Isekai Corrupt - Capítulo 52
Eu me aproximei de Leny, ainda atento ao que ele dizia sobre o antigo capitão Rogers. A maneira como ele se referia ao homem transparecia esperança, como se ainda acreditasse que Rogers estivesse vivo, apesar de tudo.
— Eu me lembro de Bell. Era um bom homem — murmurei, observando a reação de Leny.
— Ele era, sim… — respondeu ele, a voz tingida de saudade. — Mas, depois de perder a família, simplesmente largou o posto e foi embora da cidade.
Assenti, compreendendo o peso daquela perda. Por um momento, pensei em encerrar o assunto ali, mas algo em mim queria testar o alcance da confiança de Leny em mim e em meus métodos.
— Antes de começarmos, Capitão, gostaria de pedir permissão para usar uma de minhas habilidades aqui na sala.
Leny me lançou um olhar surpreso, claramente confuso.
— Uma habilidade? Mas… para quê? — perguntou ele, o tom levemente defensivo.
Mantive meu semblante firme, sem oferecer mais detalhes.
— Não posso falar sobre isso. Se não tiver permissão, temo que terei de me retirar.
Eu sabia que Aria e Viely me observavam com um misto de curiosidade e expectativa, provavelmente tentando entender o que eu planejava. Esse blefe era uma encenação, uma forma de deixar claro que eu estava no controle, mesmo que, no fundo, fosse um jogo de palavras.
Leny hesitou, mas, depois de um instante, suspirou e assentiu.
— Está bem, contanto que você prometa não ferir ninguém…
Dei um leve aceno.
— Certo.
A sala estava isolada, apenas nós e o capitão temporário ali dentro. Posicionei-me no centro do cômodo e, de forma quase imperceptível, toquei o chão. Não precisei dizer nada; com um mero pensamento, minha habilidade se ativou.
— 「Gate」.
A essa altura, invocar habilidades sem palavras era natural para mim. Depois de tanta prática, já não precisava das palavras-chave como antes, quando eram uma espécie de “rodinhas” para guiar o fluxo de mana. Agora, a habilidade fluía com naturalidade, quase como respirar. Com o tempo, sabia que nem mesmo precisaria pensar nas palavras; bastaria a intenção.
— Pronto.
— Já ativou sua habilidade? — Leny parecia genuinamente surpreso. — Mas… você nem disse o nome. Murmurou baixinho?
— Baixinho? — sorri de leve. — Não. Apenas a ativei mentalmente. É algo que vem com a prática.
— Nunca ouvi falar de alguém que pudesse fazer isso… — ele murmurou, impressionado.
— Não é fácil, mas também não é impossível — repliquei, para logo em seguida indicar as poltronas. — Agora que os preparativos estão prontos, podemos iniciar a reunião.
— Ah, claro! Por favor, sente-se — ele disse, apontando as cadeiras.
Agradeci com um leve aceno e me sentei, sentindo o peso do ambiente. Minha habilidade「Gate」estava posicionada, mas ainda inativa.
Agora, quatro portais estavam prontos, cada um deles ligado a um ponto estratégico. Desativei os portais antigos, reposicionando-os, e estabeleci uma conexão até o acampamento de lobos do lado de fora. Se algo saísse do controle, teríamos uma rota de fuga rápida e segura.
Md, por sua vez, permanecia do lado de fora. Como seu corpo de madeira não era o verdadeiro, mesmo que fosse destruído, ela não morreria; seria, no máximo, uma isca – ou uma sentinela. Ela podia se comunicar comigo mentalmente, permitindo que eu soubesse imediatamente de qualquer ameaça iminente.
— Como o senhor sabe, os lobos da floresta formaram uma aliança com todos os animais — iniciei, observando o semblante do homem à minha frente, estudando suas reações. — Foi essa união que permitiu a vocês derrotarem a cobra maligna. Está acompanhando?
— Sim, tudo o que aconteceu até aqui — respondeu ele, pensativo.
— Ótimo. Agora, os animais da floresta desejam paz. Com isso em mente, chegaram a um consenso: querem construir uma cidade para as feras mágicas.
— Uma… cidade?! — Ele parecia surpreso, e vi o reflexo de sua incredulidade nos olhares de Aria e Viely ao meu lado.
Assenti, ponderando minhas palavras. Era vital que ele compreendesse a gravidade do pedido.
— Uma cidade que servirá de refúgio e moradia, para que as feras que desejam viver em paz possam coexistir com as outras raças. Compreende onde quero chegar? Vocês foram ajudados pelas criaturas da floresta; agora, peço que colaborem para que possamos fortalecer essa aliança.
— Colaborar… exatamente com o quê? — O capitão ergueu uma sobrancelha.
— Publicidade — respondi com firmeza. — Quando perguntarem sobre a vitória contra a cobra maligna, quero que digam que uniram forças com os animais da floresta, que lutaram lado a lado para proteger esta cidade. Assim, fortalecemos a moral das feras e tornamos a convivência possível.
Ele assentiu lentamente, começando a entender o plano.
— Faz sentido. Isso pode facilitar a coexistência das raças… permitir que eles sejam vistos como aliados dos humanos.
— Exato — falei, satisfeito com a resposta. — Para que possam viver bem, é necessário um líder, alguém que os represente.
Ele lançou um olhar atento a Aria, que mantinha-se firme ao meu lado.
— Não seria essa loba? — questionou. — Ela disse que era a segunda no comando.
Aria sorriu levemente antes de responder:
— Sim, eu era a segunda no comando. Mas, a partir de agora, serei apenas o braço direito do verdadeiro líder.
Surpreso, o capitão me lançou um olhar questionador, e eu lhe respondi calmamente:
— Seu nome é Solus, o próximo líder dos lobos.
A surpresa foi maior do que o esperado. Até mesmo Viely, irmã de Aria, parecia perplexa com essa revelação. Aproveitei a brecha e continuei:
— O fato é que, apesar de eu comandar essas feras, todas elas lutaram e arriscaram suas vidas para salvar os habitantes daqui. Tudo o que pedimos é apoio, nada mais.
Aria ergueu a cabeça e completou:
— Fizemos um acordo com o Mestre Zero. Ele nos comandou em busca da relíquia que estava dentro da cobra maligna, e, em troca, obtivemos a vitória contra a cobra maligna. Agora, contamos com a ajuda de vocês.
O capitão ponderou por um momento, até que finalmente assentiu.
— Muito bem. Farei o que estiver ao meu alcance para ajudar.
Agradeci com um aceno, satisfeito.
— No entanto — ele prosseguiu, cauteloso —, o lorde da cidade central é um homem… complicado, digamos. Não tenho todo o poder para decidir sozinho, temo que ele possa negar a ajuda.
Respirei fundo, medindo as palavras antes de continuar.
— Converse com ele e volte a mim com uma resposta. Amanhã cedo, enviarei minha companheira Md para obter a resposta oficial. Tudo bem assim?
— S-sim, eu… irei hoje mesmo falar com o lorde — disse ele, visivelmente empenhado.
— Ótimo. Precisamos ser rápidos. Com o que aconteceu, logo mais pessoas virão até aqui, e a cidade terá os olhos de todos sobre ela. Precisamos agir.
Comecei a me levantar, caminhando em direção à porta. Antes que eu saísse, o capitão me chamou novamente.
— Zero… posso fazer uma última pergunta?
Voltei-me para ele, cruzando os braços.
— Pergunte.
Ele hesitou, como se escolhesse bem as palavras.
— Você… já matou inocentes?
A pergunta não era só uma curiosidade. Ele queria medir meu caráter, o homem por trás da máscara.
Respondi com franqueza, sabendo que ele não esperava essa resposta:
— Não, nunca matei um inocente.
Ele parecia surpreso, quase desconfiado. Eu sorri levemente antes de explicar:
— Entendo que isso possa parecer contraditório, mas sou um ladrão, não um assassino. Faço parte de uma organização chamada Corrupt, dedicada ao roubo de relíquias.
O choque no rosto do capitão era inegável; ele tentava, sem sucesso, lembrar-se de algo sobre essa organização.
— Entenda, capitão, nossa luta não é contra inocentes.
Eu me aproximo de Leny, que me encara com um misto de medo e confusão. Eu sei que ele está tentando decifrar minhas intenções com tudo o que revelei.
— P-Por que… por que me contou tudo isso? — Ele gagueja, lutando para manter a compostura. — Essas informações… não são confidenciais?!
Eu dou um meio sorriso, cínico e calculado.
— Não se preocupe, Leny. Eu não vou te matar… e nem sua família.
— Como assim?! — ele pergunta, a voz trêmula.
— Se alguém perguntar sobre mim ou sobre a organização Corrupt, você pode entregar todas as informações que possui. A Corrupt sempre foi um segredo, mas agora, deixaremos de ser uma sombra. Vamos aparecer para o mundo, com todas as nossas intenções às claras.
Leny começa a suar, o corpo tremendo visivelmente. A ideia de estar envolvido em algo tão profundo parece ser demais para ele. Eu observo sua reação com frieza, e, após um momento, continuo, dando o golpe final.
— Se eu encontrar uma relíquia valiosa nas mãos de pessoas inocentes, posso até pedir para que não haja luta. Mas, se houver resistência… — Faço uma pausa, com um brilho ameaçador no olhar. — Não hesitaria em matá-las. Não estou aqui para brincar de herói. Eu sou um ladrão!
Leny desaba no chão, o rosto pálido e os olhos arregalados. Ele está aterrorizado, e é exatamente isso que eu queria. Com um último olhar de desprezo, me viro e saio da sala, onde Md me espera, descendo do telhado com a mesma graça e agilidade de sempre.
— Alguma coisa estranha, Md? — pergunto mentalmente para Md.
Sabendo que ela está normalmente comunicando telepaticamente para manter a segurança. Pedi para que Md evitasse invadir minha mente, a menos que fosse uma emergência.
— Sim, algumas pessoas suspeitas chegaram à cidade, — responde Md em minha mente.
— Pessoas suspeitas? Como assim?
— Observei um grupo de indivíduos fortes. Eles não são tão poderosos quanto nossos últimos inimigos, mas, ainda assim, notavelmente habilidosos. — A voz de Md ressoa com uma leve desconfiança.
— Eles planejam nos atacar? Ou estão apenas nos espionando?
— Espionando, pelo que parece. Estão coletando informações, tentando não chamar atenção, — ela explica. — Mantiveram distância, mas mostraram interesse demais quando passamos.
— Como você os encontrou?
— Evitei o chão e fui por cima, pulando de casa em casa. Consegui observar que eles tentavam esconder seus rostos sempre que você passava, e evitavam qualquer contato visual direto.
— Eles são espiões…? possivelmente de um reino vizinho, — concluo, sentindo uma pontada de irritação.
Md me encara, confirmando com um leve aceno.
— Suspeito disso. A situação neste país está se deteriorando, Zero. Aparentemente, entramos numa era sombria. Se considerar o aumento dos sequestros e roubos nas estradas…
— E o tráfico no mercado negro, — completo, compreendendo sua linha de pensamento. — A demanda crescente por escravos, qualquer coisa que traga lucro… Isso alimenta uma cadeia de violência e caos. Quanto mais demanda, mais abduções e mais mortes.
— Exato. E é esse dinheiro sujo que permite aos chefões do mercado negro contratar mercenários e assassinos. Em pouco tempo, logo eles terão mais poder que os próprios reinos.
Faço uma pausa, assimilando as implicações disso.
— Então, eles estão me observando por dois motivos… Primeiro, por causa do corpo da cobra maligna, que pode ser vendido a preço de ouro no mercado negro. Segundo, querem avaliar o quão perigoso eu sou e se valho algum lucro para eles.
— Provavelmente, — diz Md. — Mas, ao sair da cidade, eles iriam perder a cobertura das pessoas para se camuflar.
— Verdade. Assim que deixarmos a cidade, o território será a nosso favor. Ainda assim, ter esses espiões no encalço será um incômodo.
Faço uma pausa, pensativo.
— Quando isso acabar, MD, eu planejo te deixar no comando e tirar umas férias. — Digo, rindo.
— Férias? — MD questiona, quase incrédula.
— EU MEREÇO! — Brinco, uma conversa mental que me fez sorrir por alguns segundos.
Ela ri também, a tensão finalmente aliviada por um momento.
⧫⧫⧫
— Que droga! Que droga! Que droga! — O grito ecoava pela sala enquanto ele apertava os cabelos loiros, antes tão bem arrumados, agora bagunçados e sem vida. William Dolores, lorde de Uruam, sentia-se preso em uma teia de desespero. Tentando recobrar o controle, murmurou para si mesmo: — Assim não dá… Assim não dá mesmo…
— Querido, onde ela está?! Precisamos avisar a guarda da cidade! — A voz de sua esposa interrompeu seus pensamentos. Ela gritava, tomada pelo pânico. Mas a sua presença parecia apenas piorar o humor de William.
Ele olhou para ela com irritação crescente, deixando escapar em tom de voz envenenado:
— Você acha isso uma boa ideia? Isso é idiota! Se fizermos isso, aí sim ela morre! Precisamos ser inteligentes!
Enquanto os dois discutiam, um som firme ecoou pelo salão. Toc, toc. Alguém batia à porta.
William endireitou a postura, tentando recuperar a compostura enquanto abria a porta. Do lado de fora estava seu secretário, Damian, que lhe lançou um olhar hesitante ao notar o estado de seu senhor.
— Senhor, o capitão temporário da guarda da cidade gostaria de falar com o senhor.
William endireitou-se com desdém, irritado por ser visto naquela condição.
Que humilhação, um mero plebeu me vendo desse jeito!
— Faça-o entrar. Estarei esperando-o na sala de reuniões.
Damian assentiu, embora sua voz tremesse ao responder:
— S-Sim, senhor.
Assim que o secretário deixou a sala, Willam voltou-se para sua esposa. Abriu uma gaveta da escrivaninha e tirou de lá um pente bordado com joias brilhantes e caras, estendendo-o para ela.
— Penteie meu cabelo! Receberei uma visita em poucos minutos! Depois, saia da sala.
— C-claro! — Ela obedeceu rapidamente, ajeitando os fios de cabelo do marido com as mãos trêmulas.
Enquanto sentia o toque dela, Willam pensou na sequência de eventos que o levou até ali.
Tudo havia começado com aquele maldito ataque da serpente à cidade. Se os guardas tivessem sido capazes, não teria sequer perdido seus bens preciosos. Mas, pior que a serpente, era o “homem” que surgirá depois: um mascarado que forçará o poderoso lorde a se ajoelhar e implorar pela própria vida. Ele sabia que aquele homem era a verdadeira origem de todo o caos.
Quando Leny, o capitão temporário, entrou na sala, usava a armadura da guarda da cidade central e caminhava até ele com uma postura confiante.
— Senhor lorde da cidade, gostaria de me apresentar. Meu nome é Leny, sou o capitão temporário da guarda da cidade central e gostaria de ter uma conversa com o senhor.
Willam não disfarçou o desprezo e sussurrou, com o rosto contorcido de raiva:
Não quero saber o seu nome, seu inútil! Você não passa de outro… Outro usado por ele! Que raiva! AQUELE HOMEM!
Respirou fundo, tentando recuperar o controle de si.
— Está bem… Larissa, saia.
— Tudo bem, querido. — Larissa deixou a sala, também abalada.
— Pode continuar… Capitão Leny. — O lorde indicou ao homem que prosseguisse, embora seus pensamentos estivessem borbulhando de ódio.
— Visto que as criaturas ajudaram a proteger nossa cidade, creio que seria justo oferecer apoio para que possam estabelecer uma cidade própria. Eles salvaram vidas e podem conviver em paz conosco.
William explodiu:
Eles só precisaram nos salvar porque vocês são incompetentes! Incapazes de cumprir seu papel! Se tivessem alguma força, isso nunca teria acontecido!
William pareceu engolir o orgulho e Leny prosseguiu:
— Então, com sua permissão, apoiaremos a causa deles.
William olhou para ele por alguns instantes, antes de dar um sorriso torto e falar com amargura:
— Ajude-os no que precisar. Eu farei minha parte, publicamente.
Leny hesitou por um segundo, antes de se afastar.
— Obrigado, senhor.
Horas depois, William e Larissa aguardavam em silêncio na sala de estar. Ambos estavam tensos, conscientes do terror iminente.
Em meio à apreensão, um portal abriu-se no centro da sala, iluminando o ambiente com um brilho sobrenatural. William e Larissa levantaram-se, tomados por um súbito pavor.
Diante deles, saiu um homem mascarado, conhecido apenas como Zero, segurando a filha deles pelo braço. A menina estava amarrada e amordaçada, com os olhos marejados de medo.
William sentiu a garganta secar, estalando a língua involuntariamente em frustração.
Zero, no entanto, lançou-lhe um olhar perigoso.
— O quê? — perguntou ele, em um tom mortalmente calmo.
— M-Me desculpe, senhor Zero! Foi um hábito… por favor, me perdoe! — William caiu de joelhos, suando frio, com o coração disparado. Sentia-se um rato, completamente dominado pelo pavor daquele homem.
Zero observou-o por um instante e deu de ombros.
— Tudo bem, vamos ao que interessa.
Larissa ajoelhou-se ao lado do marido, suplicando:
— Por favor, senhor, liberte nossa filha! Fizemos tudo o que nos pediu! Nos liberte dessa contaminação!
William puxou a manga, revelando a pele marcada pelo veneno roxo que Zero lhe injetará.
Dias antes, o homem mascarado havia ameaçado matá-los lentamente, usando aquele veneno que corroía a carne e queimava como fogo. Larissa, em meio à pressão, queria em vão recorrer aos guardas da cidade, mas todos estavam sob o controle de Zero.
O mascarado soltou a menina, que correu para os braços da mãe.
Willam, com a voz entrecortada, murmurou:
— E a… contaminação? P-Por favor, está doendo!
Zero o observou com um olhar impassível.
— Sei que dói. É um veneno que coloquei em pequenas quantidades. Em grandes doses, nem mesmo um antídoto o salvaria. Mas hoje, como prometido… — Ele jogou dois frascos amarelos para William, que agarrou as garrafas com as mãos trêmulas.
— Obrigado… Muito obrigado! — A voz de William era uma mistura de alívio e humilhação.
Zero deu um último olhar frio, antes de se virar em direção ao portal.
— Estarei de olho. Se precisar de vocês novamente, não hesitarei em procurá-los.
— Sim! Farei tudo o que o senhor ordenar! — William gritou, a voz carregada de medo e submissão. — Eu, William Dolores, lorde da cidade central de Uruam, cumprirei qualquer desejo seu, senhor Zero!
Zero apenas assentiu, desaparecendo pelo portal.
Assim que a sala voltou ao normal, Willam deixou-se cair de joelhos, ofegante e sem forças. Larissa olhou para ele, assustada.
— Amor… você… mijou nas calças?
Ele permaneceu imóvel, encarando a poça morna que se espalhava no chão. A humilhação pesava sobre seus ombros como uma sentença.
⧫⧫⧫
Ao atravessar o portal, senti a mudança de atmosfera me envolver. Agora estava de volta à caverna fria e parcialmente iluminada, meu abrigo temporário no acampamento dos Lobos. Assim que cheguei, dei de cara com Md, que, como sempre, me aguardava, conectada aos meus pensamentos, sempre à par de cada movimento meu.
— Deu tudo certo — ela afirmou com um tom sereno.
Assenti, ainda sentindo o peso da missão nos ombros, mas satisfeito com o resultado.
— Sim, agora temos o controle da Cidade Central. Nem acredito que conseguimos tão rápido. No fim, o lorde não passava de um homenzinho simplório.
— Agora ele está em nossas mãos. Não vai se opor ao Zero e obedecerá a cada uma das suas ordens.
— Exato. Com isso, garantimos vantagens que serão preciosas mais tarde. A construção da Cidade das Feras começa agora. — Fiz uma pausa, meus pensamentos se voltando para o próximo passo. — A propósito, como foi a coroação do Solus?
— Foi bem… embora nem todos estivessem totalmente satisfeitos. Mas, como esperado, os lobos mais jovens o aceitaram completamente.
Eu sorri, satisfeito. O apoio dos mais jovens era uma arma poderosa.
— Mostrar as habilidades de Solus nos treinamentos foi essencial. Eles o enxergam agora como um verdadeiro exemplo a seguir. Os mais velhos… bom, com o tempo, eles vão se acostumar. Duvido que haja alguma trama de rebelião agora, mas é bom ficar atento.
— Estarei sempre de olho — garantiu Md.
Soltei um suspiro profundo, sentindo o peso se dissipar aos poucos.
— Ah… finalmente acabou… preciso confessar, Md: estou exausto…
Deitei no chão frio da caverna, relaxando cada músculo.
— Vai tirar aquelas férias? — perguntou ela, com um ar divertido.
— Mas é claro! — respondi, quase rindo.
— E já sabe para onde vai?
— Hm… com todas as informações que conseguimos, quero explorar um pouco. Estou pensando no Reino das Águas.
— O Reino das Águas… é bem longe daqui — ponderou Md.
— Eu sei, mas não se preocupe. Deixarei um portal salvo aqui. Se algo der errado, volto rapidinho.
— Tem algum motivo especial para essa escolha?
Algumas, mas são apenas férias de qualquer maneira.
— Dizem que é um lugar excelente para relaxar, com ótimos banhos e acomodações. Mal posso esperar…
— Com o dinheiro que você arrancou do lorde da cidade, poderia viver no luxo para sempre.
— Kukuku! Se eu quisesse, poderia ficar à toa por um século. Mas, na verdade, só vou tirar um mês de folga. Preciso de um tempo para recarregar as energias… E fique tranquila: vou continuar treinando meu físico.
— Nesse mundo, quem não se mantém em movimento fica para trás.
— Posso contar com você para cuidar das coisas até minha volta?
— Pode, sim. E não sou só eu. Solus, Douglas e os outros estão prontos. Pode descansar sem preocupação.
— Parece que você começou a gostar bastante deles ultimamente…
— Eles são legais — disse Md, sem esconder um leve riso.
Soltei um suspiro aliviado, sentindo o cansaço tomar conta de mim.
— Ahhh… Amanhã parto para minha viagem, então vou dormir cedo hoje.
— E quanto a Zerafine e Elzer? O que pretende fazer com eles?
Pensei por um instante, o sono já me dominando.
— Que tal levar Zerafine, então?
— Por quê?
— Se quer confiar mais neles, talvez seja hora de dar o próximo passo. Mesmo que não saibam, eles são os primeiros membros da Corrupt. Pode ser uma boa ideia revelar sua identidade… começar com Zerafine pode ser o primeiro passo.
— Hm… faz sentido.
Fechei os olhos, deixando o cansaço me vencer.
— Boa noite, Md.
— Boa noite, Ivan.