— Eu priorizo cultivar a felicidade do artista.
Suas palavras não fizeram muito sentido na minha cabeça e tenho certeza que ouvi ela sussurrar algo para o Arthur, mas tudo bem já que tenho coisas mais importantes com o que me preocupar no momento afinal, eu sou uma completa amadora e nunca tentei atuar seriamente, tudo que já pratiquei foram esboçar apenas sentimentos. Eu sei o que é uma pantomima e como funciona, mas é a primeira vez que participo de uma, estou um pouco nervosa, porém ver meus irmãos acenando, atrás de uma enorme vidraça em umas das paredes, me deixa um pouco melhor.
— Então, o cenário é…
Todas ficam atentas as palavras da Alice que fez questão de dar uma grande pausa antes de continuar falando, parece até que está fazendo de propósito para dar algum tipo de tenção, o que está dando muito certo porque posso sentir meu coração pulsar levemente mais rápido.
— Um lobo selvagem.
Um lobo selvagem? Não entendi, eles querem que todas atuem juntas ou coisa do tipo? E eu nem sequer consigo imaginar um lobo selvagem já que nunca vi um, para ser sincera a minha visão da criatura está um tanto… Fofa?
Olho para os lados e vejo que as demais garotas também não sabem muito como reagir, o cenário proposto não está muito detalhado, algumas começaram a chorar de medo e outras tentaram esboçar pânico.
Não consigo visualizar nada, só consigo pensar nos meus irmãos até que o Arthur começa a detalhar mais a cena.
— Isso, vocês estão em uma floresta escura após uma longa e exaustiva caminhada…
Fecho meus olhos e começo a me concentrar.
— Mas olha só, vocês se deparam com um lobo selvagem, sua pelagem suja mostra que ele vagou muito pela região, seus olhos dourados focam fixamente em você com uma clara sede de sangue, suas presas enormes estão completando a amostra, seu rugido fica cada vez mais alto e a criatura saliva como um cão raivoso afinal…
…Ele está…
— …extremamente faminto.