Entre Neve e Cinzas, As Memórias Daquele Amor Doentio Permanecem - Capítulo 81
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- Capítulo 81 - Mas afinal, quando este inferno irá acabar? (2/2)
Acho que já executei o plano com tantas variações quanto um ser humano seria capaz de conceber, mais nenhuma forma de arquitetar meu suicídio vem à mente. Não sei o que eles esperam que eu faça de diferente.
Tentei finalizar o jogo com nenhuma morte além da minha, isto incluindo os funcionários e professores que impedi de saírem da escola e terem suas existências apagadas antes do anúncio do jogo.
— Vocês não podem sair daqui de jeito nenhum! Irão morrer se fizerem isto! Todos para trás! — ameacei com uma faca.
— Ele está louco, deve ter usado alguma droga antes de vir para escola. Chamem a polícia para detê-lo — disse o diretor.
— Estamos sem sinal telefônico, senhor. Estranhamente meu celular também não está pegando — respondeu o funcionário.
— Que estranho, o meu também está fora do ar. Um problema na torre talvez?
— Se vocês tentarem sair, a Morte irá os ceifar! Escutem o que estou dizendo! Ninguém pode sair da escola! — continuei empunhando a faca.
Um esforço em vão… nenhum resultado. Acredito que não são com vidas que aquelas entidades estão preocupadas, provavelmente não dão a mínima para isso.
Vendo que não tive nenhum resultado ao zerar o número de vítimas, tentei partir para o extremo oposto. No qual, com exceção de Ailiss e Mikoto, eu executei cada alma viva dentro desta escola.
Para isto, utilizei da metralhadora de Ailiss, bem como do meu plano incendiário que havia fracassado anteriormente.
— Saiam da frente! Está pegando fogo!
Eles não tinham para onde correr. Ao saírem do bloco, eles depararam-se com o estrondo de projéteis. O rasgo atravessa seus corpos perfurando vários alvos de uma única vez.
Obviamente apenas me vejo em um mar de sangue por uma infinidade de vezes sem nenhum resultado aparente.
Agora, depois de todas essas tentativas, somente permaneço deitado no chão do pátio enquanto encaro o céu em busca de respostas.
O que mais eu poderia fazer? Já fiz de tudo e não consegui encontrar uma pista sequer de como encerrar estas infernais repetições. Vejo-me preso dentro de um relógio quebrado sem qualquer esperança perante o fim da minha sentença.
Fecho os olhos e me concentro um pouco mais.
Consigo pensar em algo que ainda não tentei, entretanto não há o menor indício de sucesso, talvez seja apenas uma forma de eu tentar descarregar a minha raiva contra este jogo.
Caminho até as proximidades da entrada da escola, então fito as roupas dos funcionários que foram deixadas para trás ao serem desmaterializados.
A possibilidade deles não terem morrido ao desaparecer não é nula, nada garante que aqueles malditos não tenham mentido alguma regra na hora do anúncio.
Sim, como irei morrer de uma forma ou outra, acho que não custa nada tentar.
Decido tentar cruzar o portão e encarar a Morte de frente.
Vou fazê-la pagar por tudo isto! Por todo o sofrimento que nos causou!
Aproximo-me mais um pouco e vejo uma neblina de escuridão surgindo e moldando-se numa figura humanoide.
Então essa criatura é esperta, ela já presumiu as minhas intenções apenas de eu chegar próximo à saída.
Com a Morte totalmente materializada, pego impulso e corro em direção ao portão.
Suma sua desgraçada!
Salto em sua direção e preparo um soco bem dado em seu crânio exposto. Entretanto, no momento em que meu corpo cruza o portão da escola, o tempo simplesmente congela.
Vejo-me parado no ar diante dela sem conseguir mover um músculo do corpo, as engrenagens do relógio param de girar, não escuto mais nenhum som, está tudo imóvel.
O que está acontecendo aqui? Ficarei preso assim desta forma?
Em seguida, percebo que a Morte começa a mover seu braço enquanto todo o resto do mundo continua paralisado. Entendo… neste caso, é impossível vencê-la ou fugir.
Sem a menor chance de reação, sou ceifado no mesmo instante.
A foice que cruza o meu tórax não deixa nenhum ferimento ou evidência de corte, mas em seguida vejo meu corpo inteiro se desintegrando lentamente. Tal como um defunto, começo a apodrecer ainda vivo e ao mesmo tempo a minha visão escurece.
A dor causada por este corte é indescritível, já realizei meu suicídio das mais variadas formas e nada foi tão agonizante quanto ter a sua alma rasgada.
Será que ao menos minha existência será apagada desta forma?
…
Não.
Eu falhei de novo.
Tento confrontá-la novamente, porém desta vez utilizando-me do ônibus escolar, mas o resultado é o mesmo.
Juntamente ao ônibus, sou rasgado ao meio.
…
Meu corpo aos poucos está se acostumando com as fortes descargas de informação de modo que o enjoo não me afeta mais tanto assim.
Por favor, apenas parem de me fazer recomeçar esta merda de jogo! Já chega! Eu não suporto mais isso! Eu só quero sumir!
…
Aguardo até o habitual horário no qual Ailiss esconde a sua metralhadora no pátio. Logo após ela deixar o recinto, eu a pego e me dirijo com ela exposta ao bloco principal.
— Ei, cara. O que você está fazendo com isso? É um pouco perigoso andar com algo assim — pergunta um rapaz nervoso enquanto recua alguns passos.
Sem responder seu questionamento, viro o cano da arma em sua direção.
— Não, por favor. Não me mat-.
Antes que ele pudesse encerrar a sua sentença, executo três disparos.
O som ressoa no saguão e apavora a todos nas proximidades. Resultando então em centenas de alunos tentando deixar o bloco principal.
Minha mente em pleno ato mantém-se vazia. Nenhum pensamento ou ponderação sobre minhas ações manifesta-se. Permaneço assim, numa forma de piloto automático em que o meu corpo prossegue os matando.
— Ele está armado, saiam da frente, deixem-me passar! — grita uma garota.
— Eu também quero fugir! — grita outro.
Em meio a toda esta disputa por espaço na hora da fuga e sem saber para onde correr embosco um a um.
Puxo o gatilho da metralhadora e começo a matar desenfreadamente todos que surgem à minha frente.
A quantidade de gritos ensurdecedores e o som dos meus disparos tomam conta de todo o bloco.
Nestas milhares de tentativas eu não fui capaz de encontrar nenhuma informação nova. De modo inconsciente restrinjo-me a descontar toda a minha frustração desta forma.
Já não arquiteto mais plano algum, não economizo meus disparos com o intuito de matar a todos. Apenas sigo meus impulsos irracionais de matar desenfreadamente. Esta prática está tão enraizada na minha mente que serve como um escape desta própria realidade.
— Socorro!
— Por favor, não me mate!
— Alguém o pare!
Aponto e puxo o gatilho.
Aponto e puxo o gatilho.
Disparo atrás de disparo.
Olho aos meus arredores e só vejo gente morta caída ao chão. Um mar vermelho cobre o piso da escola de ponta a ponta.
Observo meu corpo e percebo que minhas vestimentas estão também todas tingidas de sangue. A única reação que me toma ao ver tamanha atrocidade é um riso de desespero, pois neste ponto não tenho mais nenhuma noção do que fazer, do que seguir.
Sinto um forte impacto e então derrubo a metralhadora.
Olho para a minha mão ensanguentada e constando que foi acertada por um projétil.
A única que poderia fazer isso… Ailiss?
Olho para o lado e vejo que ela me desarmou. E nesta distração um rapaz que estava caído, levanta-se com um caco de vidro em mãos parte para cima de mim.
Tento esquivar-me, mas com uma das minhas mãos feridas não consigo reagir adequadamente e então ele corta a minha garganta.
— Morra seu maníaco! — apunhala.
O vidro é cravado sistematicamente em minha carne.
Apunhala-me.
Apunhala-me.
…
Morri. Eu morri de novo. Já não tenho mais ideias… e muito menos forças para continuar.
1º Dia
10h27
Estou muito cansado. Não consigo mais estimar as milhares de vezes que estou sendo forçado a isso. Não tenho mais condições mentais para continuar… a única coisa pela qual passei a ansiar foi pelo meu próprio desaparecimento.
Eu quero sumir.
Por que esta droga de regra não se aplica a mim? Já cansei de ser ceifado e nada… continuo existindo.
Ailiss, Mikoto. Há quanto tempo nós não pudemos mais ter uma conversa franca? Aquelas preciosas memórias parecem estar sendo ofuscadas pela imensidão do tempo. Sinto que praticamente a minha vida inteira já se diluiu neste inferno, mas luto com todas as minhas forças para ao menos preservar nossas memórias juntos, algo que definitivamente não posso esquecer, pois isto é meu maior tesouro. É a razão por ter lutado até aqui.
Todavia, sinto-me completamente perdido. Se me pedirem para detalhar exatamente o porquê de eu precisar salvá-las, já nem sei mais dizer. Meu corpo apenas passou a se mover e quando finalmente dou-me por mim estou realizando um massacre.
Disparos, disparos e disparos. A única coisa que vejo diante de mim é sangue jorrando para todo que lado e corpos caindo ao chão, e sigo nesta completa insanidade na vã esperança que desta vez as coisas deem certo. O que exatamente precisa dar certo, eu também não me lembro, só sei que preciso matá-los para isso.
Por outro lado, minha energia se esvaiu totalmente. Continuar matando desenfreadamente até ser desarmado e por fim morto, está me desgastando demais.
…
Já chega. Eu não aguento mais.
Assim que salto no tempo, eu caminho até a cozinha do refeitório.
— Alunos não podem entrar aqui! Ei, garoto, está me ouvindo?! — diz uma funcionária.
Ignoro todas as advertências por parte dos funcionários. Corro em direção às gavetas e pego uma faca bastante afiada.
— O que você está fazendo?! Solte essa faca, você pode se machucar com ela! Entregue a mim! — insiste um pouco assustada.
Encaro minha própria imagem no reflexo da faca, observo minhas olheiras e meus olhos totalmente sem vida. Não é como se esta faca estivesse me matando no final de contas, esta ação já é desprovida de qualquer significado, pois por dentro já estou morto há muito tempo.
Então com ela dou um fim a isto tudo. Ao menos um a fim a ESTE mundo.
Esfaqueio o meu pescoço, barriga e peito. Esfaqueio. Esfaqueio. Corto. Corto. Corto.
Morrer! Morrer! Morrer!
Eu quero morrer…
…
Uso da mesma abordagem por um período indefinido de tempo. Mas o caso está ficando mais grave. Meu corpo anseia por morrer instantaneamente quando venho ao mundo.
Como eu não consigo suportar a sensação de estar vivo até chegar à cozinha para só assim me esfaquear, a reação mais rápida que consigo pensar é simplesmente me jogar pela janela da sala de aula. Todavia, a altura deste andar não é o suficiente para morrer na hora.
Na sala de aula, recuo alguns passos, pego impulso e me jogo em direção à janela com os vidros fechados, de modo que caio no pátio coberto de cacos de vidro.
— Johann-kun, o que você está fazendo?! — grita Miyu — Socorro! Eu preciso de ajuda!
Olho para o lado e vejo um pedaço de vidro de dimensões adequadas. Minha mão se move automaticamente até ele, o pego e então apunhalo minha garganta.
Apunhalo.
Apunhalo.
Apunhalo.
1º Dia
10h27
Mensurar o tempo que passei em meio a tantas repetições se tornou uma tarefa bastante árdua e abstrata. Meu cérebro chegou a um ponto, no qual adotou o piloto automático na tarefa mais contra instintiva que eu poderia tomar.
Venho me suicidando sistematicamente com uma vã esperança de que seja a última vez. Para meu desfortuno, nunca é. E assim mais uma vez me vejo na sala de aula…
Ao que tudo indica, estou condenado a saltar para outra linha temporal indefinidamente.
Com a consciência tomada novamente, chego a uma última conclusão a respeito deste jogo: Não há solução, pelo menos não da forma que eu venho procedendo.
Ainda há uma coisa que eu não tentei, e com certeza é a mais difícil de todas.
Ficar alheio a este jogo, não utilizar as minhas memórias para interferir no resultado final, bem como encerrá-lo com meu suicídio. Desta forma, devo tornar-me um agente passivo, assim como fui nos outros mundos.
Posso estar sendo tratado temporalmente como um vírus, e minhas ações fazem o sistema inteiro rebobinar para o ponto em que comecei afetá-lo. Sim, é uma possibilidade de fato plausível, esta é a única diferença inicial desta realidade em relação às outras.
O único problema disto tudo é a segurança de Mikoto e Ailiss. Porque assim eu acabarei jogando nas mãos do destino qual das duas morrerá neste inferno. Se eu parar de agir, o confronto delas torna-se inevitável. Mesmo que por uma coincidência eu acabe morrendo durante o jogo, suas desavenças não estarão resolvidas… voltando então ao meu dilema da minha primeira tentativa.
Mas parando pra pensar, não é muito distante do que eu vinha fazendo até pouco tempo atrás. Se o tempo seguisse naturalmente o seu fluxo, após todos os meus suicídios, e com isso um novo conflito entre as duas surgir, o resultado é óbvio: Desta forma mais um jogo seria conjurado.
O que me leva a uma assombrosa questão: Eu posso dizer que venho ocasionando a morte delas há quanto tempo?
Por todo este tempo em que parei de contar, por todo este tempo em que matei de modo desenfreado e em que me suicidei sistematicamente, por todo este tempo em que não consolidei uma relação amistosa entre elas… tudo resultou claramente na morte de uma delas.
Já estava alheio a isto por um período maior do que eu poderia imaginar.
Mas por quê? Eu já consegui salvá-las inúmeras vezes, então por que o ciclo persiste a me atormentar?
Honestamente, o que este mundo espera de mim?
…
— O professor desapareceu também!
Mantenho-me friamente inexpressivo com o anúncio do jogo e o desaparecimento do professor. Do que adianta eu tentar qualquer coisa, se no fim das contas tudo irá se reiniciar?
Caminho até um local afastado do pátio enquanto Mikoto faz o seu famigerado discurso e me sento.
…
Cinco dias mais tarde o jogo se encerra. Mikoto é morta indiretamente por Ailiss.
Então este é um dos resultados quando eu me abstenho? É doloroso apenas de pensar sobre… não tenho condições de enxergar o seu corpo mais uma vez.
Não houve sequer tempo para eu lamentar a morte de uma de minhas amadas e já estou aqui de novo na sala de aula fitando para fora.
Eternidade é um conceito que é frequentemente vinculado ao divino e à perfeição. Todavia, não há nada além de sofrimento girando em torno desta sombria palavra.