Isekai Corrupt - Capítulo 55
22º Dia do Oitavo Mês do Ano – 20:35
Faz três meses desde o ataque da cobra maligna, e devo admitir que as coisas mudaram consideravelmente desde então. Parto agora em uma jornada rápida, acompanhado por Zerafine.
Inicialmente, considerei seguir para o país das águas, mas a verdade é que meu desejo real era explorar a capital do reino onde me encontro agora: o Reino de Xellivia.
Esse lugar é imenso, com ruas de pedregulho e inúmeras casas de madeira que, apesar de robustas, não são tão atraentes. A maioria dos habitantes aqui são plebeus, e embora haja uma área reservada para os nobres, ela é pequena em comparação com a vasta população comum.
Assim que cheguei ao Reino, há dois meses, encontrei um local tranquilo para me acomodar por alguns dias.
Com Zerafine ao meu lado, decidi manter o anonimato — a última coisa que queria era que alguém da Corrupt soubesse meu paradeiro. Para reforçar minha discrição, adquiri uma máscara diferente; afinal, o nome “Zero” começou a circular por aqui.
O fato de ter salvado uma cidade central fez meu nome ecoar mais do que esperava. Afinal, uma cidade central representa muito para o Reino, sendo o conjunto de todas elas responsável por cerca de 50% do lucro total, enquanto o restante é proveniente do próprio Reino.
Além disso, como Zero, negociei com os animais mágicos da floresta de Uruan, persuadindo-os a auxiliar no combate à cobra maligna — uma criatura que só poderia ser vencida por um exército de caçadores bem treinados.
Para evitar complicações, adotei uma nova identidade e tenho passado meus dias no Reino, observando com atenção cada detalhe para compreender o funcionamento desse lugar.
Zerafine, apesar de seu temperamento geralmente quieto, é bastante impaciente. Quando se encontra numa situação onde as informações lhe faltam, sua frustração se torna quase palpável. E nos últimos dias, isso ficou ainda mais evidente, pois ela não parava de me bombardear com perguntas sobre o motivo de estarmos em Xellivia.
Naturalmente, sendo alguém que veio de outro mundo e carece de experiência em relação a como as coisas funcionam aqui, preciso estudar a fundo o comportamento das pessoas e o nível de tecnologia que possuem. Zerafine, porém, nem desconfia que sou um completo novato nesse mundo, então, na maioria das vezes, evito fornecer explicações concretas.
Em vez disso, distraio-a com tarefas triviais que, embora pouco úteis, a mantêm ocupada por algum tempo.
Com dedicação, consegui formar uma visão geral do estado atual do mundo e da complexa teia de civilizações que o compõem.
Este continente é dividido em quatro países, cada um contendo quatro reinos. No momento, estou no país de Dieres, especificamente no território do Reino de Xellivia, que faz fronteira com o Reino Bacan. Curiosamente, há alguns anos, esse país foi declarado um território livre onde outras raças não-humanas podem coexistir.
Há uma distinção importante entre feras mágicas e raças, o que impede que as feras sejam reconhecidas como tal e, portanto, não têm direito à convivência comunitária com outras raças. Um exemplo são os lobos da floresta de Uruan.
Pelo que pude entender, quando uma fera mágica evolui além de certo ponto, ela adquire capacidade de raciocínio e até de comunicação com outras raças, utilizando sua mana. Mas nem todas as feras chegam a esse nível, então, em sua maioria, não são classificadas como raças capazes de viver em sociedade.
Xellivia é majoritariamente habitada por humanos, mas também há uma pequena população de demi-humanos — humanos com características animalescas. E, embora seja raro, não é impossível ver elfos por aí. Esses, no entanto, parecem mais viajantes do que residentes do reino.
A existência da floresta de Uruan e das feras poderosas que habitam seus cantos mantiveram o reino em constante estado de alerta. Embora o perigo seja uma realidade, a ideia de que algumas dessas criaturas possam um dia se aliar aos humanos e coexistir pacificamente traz esperança de uma vida mais tranquila para os animais da floresta.
Historicamente, quando o reino tomava conhecimento dessas feras mágicas escondidas, enviava exércitos de caça para erradicá-las, temendo que se tornassem uma ameaça maior. Esse tipo de operação é conhecido como Raids.
Mas, com o recente apoio dos animais da floresta de Uruan, que defenderam uma cidade central do ataque de uma cobra maligna, talvez a perspectiva comece a mudar.
A cidade central de Uruan já assinou um tratado de paz com os habitantes da floresta, o que deve melhorar a forma como os outros humanos os enxergam.
Deixei Md coordenando os assuntos na floresta de Uruan junto a Solus, que agora governa as criaturas ao lado de Aria, sua Rainha. Enquanto isso, continuo a coletar informações e a descobrir mais sobre o que esse mundo permite realizar.
Uma das coisas que mais despertou minha curiosidade foi saber que existe uma academia de prestígio neste Reino, onde é possível estudar artefatos antigos.
Assim que soube dessa oportunidade, decidi tentar entrar na academia para aprofundar meus conhecimentos sobre esses artefatos, conhecer pessoas com talento e, além disso, rever um antigo conhecido.
⧫⧫⧫
Erick sentiu o peso das palavras ao ouvir a voz irritante de seu colega de quarto.
— Ei, Erick! O que você está fazendo? Vai se atrasar, aluno modelo! — Silver, seu colega, era o tipo de pessoa que Erick menos queria por perto, especialmente pela manhã. Não suportava ser acordado, e ainda mais por alguém que vivia cobrando os outros enquanto ele mesmo parecia evitar qualquer esforço.
No entanto, não havia muito o que fazer. Por mais que odiasse admitir, Silver estava certo. Era hora de levantar. Erick se espreguiçou, olhos ainda pesados, e tentou afastar o cansaço.
Ele havia se mudado para o Reino de Xellivia alguns meses antes. Este reino era o centro das atenções no país de Dieres por sua história rica e reputação no estudo de relíquias antigas. Xellivia possuía as academias mais renomadas, onde eram ensinados os conhecimentos mais avançados sobre relíquias, graças ao primeiro rei do reino, que fundara essa nação há mais de cinquenta anos. Um amante da história antiga, ele se dedicou ao estudo de civilizações perdidas de mil anos atrás, transmitindo seu fascínio à cultura e educação local.
As relíquias, misteriosos objetos de eras passadas, despertavam enorme curiosidade. Ainda que cem anos de pesquisa tivessem se passado desde a descoberta da primeira relíquia, até os mais habilidosos conseguiam apenas replicar relíquias de qualidade baixa, de rank ferro. Era um trabalho árduo, e poucos dominavam tal habilidade. Por isso, as relíquias antigas possuíam valor incomparável, especialmente as de ranks elevados, uma raridade cobiçada por estudiosos e poderosos.
Essa prosperidade fez com que Xellivia se mantivesse firme, mesmo enquanto o resto de Dieres beirava um conflito iminente. Os três reinos vizinhos estavam em atrito, disputando cada palmo de terra cultivável. Com o crescimento populacional, tornou-se insustentável manter quatro reinos em coexistência. Cada território escasso aumentava a dependência de alimentos e dificultava a negociação entre os reinos, pois ninguém queria enriquecer o rival ao comprar suprimentos. A disputa por terra parecia um conflito sem solução. E, para piorar, o país agora era assombrado por aparições de feras mágicas poderosas, o que causava um temor generalizado entre os reinos. Muitos temiam que, uma vez superado esse problema, as hostilidades voltassem com ainda mais força.
Erick havia tido sorte em chegar até ali. Graças a Ivan, um aventureiro jovem e habilidoso que o ajudou a vingar-se de alguém que lhe causou muito mal, ele conseguiu vir até a capital de Xellivia para estudar. Sentia-se imensamente grato por Ivan e se perguntava se algum dia teria a chance de reencontrá-lo para agradecer.
Depois de sacudir a preguiça de vez, começou a se vestir para a primeira aula do dia. O uniforme da academia consistia em um elegante conjunto social azul-ciano escuro, acompanhado por um colete, terno e gravata. Não havia obrigatoriedade de usar o terno, então ele o deixou dobrado sobre a cama.
Enquanto se vestia, Erick sentiu um olhar fixo em sua direção. Era Silver, sentado na cama ao lado, observando-o com um olhar curioso.
— Tá encarando o que, babaca? — resmungou Erick, franzindo as sobrancelhas.
— Foi mal, foi mal… é que às vezes esqueço que você é um cara. — Silver deu de ombros, um sorriso travesso no rosto.
Erick suspirou, pois aquela não era uma cena incomum. Ele fora agraciado com uma aparência que muitos consideravam “delicada”, a ponto de ser confundido com uma garota. Seu professor, inclusive, chegou a questionar uma vez o motivo de estar usando o uniforme masculino em vez do feminino. Esse tipo de situação só não causava maiores desconfortos por conta de Silver, que, já conhecendo Erick, esclarecia a situação com paciência sempre que necessário.
Erick lançou um olhar ameaçador e julgador na direção de Silver, que apenas riu do canto da boca. Depois de terminar de se arrumar, Erick saiu batendo a porta com força contra a parede. Aquilo certamente aliviou um pouco sua irritação.
Por conta de sua beleza, ele havia sido incluído no “alto rank” dos alunos mais bonitos da academia, um título reservado, na maioria das vezes, para as garotas mais atraentes. Claro que isso criava um enorme problema para ele.
Eu sou um cara!
Embora não tivesse um problema com sua aparência em si, ser alvo constante de olhares de rapazes, muitos dos quais pareciam pensar que ele era uma garota, era algo que o deixava profundamente irritado.
Mas o que podia fazer? Aquele era o rosto com o qual nascera; só lhe restava aceitar e seguir em frente.
Ao entrar na sala de aula, ouviu alguns murmúrios ao redor. Baseado em suas experiências anteriores, ele logo presumiu que o assunto fosse ele, então fechou a expressão o máximo que podia para afastar qualquer olhar curioso dos outros estudantes.
— Quem são eles…?
— Não sei, mas parecem importantes…
— Por que ele está de máscara? Queria ver se é bonitinho…
As garotas próximas cochichavam, mas estavam com os olhos fixos em outra direção. Erick percebeu que, para sua surpresa, os comentários não eram sobre ele desta vez. Ao procurar a origem dos murmúrios, viu dois novos alunos que jamais havia encontrado na academia.
O burburinho girava em torno de uma jovem de beleza impressionante, com cabelos negros brilhantes, e um rapaz de cabelos ruivos, usando uma máscara negra que cobria metade do rosto.
Erick se acomodou em seu lugar, sem desviar os olhos. Havia algo intrigante naqueles dois.
Quem são esses?