Eu, (e) Eu Mesmo e um Mundo Diferente - Capítulo 5
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- Capítulo 5 - A Diferença entre os Dois
A tenda, apesar de grande pelo lado de fora, também era algo surreal do lado de dentro. O que era isso? Magia? Expansão espacial? Ariel continuava se perguntando para cada passo que dava.
Se fosse magia, isso explicaria aquele tamanho, a época e o padrão de fantasia medieval que os soldados apresentavam, porém, se fosse algo mais relacionado à ficção científica, talvez explicaria o baú e o tablet de antes. De qualquer forma, essa surpresa logo veio com uma pitada de medo.
Ariel estava sozinho em um acampamento militar. E se não fosse pelo soldado irritado de mais cedo – Henrix –, provavelmente teria uma morte horrível pelas garras daquele monstro.
Ariel tentava se acalmar para não mostrar aos outros seu nervosismo, só que, quanto mais entrava naquele lugar, mais olhos curiosos o encaravam.
Havia bem mais pessoas com o mesmo uniforme azul-negro e todos pareciam estar atarefados, anotando coisas em papéis e pergaminhos. Também controlavam pequenos maquinários feitos de um material metálico reluzente que lembrava Ariel telescópios científicos.
O que diabos está acontecendo aqui? Quem são essas pessoas e o que elas estão pesquisando neste lugar? Várias perguntas começaram a inundar a cabeça de Ariel.
Se não estivessem tão focados, quando estes o observavam, logo eram surpreendidos e com um súbito movimento, paravam de fazer quaisquer coisas para encará-lo por um tempo. Era necessário que o velho e aquela outra mulher os repreendessem para voltar ao trabalho.
Assim continuou até que chegaram em uma sala diferente. Essa sala possuía uma grande mesa oval e várias cadeiras, tal como uma sala de reunião.
Por causa da parada súbita, Arielle pressionou o garoto com seu corpo, quebrando aquela fila indiana. Ariel por outro lado, olhou para Juliet já que ela era a única que podia entendê-lo, e vice-versa.
— Sente-se no lugar que preferir — comentou Juliet. — A garota também.
— Certo… — Ariel colocou o baú de lado, próximo de uma estante de madeira. — Vou me sentar aqui — disse enquanto apontava para a cadeira mais próxima.
Ariel e Arielle sentaram-se um do lado do outro. Juliet, vendo isso, apenas concordou com um aceno e sentou a alguns bancos de distância, mas ainda próximo a eles. Tanto o velho quanto Cristine ficaram do lado oposto, frente a frente com eles.
E Henrix? Este ficou de pé apoiado em outra estante, do lado contrário de onde estavam e próximo da saída.
— Como já nos apresentamos. Gostaria que você começasse a responder minhas perguntas — afirmou Juliet. Enquanto dizia tais palavras, colocava na mesa um tipo de prancheta e com um tinteiro e uma pena, começou a escrever algo no papel.
Ariel acenava com a cabeça e dava a ela um sorriso genuinamente envergonhado.
— Certo. Primeiro: qual seu nome e o da garota — comentou Juliet.
— Hmmm… me chamo Ariel. — E olhou para Arielle antes de continuar: — ela se chama Arielle.
Juliet confirmava com a cabeça e começava a escrever.
— Vocês são irmãos?
Ariel pensou bastante durante o caminho se ele iria ser capaz de entendê-los de alguma forma, mesmo que levasse seu tempo, porém, no meio dos seus pensamentos, perguntava-se o que iria acontecer caso os outros descobrissem que ele e a garota compartilhavam o mesmo pensamento, ou melhor, seriam a mesma pessoa.
— Eh? — O que ele deveria responder? — Sim.
Ainda que aquela criança o entendesse, Ariel continuava dentro de um acampamento repleto de soldados misteriosos. Se eles descobrissem isso, o que aconteceria com ele? Mesmo nesse período de fantasia medieval, a tecnologia demonstrava um grande avanço, fazendo de todos aqueles estranhos pesquisadores e cientistas. Portanto, seria apenas um passo para colocarem seus corpos em alguma sala branca e começarem a fazer baterias de testes, era o que pensava.
— O que há com essa resposta? — perguntou Juliet, anotando no papel com aquela escrita estranha ao mesmo tempo que o encarava. — Tudo bem… próxima pergunta: Por que ela está com os olhos fechados?
Arielle não só estava de olhos fechados como também com o capuz cobrindo seu rosto. Sendo assim, era realmente algo estranho para tudo que estava acontecendo. Ariel a encarou por alguns segundos pensando: “O que devo dizer agora?”.
Ariel olhou para os lados, tanto para mesa quanto para as paredes. Também para o teto da tenda – que era incrivelmente alto – e suspirou antes de dar-lhe uma resposta:
— Sua visão é sensível à luz, por isso ela precisa ficar com os olhos fechados.
Juliet que estava escrevendo, tal como alguém passando tudo que se fala para o papel, ficou surpresa e olhou para Arielle e depois para Ariel, questionando se estava tudo certo. Depois disso, ela olhou para os candelabros que estavam na parede e aquele no centro da mesa e perguntou:
— Me desculpe. Precisamos diminuir a intensidade da luz?
— Oh, não se preocupe. Apenas luzes tão fortes quanto a do sol. — Tentou explicar suas palavras anteriores, acenando com as mãos.
— Então… ela não vai abrir os olhos?
— Sim… vamos, Arielle, não seja mal-educada com os outros. — Ariel tentava disfarçar sua situação ao mesmo tempo que ganhava tempo para seu próximo passo.
Durante seus testes, fez questão de conversar entre si e isso não parecia ser um problema, porém, ainda havia uma pausa considerável entre as respostas. Por isso, pensava se não seria estranho.
Ele queria que parecesse o mais natural possível.
Ariel decidiu o que iria fazer: abrir os olhos de Arielle ao mesmo tempo que fechava os do corpo masculino. A ideia seria tentar não parecer estranho, pelo menos não mais do que já estava sendo.
Ainda assim, foi isso que Ariel fez: Arielle levantou o rosto, retirou o capuz e abriu seus olhos. Revelou para os outros aquela mesma cor púrpura em seus olhos, tão intensa quanto a do próprio Ariel.
Juliet, Pann e Cristine seguraram o fôlego por um momento antes de fazerem seus próprios comentários:
— Uau, ela é linda — comentou Juliet.
— Sem dúvidas, uma mulher formidável — respondeu Pann.
Cristine parecia concordar com os outros dois, porém, colocava as mãos sobre a mesa e os encarava por um momento, logo se virava para o velho Pann:
— Agora, por que ela estaria nua junto ao garoto?
Arielle cobriu o rosto com o capuz e disse baixinho:
— Me desculpe, é que também estou com um pouco de medo.
— Ah, não se preocupe, não iremos te fazer mal. Só estamos querendo entender como as coisas chegaram a este ponto — respondeu Juliet.
Pelo fato de o corpo-feminino cobrir-se, agora seria capaz que o garoto voltasse a abrir os olhos de maneira mais direta como antes.
— Tudo bem… Ariel. — Juliet voltou sua atenção ao garoto. — Terceira pergunta: o que vocês estavam fazendo próximo a Floresta dos Lamentos?
— Floresta dos Lamentos? — perguntou Ariel surpreso. — O que é isso?
— Hã? O lugar onde vocês foram encontrados… certo? — ela virou-se para Henrix que estava do outro lado e aparentemente fez a mesma pergunta para ele, só que na sua própria língua — Não era na Floresta dos Lamentos que vocês os encontraram?
— Sim… estavam próximo a Floresta dos Lamentos, em uma casa abandonada no vilarejo Norte da Antiga Capital — respondeu Henrix.
Juliet colocava a pena próxima da sua bochecha e começava a rodar como se estivesse pensando em algo. Depois disso, ela anotou mais algumas coisas no papel e olhou novamente para Ariel.
— O lugar onde vocês estavam se chama Floresta dos Lamentos… não sabe como chegou até lá?
— Desculpe. Eu não sei. Quando eu acordei, já estava na floresta.
— Acordou? Por acaso estavas a dormir na floresta? — Juliet fazia um sinal como se não estivesse entendendo e logo virou-se para os outros aparentemente traduzindo para eles tais palavras.
Pann e Cristine começaram a discutir entre eles e Juliet voltou sua atenção a Ariel.
— Por mais que pareça estranho, eu apenas acordei e estava lá. Depois disso… caminhei até encontrar os restos de uma cidade abandonada.
— Essa cidade abandonada, nós a chamamos de Antiga Capital.
— Certo. Então… passei a noite em uma casa nessa Antiga Capital.
— Passou a noite? — perguntou Juliet surpresa.
— Sim… há algum problema?
Juliet terminou de escrever o que tinha acabado de discutir e entregou a prancheta para o velho e para a outra mulher.
Ela fez um sinal negativo antes de responder Ariel:
— Não que seja um problema, porém, é conhecido por todos que esta região está fora de qualquer limite humano. Viver ou, simplesmente passar a noite, está fora de cogitação.
— Me desculpe.
— Não precisa se desculpar.
O velho fez um sinal para que Juliet se aproximasse dele. Ele disse algo com ela que apenas concordava. Depois disso, tanto ele quanto a mulher se levantaram.
Juliet foi até Henrix e disse algo. Ele bufou como se estivesse inconformado e saiu da sala.
Quando a garota voltou a ficar próxima de Ariel e Arielle, o garoto a olhou com um ar tristonho. Juliet, vendo que eles provavelmente estariam assustados com o que aconteceria a partir de agora, tentou acalmá-los:
— Ah, não se preocupe com isso. Apenas estávamos discutindo o que fazer agora.
— E… o que decidiram? — Ariel estava trêmulo e com bastante medo.
Seria possível que eles o tratariam como cobaia agora que suas respostas não fossem satisfatórias?
Juliet parecia um pouco sem jeito, olhava de um lado para o outro por um momento até que depois de coçar o nariz, encarou Ariel e respondeu:
— Primeiro… vocês precisam urgentemente de um banho. Sério… me desculpe falar isso, mas vocês estão fedendo muito. Pediram para eu que arranjasse uma sala que vocês pudessem usar.
Ariel foi surpreendido pelo linguajar mais solto da garota.
Como os outros tinham saído da sala, ele não esperava essa mudança repentina de atitude. De qualquer forma, ele deu uma espiada por baixo dos braços e cafungou um pouco apenas para sentir o quão terrível era sua situação.
— Me desculpe por isso. — Pedia perdão outra vez.
— Tudo bem… não há o que fazer. Se estavam vivendo na Antiga Capital, não dá para esperar muito.
— E aquele outro soldado? Ele parecia bem infeliz.
— Oh… pelo que entendi, ele sequer gostaria de estar aqui. Não se preocupe com ele.
— Ela gostaria de agradecê-lo.
— Agradecer?
— Sim… ele salvou a vida da minha irmã antes de chegarmos aqui. Não sei como dizer isso… mas, uma criatura quase atacou ela, se não fosse por ele, não sei o que poderia ter acontecido.
— É? — Juliet sentou-se em uma cadeira ao lado e olhou Arielle que ainda estava cabisbaixa.
— Hmhm. — Ariel colocou as mãos na cabeça de Arielle, mesmo com o capuz, e a afagou como se quisesse diminuir um pouco sua vergonha. — Apesar de bem envergonhada, ela realmente queria agradecê-lo.
— Entendo. Tudo bem, depois que vocês se arrumarem adequadamente, por que não?
— Obrigado… Juliet.
Juliet sentiu um pouco de vergonha e olhou para o lado.
— O que foi?
— Nada não… Eu… vou adiantar a outra sala…. — Juliet se levantou e foi até a “porta” do lugar, e por um momento, pensou algo antes de olhar para Ariel. — Fiquem aqui. Até que tudo se resolva, os outros ainda podem vê-los como uma ameaça.
— Entendi.
A garota também saiu da sala.
Ariel e Arielle voltaram a ficar sozinhos em um ambiente único. No entanto, esse lugar era muito mais sereno e calmo, apesar dos sons e de pessoas vindo lá de fora. A porta era na verdade uma passagem fechada com duas cortinas grossas e para qualquer um que a atravessasse, precisaria empurrá-las para tal.
Essa sala era como uma sala de reuniões, havia alguns murais e outros quadros-negros. Seria algum tipo de sala para apresentações também? De qualquer forma, a mesa era de qualidade e até mesmo as cadeiras pareciam ser chiques tal como a de alguma casa nobre. Apesar de pequenas para Ariel e Arielle, ao menos poderiam se sentar.
Os cobertores estavam sendo úteis para não passar frio, mas, ainda assim, eram apenas longos tecidos sem costura ou alças, então, era difícil se movimentar com aquilo e os dois pareciam adolescentes se fantasiando de fantasmas, daquelas fantasias pobres.
Ariel suspirava.
“Não há ninguém aqui… eu deveria apenas tentar fugir? E se eu conseguisse fugir, o que aconteceria, eles iriam me caçar como um animal?” pensava Ariel.
Ele olhou para Arielle e removeu seu capuz. Como ela ainda estava com os olhos fechados, parecia estar dormindo mesmo que sentada.
— Será que vou conseguir manter ambos os olhos abertos algum dia? — perguntava enquanto colocava as mãos nos ombros da garota.
Ariel sabia que, seja lá o que fosse prosseguir agora, ele deveria aprender a controlar os dois corpos simultaneamente e de maneira eficiente.
Suspirou novamente e se levantou.
“Aparentemente levaram o tablet, apesar de terem deixado o baú” pensou Ariel enquanto caminhava em direção àquele objeto estranho.
Podia notar o quão grande era o objeto em relação às cadeiras e a mesa ao lado, mesmo que para ele não fosse tanto assim. Isso deixava claro a diferença entre seu tamanho e a dos outros humanos do lugar.
Ariel levantou a tampa do baú e olhou novamente para dentro.
“Ah, o mapa ainda está aqui?” pensou, colocando a mão no queixo. “Estranho, pois pelo que me lembro, eles tinham o levado consigo, certo? De qualquer forma…”
— Espero que Juliet seja alguém em que eu possa confiar… — disse baixinho.
Ariel fechou o baú e olhou para a sala mais uma vez e começou a caminhar por ela, analisando o lugar onde estava. Quanto tempo levaram para montar esse lugar? Mesmo parecendo um acampamento criado recentemente, o lugar não estava ridiculamente decorado? Questionou-se e depois pôs a observar Arielle.
Olhando Arielle daquele jeito, “desativada”, tentou movimentá-la ao mesmo tempo. Primeiro, fazendo-a se levantar e dar alguns passos para próximo dele.
Oh, como isso é realmente difícil! Não só a sensação de pisar no chão feito de pedras e cascalho como também a conjuntura de se movimentar simultaneamente.
Antes, Ariel não estava ativamente decidindo o que fazer. Mesmo que em um nível baixo de autonomia, os movimentos eram automáticos. Agora, no entanto, ele estava querendo fazer os dois corpos se movimentarem com plena consciência de suas ações.
Por causa dos seus pés descalços, pisando naquele cascalho, não só sentiam dor, também parecia usar muito mais força, tanto física quanto mental, para movimentar seus corpos. Isso fazia com que seus corpos tremerem como alguém que está no seu limite físico.
A dor era compartilhada, então tanto Ariel quanto Arielle expressavam e faziam as mesmas caras e bocas.
“Arielle, você consegue vir até aqui?” pensou Ariel. Sem respostas, obviamente, porém, não da maneira que ele esperava. O corpo feminino, de algum jeito, começou a caminhar até a ele e depois parou na sua frente.
— Que? Como isso foi possível? — surpreso pelo que aconteceu, olhou para o outro lado e apontou: — Vá para lá agora.
Nada… não aconteceu nada.
“Vá para aquela direção, agora” ordenou mentalmente.
O corpo então se movimentou de tal forma como ordenado. Ariel ficou sem entender, pois, até então, ele já tinha feito testes semelhantes assim. Só que agora parecem resultar em algum tipo de sucesso.
Essas ordens davam a ele uma sensação de alívio, porém, também de medo. Afinal, diferente de assumir o controle do corpo diretamente, quando isso aconteceu, era como se a ligação com o outro corpo desaparecesse momentaneamente ao mesmo tempo que a ordem era cumprida.
O que diabos seria isso? Lembrava vagamente aquele sonho-real quando a “Arielle” daquele lugar se movimentava livremente e o próprio Ariel, no seu corpo masculino, não tinha nenhum controle ou sensações para aqueles movimentos.
Isso era novidade para Ariel que, esquecendo por um momento em que lugar estava, começou a ordenar para o corpo feminino ações simples até aquelas um pouco mais complexas.
Primeiro seria andar de um lado para o outro, depois correr, virar-se, agachar e se levantar. Muitas coisas. Até teve um momento que Ariel, brincando, fez com que o corpo fizesse um aperto secreto de mãos.
“Tudo isso foi interessante, porém, enquanto ela estiver com os olhos fechados e sem expressão… mesmo que ela se movimente sozinha dessa forma, isso vai ser muito estranho”.
Ariel então a ordenou que abrisse os olhos: “Abra seus olhos e observe aquela parede, sorria e concorde com a cabeça”.
Então… Ariel aguardou a dor que possivelmente iria o abalar, porém, não havia dor alguma.
Ele pode ver a garota caminhando até a parede, retirando o capuz e abrindo seus olhos. Ela olhava para a parede e dava um sorriso sincero ao mesmo tempo que acenava positivamente com a cabeça.
Sem dor? Sem visão compartilhada?
Ela se transformou em um tipo de NPC – personagem não controlado pelo jogador –, piscando os olhos, respirando e ficando parada em posição de repouso. Ariel ficou sem entender por um momento até que as cortinas pesadas se abriram e ele voltou a sua atenção para a entrada. As duas atenções.
Naquele instante era como se seus corpos recebessem os mesmos estímulos e sensações e por causa disso, a visão compartilhada por dois ângulos diferentes veio como um soco direto em suas mentes, criando aquela velha conhecida dor de cabeça.
Ariel e Arielle se abaixaram ao mesmo tempo, cheio de dor.
“Mesmo que não seja tão forte quanto antes. Ver as coisas dessa maneira não… dá…” gritava mentalmente.
— Ariel! Arielle! — gritou Juliet, se aproximando dos dois. — Vocês estão bem?
— Oh… uma dor de cabeça tão… intensa… — disse os dois ao mesmo tempo.
— O que há? O que aconteceu? — perguntou Juliet sem saber o que fazer.
Ariel e Arielle fecharam os olhos.
Por um momento ficaram assim até que a dor finalmente cessou e Ariel levantou-se. Ele fez com que Arielle cobrisse a cabeça com o capuz e fosse até a cadeira mais próxima para sentar-se.
— Acalme-se Juliet… Às vezes temos essa dor de cabeça…
— E você me pede para me acalmar? — Juliet perguntava enquanto já se preparava para sair da sala. — Eu preciso chamar os…
— Não. Por favor, não precisa… já estamos bem.
— Você tem certeza?
— Sim… tenho.
— Tudo bem…, mas, o que houve? — Juliet parecia se recompor ao mesmo tempo que se aproximava da Arielle.
— Não sei explicar bem… é como se de repente algo atingisse… com força.
— E isso já aconteceu antes? — colocava a mão sobre a cabeça da Arielle com o capuz.
— Já — afirmou o garoto.
— Jà? Nossa… — Juliet olhou para Arielle e depois para Ariel, sem saber como reagir. — Então precisamos verificar se isso não é nada grave.
— Entendi… depois de nos arrumarmos, certo?
— Não… agora — disse Juliet apontando para a saída.
“Merda… ela não deveria chegar assim do nada… não antes de eu descobrir como controlar o segundo corpo… Arielle, retire o capuz, sorria para ela e diga que está tudo bem” pensou Ariel.
Juliet que estava olhando para os dois rapidamente pôs a encarar Arielle quando ela começou a agir. Arielle fez com que o garoto tivesse ordenado mentalmente, retirando outra vez o capuz e dando a ela um sorriso.
— Tudo bem… Juliet, estamos bem agora… — disse a garota.
— Já passamos por isso antes… só precisamos descansar um pouco… — completou o garoto.
— Vocês, tem certeza disso? — perguntou Juliet apreensiva.
Para aquela garota, seria muito imprudente deixar que os dois estranhos tivessem “dores de cabeça” logo quando estavam juntos e dentro daquele acampamento. De qualquer forma, mesmo com os vários pensamentos de vários tipos, Juliet apenas concordava.
— Sim, temos.
— Errr… a outra sala está pronta? — perguntou Arielle.
Parece que, quando Ariel ordena mentalmente as ações, além do corpo obedecer, também desliga seus sentidos e sensações, permitindo assim que tanto o corpo masculino quanto o corpo feminino façam coisas ao mesmo tempo.
— Sim… arranjamos duas salas e vocês poderão usá-las para se banhar. Assim…
— Duas salas? — perguntou Ariel.
— Hã?
— Uma já basta, não podemos tomar banhos juntos? — Perguntou Arielle.
— Quê? Pelos deuses… vocês tomam banhos juntos… com essa idade? — argumentou Juliet sem saber como reagir.
A garota era claramente nova, e nem só pelo fato de sua altura, e Ariel e Arielle tinham seus corpos formados como a de adolescentes. Ariel olhou para Arielle que estava observando Juliet.
“Mas que diabos… como isso seria normal? Quero dizer… agora ela vai nos achar totalmente estranhos… e de um jeito realmente problemático” pensou o garoto.
— Tudo bem… se tem algum problema com isso… podemos tomar banhos separados — disse Arielle.
— Olhe… eu… posso ver, quero dizer, usar uma sala a menos não seria um problema.
— Então, tudo certo? — disse Ariel e Arielle ao mesmo tempo.
Juliet ficou surpresa pela reação feliz dos dois que deu alguns passos para trás. Ela olhava-os sem tentar esboçar tanta reação, mas fazia um sinal positivo com a cabeça.
— Bem… — ela fez um sinal para que eles a seguisse — Vamos para a outra sala então.
Ordenar mentalmente para que a garota fizesse as ações ou até mesmo falar algo tinha uma desvantagem, pois, tudo era feito de maneira direta, sem considerar imprevistos. Além disso, havia o tempo perdido em que Ariel deveria entender a situação em que se encontrava e decidir o que fazer, logo, não eram reações diretas aos estímulos externos.
“Siga Juliet normalmente, ao meu lado e um pouco atrás” ordenou o garoto mentalmente.
A ordem era simples, certo? Mas o que aconteceria quando algo viesse atrapalhar? E foi isso que aconteceu em seguida:
Juliet saiu pela passagem, empurrando as cortinas, e Ariel e Arielle fizeram o mesmo. O corredor que tinham usado era relativamente largo e havia outras portas e passagens. Porém, diferente dos outros lugares daquela tenda, tinham bem menos pessoas e cientistas.
Tudo parecia estar normal e o corpo secundário, que naquele caso era da Arielle, estava seguindo as ordens conforme pedido pelo garoto. Caminhava um pouco atrás dele seguindo seus movimentos de maneira precisa e bem natural. Porém, quando Juliet e Ariel viraram a esquina de um corredor, os dois foram surpreendidos por Henrix que os estava aguardando.
Ao perceberem, se afastaram do soldado no último segundo, evitando trombar diretamente com ele.
— O que há contigo, Soldado? — disse Juliet enfurecida.
— O que há? Apenas de guarda, não estás vendo? — respondeu Henrix.
Antes que a conversa continuasse, Arielle veio e trombou com ele, já que ela também virou a esquina, mas sem atentar-se ao obstáculo humano chamado Henrix.
“Oh, merda!” pensou Ariel.
A garota trombou com Henrix e caiu sobre ele. O golpe fez com que, novamente, os corpos voltassem a compartilhar os sentidos.
Henrix não só foi surpreendido pelo empurrão quanto pelo corpo avantajado da garota caindo em cima.
Só teve tempo para assegurar que os seios da garota não pressionaram seu rosto.
— Mas que caralhos! — gritou Henrix.
Ariel logo fechou os olhos, virando-se para o lado e trocou a consciência com o corpo feminino.
— Me desculpe… me desculpe — disse se ajustando de maneira que estivesse sentada em cima do coitado. E vendo que o cobertor tinha sido aberto, revelando a parte de cima para ele, cobriu-se. — Você não se machucou, certo?
— Ela está perguntando se você não se machucou. — Traduziu Juliet seu comentário.
— Claro que não… só… diga para ela sair de cima de mim. — Henrix olhou para o outro lado, vermelho como um pimentão.
Juliet, que tinha visto a cena em camarote, também olhou para o outro lado. Ela tentou cobrir sua vergonha enquanto acenava para o vazio:
— Errr… se vocês estão bem. Rápido, se levantem!
Arielle se levantou e olhou para a parede, cobrindo seu corpo e ajustando o capuz novamente.
— Você também, quanto tempo vai ficar parado aí? — indagou Juliet.
Henrix levantou-se e ajustou seu uniforme, e depois tossiu como se ajustasse a voz:
— Estou aqui de guarda, mas não porque eu quero, ok?
Ele realmente vai fingir que nada aconteceu? Mesmo envergonhado, deseja manter a sua posição de guerreiro pelo que parece. Ariel pensou, mas, sentiu-se aliviado já que mesmo com essa confusão toda, a dor de cabeça não o atingiu uma segunda vez em tão pouco tempo.
— Você está bem, Arielle? — perguntou Juliet, se aproximando dela já que ainda estava virada para a parede.
— Estou bem… É só que fiquei tão envergonhada pelo que aconteceu… que estou sem jeito.
— Não se preocupe, não foi sua culpa o idiota ficar parado logo na virada da esquina — Juliet olhava de canto e estava, apesar de envergonhada, também furiosa com o soldado.
Ariel não é muito bom em se passar por uma garota, porém, como ele mesmo não precisa forçar a voz nem nada, qualquer coisa que ele dissesse, vindo daquele corpo, parece ser crível o suficiente.
— E você? Não vai dizer nada? — Juliet encarou Ariel.
Ariel tinha se fechado durante sua “troca”, mas, depois que a situação se acalmou, ele voltou para o corpo masculino.
— Foi um acidente, certo? Se ninguém se machucou, então, tudo bem. — Respondeu.
Juliet o olhou por um momento e vendo que ele tentava desviar o olhar, fez um ligeiro sinal negativo. Depois disso, foi até Henrix.
— Os dois vão usar a mesma sala.
— Entendi… — e levou-se um tempo para a ficha cair. — Quê? Vão tomar banho juntos?
— O que foi dessa ação exagerada? — perguntou furiosa.
— Tudo bem… não que eu me importe, pelo menos não preciso me preocupar com duas salas.
Depois que os ânimos se abaixaram, os quatro continuaram o percurso até o que parecia o fim do corredor. Ao lado, havia duas portas daquele mesmo estilo com cortinas grossas. Provavelmente eles iriam usá-los separados, mas, devido a conversa de antes, Juliet sinalizou para o da direita.
Henrix cruzou os braços e ficou de costas para a parede, encarando o corredor como um verdadeiro guarda. Pelo jeito, nem ele, com toda aquela sua arrogância ou raiva, conseguiria lidar com o que houve antes.
Ariel, Arielle e Juliet entraram na sala.
Essa era menor que a outra, de reuniões, no entanto, havia uma grande bacia de madeira. Ele ainda seria pequeno se considerasse o tamanho dos dois, porém, estava repleto de água. Ao lado dessa bacia, um balde menor, um banquinho simples e uma toalha. Tudo era… bem pequeno.
Juliet mostrava aos dois o que tinham preparado.
— Aqui há uma bacia com água limpa, um balde para usar e alguns produtos para limpeza… Vocês sabem o que é sabão? — perguntou…
— Sim, sabemos — respondeu Ariel.
Talvez a pergunta deveria ter um significado ambíguo, até porque se eles tinham sido encontrados no meio do nada e sem roupas, poderiam ser tratados como bárbaros ou selvagens, porém, ao questionar, Juliet não só parecia anotar mentalmente suas respostas, como retirava um pequeno bloco de notas para preenchê-las também fisicamente.
— Interessante. Sabem como usar esses objetos?
“Merda… agora, eu digo que sim, ou não?” pensou Ariel. “Melhor eu demonstrar que sou civilizado”.
— Sim… sabemos. Mas… — Ariel pensou um pouco antes de falar tais palavras, no entanto, ele queria que a garota fosse uma aliada e provavelmente estivesse ainda mais próxima deles. — Você poderia nos mostrar como usar esses produtos?
— O sabonete? Certo… Hmmm…
— O que foi? — Ariel perguntou.
Juliet pediu que Arielle a acompanhasse.
Ariel poderia ordenar que ela respondesse ou ouvisse de maneira “automática”, porém, não sabendo como isso terminaria, achou melhor assumir o controle completo do corpo da garota. Enquanto isso, fez o corpo masculino se ajoelhar próximo da bacia analisando “falsamente” os objetos.
Arielle acompanhou a garota para um lado mais afastado da sala.
— Me desculpe por dizer isso, Arielle, a verdade é que eu também gostaria de ver se não há nenhuma ferida ou algo com seu corpo… por isso pedi duas salas diferentes. Enquanto eu estivesse aqui, bem… meu avô estaria na outra, verificando seu irmão.
Então era isso? Arielle sorriu.
— Não se preocupe com isso, Juliet. Quero dizer… — ela olhou para Ariel enquanto estava fazendo aquele loop de ações. — Não quero trazer problemas para você. Eu realmente agradeço muito por vocês estarem nos dando… essa oportunidade. É que… eu me sinto mais segura e calma quando estou do lado do meu irmão…
“Esse papo… se não fosse por essas circunstâncias, certamente diria que esses irmãos têm algum tipo de problema na família…” pensou Ariel.
Juliet parecia chateada com o que tinha dito e fez um sinal negativo.
— Tudo bem… Me desculpe, eu não me importo… Não precisa se preocupar comigo.
— Hã?
— Se é tão importante para vocês tomarem banho juntos, não há o que fazer, né?
— Quê?
“Que tipo de conclusão foi essa? Não entendi como chegou a isso…” deu uma pausa e logo concluiu seu pensamento: “Na verdade, seria o normal depois do que eu disse sem querer”.
— Afinal, se vocês sobreviveram juntos até agora neste lugar tão inóspito, é claro que confiam um ao outro nesse nível… Me desculpe por isso. — Ela se inclinou com o pedido de desculpas.
— Ah, tudo bem… pode se levantar.
— Certo. — Ela olhou para Ariel e caminhou em sua direção. — Eu vou mostrar como vocês podem usar esses produtos.
Ariel era o NPC da vez.
“Levante-se e fique ao lado da bacia, olhando a situação de maneira calma e pensativa, como se estivesse entendendo tudo que ela diz” ordenou mentalmente.
Isso era tão… estranho. Mesmo que Arielle fosse sua “alma gêmea”, era o corpo masculino seu verdadeiro corpo, então quando ele agia de maneira independente, para Ariel – sua mente – as coisas não estavam certas e totalmente confusas.
“Eu mesmo… agindo como um NPC, quem diria” pensou Ariel.
Por mais conflitante era sua forma de pensar e agir, sua essência de jogador dava-lhe créditos às decisões, por outro, seu lado racional, começava a implodir por tanta irrealidade.
— Esse é o sabonete que vocês devem usar primeiro, ele vai remover as crostas de sujeira e lama de seus corpos. Esse você deve usar quando não tiver mais sujeira — apontava para outro. — Ele vai ajudar a hidratar suas peles. Não sei como vocês parecem tão bem, mas até eu vejo como elas estão ressecadas.
Ariel apenas concordava e Arielle olhava seus próprios braços e mãos. Não é como se conseguisse notar tantos detalhes assim quanto Juliet estava apresentando, porém, dava para notar a sujeira e a lama que tinha secado.
— E esse último? — perguntou Arielle, apontando para o terceiro frasco.
— Esse? — Juliet o segurou, mostrando para Arielle. — Sabe o que é um perfume? Você usa depois que terminar o banho, depois de secar-se.
— Certo… entendi.
Arielle olhou para Ariel e o ordenou: “Certo, agradeça e diga que entendeu e que já pode começar”.
— Obrigado Juliet. Então, já podemos começar. — disse o garoto, já removendo o cobertor e ficando totalmente exposto.
Juliet apenas concordava com a cabeça e virou-se para dar atenção a ele, porém, vendo a cena ela ficou sem palavras.
“Oh merda, o corpo entendeu que era para começar a banhar-se agora…” mesmo Arielle, vendo seu próprio corpo, esboçou uma vergonha genuína.
— Entendi que você entendeu, mas vai começar a tomar banho agora? Ao menos me espere sair — disse a garota cobrindo seu próprio rosto com as mãos.
Apesar de Juliet comentar aquilo… o garoto apenas sentou-se no banquinho e com o balde, jogou um pouco de água no próprio corpo. Depois disso, pegou o primeiro sabonete e começou a esfregar a parte que estava repleta de lama.
— Me desculpe por isso… — comentou Arielle. “E, o que há com o corpo? Ele sozinho decidiu se limpar? Quero dizer, mesmo que as ordens não tenham sido tão claras, provavelmente ele… completou o que faltava?” pensou.
— E-eu preciso me acostumar com isso, certo? — Juliet bufou, e olhou para Arielle antes de continuar: — Não precisa se desculpar… Arielle.
Arielle tentou dar um passo em direção ao corpo masculino quando momentaneamente perdeu as forças das pernas, tal como tinha acontecido com o garoto antes, na floresta. Ela quase caiu em cima de Juliet, mas conseguiu se recompor.
— O que foi? Aquela dor de antes voltou? — perguntou Juliet tentando ajudá-la.
— Não… é…
Ela olhou seus pés, um pouco de sangue?
— Seus pés… ah, você pisou em uma pedra afiada — gritou Juliet.
— Acho que sim.
Incrível como o corpo masculino simplesmente ignorou tudo que estava acontecendo e continuou seu banho.
Arielle sentou-se e olhou nos seus próprios pés. Era realmente uma lasca de pedra, tinha cortado até de certa forma grave.
— Isso foi agora? Rápido… deixe-me ver. — Juliet esperou a garota sentar-se, depois disso observou seus pés. — Graça aos deuses, não é nada muito grave, mesmo assim, deixe-me cuidar disso antes que piore… creio que tinha algum tipo de bandagens em algum lugar…
— Espere Juliet, não parece ter sido tão grave… eu acho.
— O problema não é esse… você está toda suja, imagine se pegar algum tipo de infecção. Fique aqui… — ela se levantou e passou por Ariel que continuava tomando seu banho. — E você… está ferido também?
“Oh, merda…” Ariel voltou ao seu corpo original.
— Não… talvez só alguns arranhões… — apesar de dizer aquilo, era óbvio que seu corpo estava ferido. O sabonete tinha algum tipo de reação ao contato com a pele e agora, podia sentir todo ele ardido como se colocasse álcool direto na ferida. — Mas… esses sabonetes, deveriam arder tanto?
— Arder? — Juliet parecia um pouco preocupada com a situação, no entanto, sem hesitar, foi até o garoto, segurando seu braço e removendo um pouco da espuma. — Vocês… estavam lutando e enfrentando algo?
— Não… acho que não.
— Esse sabonete, ele é feito para remover qualquer tipo de organismo maligno… e… ele arde um pouco se tiver contato com feridas externas… Me desculpe por isso. — Ela fez um sinal de desculpas. — Acabei me esquecendo disso… meu… avô iria te avisar antes, já que ele iria analisar o estado do seu corpo.
— Entendi… bem, não é como se eu fosse morrer por isso. Então… já que está aqui, vai fazê-lo? — Ariel pensou por um momento, ele não estava mais no corpo feminino. — Ah, quero dizer, vai checar a Arielle, né?
Ela fez um sinal positivo, mas, não negou ou afirmou sua dúvida anterior, apenas saiu da sala.
Henrix aparentemente colocou a cabeça para dentro verificando se alguma coisa tinha dado errado, porém, vendo o garoto tomar seu banho e a garota sentada, quase de pernas abertas, logo voltou para trás.
Provavelmente ele não queria saber o que tinha acontecido ou o que estava acontecendo lá dentro e achou melhor apenas recuar.
Ariel olhou para Arielle.
— Está com dor? — perguntou para ela.
Sem respostas.
“Responda se estiver com dor” pensou.
— Estou com um pouco de dor…, mas, não é como se eu fosse morrer por isso — respondeu a garota.
— O que… foi isso?
Sem respostas.
“Ela me deu uma resposta autônoma, certo? Eu não ouvi errado… foi porque eu ordenei?” pensou Ariel. A situação era tão estranha que agora, seria impossível determinar quem era o dono daquela resposta. Foi o corpo de maneira automática, foi a Arielle do sonho ou foi seu eu do subconsciente que tinha dado aquela resposta?
Mesmo com aquela confusão, aparentemente a dor no seu pé começou a ser compartilhada com seu próprio pé e a ardência do sabão em seu corpo, compartilhou com a garota, os dois eram… bem únicos, não?
Ariel pegou o balde e o encheu na bacia, jogando-o contra seu corpo e removendo um pouco daquela espuma.
A água está tão fria…, mas ele precisa aguentar. Eu preciso aguentar, pensou várias vezes enquanto seu corpo estava tremendo.
Novamente a cortina se abriu, porém, não era nem Henrix nem Juliet. Quem entrava nela era o velho Pann. Ele caminhou até se aproximar do garoto e sem dizer nenhuma palavra, começou a observá-lo.
Pelo que Juliet tinha dito, ele estaria a analisar seu corpo e deve ter sido por isso que veio para essa sala. Também se inclinou um pouco de lado para que pudesse ver a garota. Ariel, vendo a situação dela, fez com que ela se sentasse de uma maneira mais confortável e “segura”.
— Como estavam demorando, pensei que tinham fugido…, porém, estão aqui, tomando banhos juntos? — perguntou o velho, mas, sem saber o que ele estava dizendo, Ariel apenas olhou de lado.
O velho fez um sinal para que ele abrisse os braços e ele o fez.
Vai verificá-lo ali mesmo? Agora?
Pann era um senhor já na casa dos seus sessenta ou mais anos, porém, por estar usando aquelas roupas bem chamativas, era tão estranho quanto ser observado pela Juliet. Mesmo que o garoto fosse bem mais alto que ele, na verdade, tanto sua mentalidade quanto seu corpo ainda poderia ser comparado a um adolescente.
O velho sem nenhum tipo de ritual ou aviso, encostou no seu abdômen que, apesar da surpresa, o que lhe atingiu foi a ardência rápida por ter tocado diretamente numa ferida. Ariel, por outro lado, tentou não demonstrar aquilo.
— Seu corpo é bem rígido e forte, apesar de magro. É alto, mas não como o gigantismo comum. Está todo ferido, mas não parece ser ferimentos de um combate… — dizia Pann enquanto o analisava com cuidado. — Todo seu corpo parece estar saudável apesar das cicatrizes e arranhões. Até mesmo seu membro reprodutor está em perfeitas condições…
Juliet entrou na sala.
— Certo, Arielle, você… — Juliet se surpreendeu pela cena. — Vovô! O que está fazendo?
— O que acha? Não posso perder tempo, ainda que eles sejam de fato uma descoberta interessante, ainda há muito mais para analisarmos enquanto estivermos aqui. Por que não me avisou que ele estaria aqui?
— Eu já iria avisar… quando… — ela estava olhando de lado, pois o garoto estava em pé, ao lado do seu avô. E ela podia ver tudo que era possível.
— De qualquer forma, vamos agilizar. Já verificou a garota?
— Não, ainda não.
— E o que há com essas bandagens, eles estão feridos?
— Ela… pisou em alguma pedra afiada e se cortou.
— Interessante. — Retrucou o velho, então foi até Arielle.
Ariel levou sua consciência para a garota.
Ela levantou seus pés para que o velho pudesse ver ao mesmo tempo que tentava cobrir suas partes íntimas. O quão estranho era isso… se o velho, sem nenhum pudor o analisou daquela forma, ele estava inquieto com o tratamento que daria para a garota.
— Juliet… será que você poderia me analisar? Eu… acho que isso não é certo. — disse Arielle, olhando para o lado.
— Vovô! Deixa que eu… eu faço isso, ok?
O velho Pann apenas parou e recuou, depois disso, se levantou e suspirou. Olhou novamente para o Ariel e depois para sua neta. Fez um sinal positivo e falou:
— Certo, Juliet, eu deixarei os dois aos seus cuidados. Eu preciso de um relatório completo. Veja se não possuem feridas tal como esse corte. Trate-os se necessário. O garoto parece estar saudável, mas, sem uma análise mais detalhada, não dá para tirar conclusões. Seu corpo está com leves ferimentos e arranhões, porém, não parece ter sido causado por um combate.
— Entendi. Anotado.
— Além disso, tenha cuidado para não ser infectada — apontou para o sangue da Arielle no chão. — Não dá para dizer se são iguais a nós.
— Certo.
— Por último, que remova esse odor deles por completo. É muito desagradável ficar na sala com eles desse jeito. Você consegue fazer isso, certo? Não quero ter que perder meu tempo ou pedir que a Cristine fique de babá.
O velho apenas arrumou suas vestes e saiu. Juliet apenas confirmava com a cabeça e quando ele saiu ela cerrou os punhos.
Mesmo que Ariel não entendesse uma palavra sequer, ele podia ver como Juliet tinha ficado depois daquele sermão.
— Espero não ter te trazido problemas — disse o garoto.
— Não… tudo bem… — ela suspirou, colocando a bandagem e o kit de primeiros socorros de lado — É só que…
Ela meio que traduziu boa parte da conversa para eles e Ariel concordava.
— De qualquer forma, ser tratada como uma criança por todos… é bem horrível.
E pensar que ela está se abrindo para dois estranhos dessa forma… realmente o peso que ela está carregando deve estar deixando-a bem nervosa.
— Posso perguntar… sua idade? — perguntou Arielle.
Ariel iria fazê-lo na forma de garoto, mas, isso seria bem estranho, não?
— Eu tenho dezoito anos…
— Quê? Dezoito?
— O que há com essa resposta? Você também vai ficar me…
— Não… é só que… eu tenho… dezesseis.
— Você está brincando com minha cara?
— Não… é a verdade… nós dois temos dezesseis…
Juliet olhava para Arielle e para Ariel – que tinha voltado a tomar seu banho – e depois novamente para Arielle. Ela olhava para seu corpo e depois para o dela. Por um momento Arielle percebeu que aquilo era bem constrangedor.
— Você está dizendo que… vocês são mais novos que eu?
— Também estou surpreso…
— Tudo bem, pode rir também se quiser… todos me chamam de criança, que diferença faz se até mesmo dois estranhos encontrados na Antiga Capital começarem a me chamar de criança?
— Tudo bem, o assunto morre aqui.
Juliet começou a rir e depois olhou para Arielle.
— Não… eu que preciso me desculpar. — Ela foi até o kit e as bandagens. — Se eu agir dessa forma, eles não vão mudar a forma de pensar, certo? Não posso deixar que eles se baseiam apenas na minha aparência. Deixe-me ver seu pé, por favor.
Arielle se ajustava no chão…
— Espere… — Juliet se levantou e foi até a porta. — Henrix…
Henrix colocou o rosto para dentro e a observou.
— O que foi? — questionou como se algo de grave tivesse acontecido.
— Você pode trazer o banco que está na outra sala?
— Por que você não faz isso?
— Argh, perca de tempo pedir isso para você, né.
Henrix olhando para dentro, viu a garota sentando-se diretamente no chão e, por algum motivo, apenas fez com que Juliet continuasse dentro da sala.
— Certo, eu pego… não estou fazendo nada aqui fora mesmo.
Juliet, surpresa pela súbita mudança de reação, deu alguns passos e voltou a entrar.
Logo mais Henrix apareceu com o banco e as toalhas da outra sala.
— Aqui está, criança.
— Me chamo Juliet! — disse brava.
— Entendi, entendi… pode continuar a fazer… seja lá o que estivesse fazendo antes.
Henrix colocou as coisas de lado e logo virou-se, para sair. Apressadamente saiu e apenas ignorou o garoto enquanto estava se lavando.
É muito útil dar essas ordens para os corpos e eles, aparentemente, saberem como resolver. Até mesmo ordens sem muitos detalhes como “continue seu banho” parecem dar certo. Juliet pegou o banco e entregou para a garota.
— Obrigada?
— Tudo bem… deixe-me ver.
Juliet, apesar de pequena como uma criança, demonstrou grandes habilidades naqueles primeiros socorros, não só desinfetando a ferida como amarrando a bandagem.
— Ainda que vamos lavá-lo depois, obrigado por isso — comentou Arielle.
— Eh, né? — disse Juliet, sem jeito. — De qualquer forma, meu avô pediu que vocês deixem de cheirar tão… ruim, então, vou ter certeza de que vocês sairão daqui cheirando a flores.
— Agradeço. Então, primeiro temos que ver a situação do meu irmão?
— Tudo bem… eu vou ajudá-lo. Vocês são mais novos que eu, então eu tenho que ajudá-los.
O que há com essa atitude, agora? Ariel apenas ignorou e aguardou seus próximos passos.
— Já que Henrix trouxe os outros itens juntos com o banco, vocês podem se banhar juntos. Ainda há água suficiente? — ela olhou para a bacia e comprovando, continuou: — Pode… tirar isso?
— Ah? Sim? — Arielle estava um pouco aflita. Mesmo que Juliet tivesse aparência de criança, era uma garota, e ele, bem, não.
Parando para pensar, os dois, o garoto e a garota estavam naquele quarto… Isso… está tudo bem nisso, né? Pensou várias vezes até que, decidido a continuar, fez com que Arielle removesse não só aquele cobertor como também a capuz de antes.
Juliet respirou profundamente e começou a analisá-la, tanto quanto o velho fez com o garoto.
— Você tem um corpo bem saudável… — ela dizia isso, olhando para Ariel e achando que ele iria ficar espionando, dava leves encaradas para ter certeza disso. — Ainda fico um pouco…
— Não se preocupe com isso… ele não é desse tipo.
— Hã? O que você quer dizer com isso?
— Eu… ele não nos faria mal, então você não precisa ficar tão tensa assim…
— Entendo, me desculpe. — Ela fez um sinal e olhou para Arielle de cima para baixo — você pode se levantar? Não vai doer seus pés?
— Posso sim… e não se preocupe, eu ainda consigo ficar de pé.
Arielle ficou de pé e Juliet caminhou em uma volta completa.
— Vou tocar seu corpo, ok?
— Tudo bem.
A sensação de algum terceiro tocando seu corpo, daquela forma, veio como um misto de desconforto e uma estranha reação cômica, era como se estivesse sentindo cócegas repentinas e por isso Arielle e Ariel soltaram um leve sorriso.
— Está bem?
— Sim, pode continuar.
— Sua pele é mais suave do que eu pensava, apesar de estar tão suja… Ok, não parece ter problemas graves, apenas alguns arranhões. Sabe dizer o que aconteceu?
— Enquanto estávamos saindo da floresta, começou a chover… na verdade, caiu uma tempestade repentinamente, e por isso decidimos procurar abrigo. Enquanto corríamos, caímos numa ribanceira.
— Oh, assim eu vejo, ainda bem que nada mais grave aconteceu.
— Sim… Eu… ele me protegeu por isso ficou mais ferido.
Juliet olhou para o garoto e fez um sinal positivo.
— Certo. — Ela se aproximou do Ariel. — Também preciso ver seu corpo, tudo bem?
“Mas o velho já não o viu? Que diabos… respire, Ariel, se acalme. Arielle, comece a se banhar, tal como eu fiz, certo?” pensou e ordenou Ariel.
— Tudo bem, se não for problema para você — disse o garoto.
Ele se levantou e com o balde, removeu a espuma restante do seu corpo. Depois disso, tentou cobrir seu “garoto”.
Juliet ficou um tempo com a situação até que ela parecia normalizada.
— Só estou verificando se não há feridas no seu corpo, ok?
— Certo, eu entendi.
Juliet não estava conseguindo esconder sua vergonha, até porque, não só Ariel era um garoto – em toda sua essência – como seu corpo era muito maior que qualquer outro garoto ou homem daquele lugar.
Ela pediu para que ele levantasse o braço e afastasse as pernas e fez questão de analisar com cuidado todas as áreas. Era meio difícil fazer isso com uma mão tendo que defender sua moral, porém, fez o que pode.
— Me desculpe perguntar, mas há necessidade de investigar com tantos detalhes assim? — perguntou Ariel.
— Sim… primeiro para sabermos se não há ferimentos graves ou algum tipo de doença ou contágio preso aos seus corpos. Depois, para ter certeza de que vocês são humanos e estão bem.
— Entendo… — Ariel pensou um pouco e depois que compreendeu a situação, continuou: — Espere… contágio?
— Sim… Ok, pode relaxar agora. Boa parte da sujeira foi removida, mas ainda há algumas partes para limpar. Sente-se.
— Vai lavar minhas costas?
— Olhe… eu… preciso completar isso, certo? — disse Juliet fazendo Ariel sentar-se, logo pegou uma das toalhas limpas e colocou sabão nela. — Por favor, não deixe a situação ainda mais estranha.
— Até entendo, mas minha irmã pode me ajudar com isso.
— Assim será mais rápido.
— Certo. Se você diz.
Ariel sentou-se e ficou a observar a bacia e depois olhou de lado para Arielle. Pelo jeito, ela estava repetindo os mesmos passos que ele, banhando-se na ordem e nos métodos ensinados. O sabonete também reagiu com seu corpo, porém, menos intensamente.
— Ai… — disse Arielle.
— O que foi? — perguntou Ariel e Juliet.
— Arde, né?
— Ah, sim… como vocês estão com alguns arranhões, vai arder…, porém, não se preocupe. Ainda poderá usá-lo.
“Mas, que diabos? Arielle puxou assunto, ou melhor, disse aquilo sozinha… Esse método automático é… assustador” pensou Ariel.
— Sobre antes… Juliet, o que seria esse contágio?
— Certo… vou explicar brevemente. — Tocou levemente no ombro dele apontando para o balde. Ele encheu de água e entregou para ela antes de continuar: — Primeiro, por que estamos aqui…
— Espere… tudo bem contar isso para nós?
— De qualquer forma, se vocês sequer sabem como pararam na floresta, se conseguirem entender um pouco da situação, poderiam nos ajudar com as informações que vocês tiverem.
— Certo, pode continuar.
Juliet colocou a toalha no balde e depois começou a esfregar as costas do garoto. Depois disso, ela iniciou seu discurso:
“Estamos em um período perturbado. Nosso reino, o reino de Stelliza, está sofrendo pelas pragas e desastres naturais. Pesquisadores de várias partes do reino concordaram que o problema está vindo do Norte e por isso a família real de Stelliza, decidindo renovar suas forças e influência, convocaram essa excursão para investigar e impedir os avanços do Contágio. Também chamado de A Praga, foi um surto de doenças e criaturas infectadas chamadas de Monstros. Você disse que aquele soldado salvou sua irmã de uma criatura, certo? Provavelmente essa criatura era um monstro criado pelo contágio. Além de Monstros, também o chamamos de Corruptos…”
Se fosse qualquer outra pessoa, provavelmente impediria Juliet de continuar por causa do excesso de informação jogada na “cara”, porém, para Ariel – e Arielle – aquilo eram informações úteis para ele entrar no “jogo”. Ainda que isso não fosse um jogo, nem tivesse nada que o lembrasse de tal, Ariel usava de seu entusiasmo como uma forma segura de pensar e organizar suas ideias e próximos passos.
Ele apenas concordava e permitia que a garota continuasse.
“Apesar de raro, Corruptos também podem infectar humanos. Se todos estavam te encarando mais cedo, provavelmente era por causa das suas alturas. Humanos corruptos costumam ter seus membros alongados de uma maneira assustadora e horrível. Apesar de terem traços humanos, já não poderíamos chamá-los assim. Só que… vocês… não parecem estar infectados mesmo sendo tão grandes”
— Eu vi que há duas bandeiras lá fora… a dos soldados e a do seu grupo, Juliet. São de outro país? — perguntou Ariel.
Juliet ficou surpresa pela sua pergunta, mas, continuou:
“Não é como se fosse outro país, no entanto, nossa casa, Raios de Rapina, é uma organização independente do reino de Stelliza, por isso temos nossa própria bandeira. Apesar de estarmos localizados dentro do território, temos certa autonomia. Além disso, por sermos uma casa especializada em pesquisa de artefatos mágicos e pioneiros em várias áreas de pesquisa, possuímos nossa própria missão aqui. Interessante, vocês não são bárbaros nem selvagens, certo? Desde que percebi, vocês agiram tão naturalmente… na medida do possível”
— Eu disse que acordamos na floresta, certo? Mas, não vivíamos na floresta… Pode-se dizer que vivíamos em um lugar bem longe daqui.
— Hmmm… ouvi que além do Norte, da região chamada Centro do Abismo, há o que seria uma passagem para outros mundos e reinos… sabe alguma coisa sobre isso?
— Não, me desculpe.
— Certo… Não parece que você está mentindo — ela colocou a toalha dentro do balde e o entregou. — Aqui, suas costas estão limpas… você pode continuar daqui, certo?
— Sim. Obrigado, Juliet.
— Quando terminar me avise. Eu… preciso ter certeza de que tudo está pronto.
Juliet se afastou e foi até Arielle.
Ariel passou sua consciência para a garota.
— Agora é minha vez? — perguntou Arielle.
“Isso é tão errado… me dá uma dor no peito ter que enganá-la assim, mas, enquanto não souber o que está acontecendo aqui, de fato, não posso me revelar” pensou Arielle.
— Sim… vou te ajudar.
Arielle tinha se lavado no modo automático, portanto, a sensação de tocar seu próprio corpo ou lavá-lo como a do garoto não tinha acontecido, no entanto, olhando de cima para baixo, seu busto cheio de espuma – e todas outras partes – Ariel tentou não pensar muito no assunto.
Ela se levantou, foi até o balde e começou a se enxugar, removendo partes da espuma.
— Arielle, você precisa ter mais cuidado…
— Hã? — perguntou surpresa.
— Como posso dizer isso… — ela olhou para Ariel que tinha voltado a agir como NPC e novamente para Arielle. — Aqui… e aqui… não pode esquecer de lavar essas partes também…
Como Ariel tinha pensado, ele não estava acostumado com isso. Para um garoto normalmente se lava apenas algumas áreas específicas e olhe lá. Para as garotas, há muito mais superfície e cantos para se lavar. Ele, na forma de garota, apenas virou de lado um tanto envergonhada e concordou com a cabeça.
— Não se preocupe… também se considerarmos seus tamanhos, seria difícil lavar essas áreas com essas toalhas e objetos. Aqui, me dá sua toalha e sente-se.
— Certo.
Arielle sentou-se e levantou os braços e arrumou os cabelos para que não atrapalhasse Juliet.
— Como você consegue… segurar essa coisa? — disse, empurrando seus seios para cima para limpar entre as dobras da pele.
Arielle não respondeu, até porque, ele também tinha se perguntado isso ao se passar pela garota pela primeira vez.
Tudo parecia ir bem até que… um sinal de alarme tocou. Sinos e sirenes ecoaram pelos corredores e pelas paredes grossas de couro da tenda de onde estavam. O que tinha acontecido agora? E justo agora? O banho, a explicação ou até mesmo aquela interação teria que ser parado urgentemente.
Henrix empurrou a cortina com extrema força já com as espadas em mãos.
— Acabou o banho! Se preparem, vamos ter que abandonar o acampamento!
— Que? Por quê? — indagou Juliet.
— Eu já disse, porra! Se prepare para correr, vou abrir uma passagem pela tenda. Estamos sendo atacados por inúmeros corruptos.
Sem saber o que fazer, Ariel só podia imaginar que o pior tinha acontecido. Uma “invasão” ou “emboscada”, pensava.
— Juliet! — gritou Ariel.
— O que foi?
— Dentro daquele baú, há um mapa… e precisamos daquele objeto que seu avô levou consigo.
— Objeto… aquele objeto estranho?
— Sim…
Henrix já tinha corrido para a parede e começou a usar sua espada para abrir uma passagem.
— Espere, Henrix, Ariel disse que precisa daqueles objetos.
— Agora? Merda… — Deu mais dois golpes e cortou parte da tenda. — Ok, eu vou buscá-lo…
— Eu preciso ir também… — disse Ariel.
— Espere — gritou Juliet.
— O que foi dessa vez?
— O baú, ele precisa trazê-lo, certo?
— Porra! Sim… — Correu em direção a porta e virou-se para as garotas. — Você e a garota fiquem aqui… — Depois disso, olhou para Ariel que corria para próximo dele. — Vamos…
Os dois saíram correndo. E para piorar, Ariel ainda estava nu.
Aqueles objetos eram muito únicos para deixar para trás, e sem entenderem seus significados e para que servem, Ariel sabia que não podia abandoná-los.