Knight Of Chaos - Capítulo 472
Apressando-se em direção ao portão Norte, Fernando estava andando, com uma expressão neutra em seu rosto. Logo atrás dele seguia uma pequena comitiva, com Theodora, Ilgner, Thom, os Oficiais e alguns membros do Quarto Pelotão, o qual Archie liderava.
Normalmente não seria necessário que um Tenente fosse ao local, entretanto, por se tratar de um Oficial, uma patente relativamente alta tentando desertar, o contexto da situação mudou completamente.
Embora todo o fronte Sul estivesse em um Armistício, atualmente ainda era considerado como ‘tempos de guerra’, então uma deserção como essa não era uma simples infração, principalmente se tratando de tal cargo.
Eram comuns casos em que um soldado pudesse pedir demissão e sair da Legião, porém, dependendo de seu posto, ou de quantos recursos foram investidos nele, seria necessário pagar alguma compensação a mesma. Mas em tempos de guerra isso não era possível, sendo estritamente proibida qualquer dispensa que não fosse devido a grandes ferimentos, pois em um cenário desfavorável para as Legiões, poderia haver uma debandada em massa, logo o fato de Archie tentar fugir nesse momento poderia ser considerado um crime de guerra.
“Aquele… desgraçado! Depois de tudo que Fernando fez por ele!” Noah disse, enfurecido.
Sendo o Oficial responsável pelo Primeiro Pelotão, alguém que estava na mesma posição que Archie, sentiu-se insatisfeito e traído pelo sujeito.
Não apenas Noah, mesmo Kelly, Gabriel e Trayan não eram diferentes. Atualmente o Batalhão Zero, mesmo sendo Nomeado, ainda era um Batalhão novato. Somente agora após as proezas em Belai e Garância é que sua reputação estava começando a crescer e estavam conseguindo alguma fama. Contudo, se notícias de deserções se espalhassem, isso afetaria negativamente a imagem deles, contrapondo grande parte de suas conquistas.
“Talvez devêssemos entender melhor as razões que o induziram agir dessa forma.” Gabriel sugeriu. Apesar de também estar com alguma raiva, ainda pensou que talvez Archie, a quem considerava um amigo, tivesse seus motivos.
“O que há para perguntar a um traidor?” Theodora disse, com uma voz gelada.
Ouvindo isso, Gabriel ficou em silêncio e mais ninguém ousou dizer nada. Depois de Fernando, ela era quem detinha a maior autoridade no Batalhão. Embora Ilgner ocupasse a mesma posição, raramente se envolvia em questões de administração e liderança como ela.
O próprio Fernando também não disse nada, sua mente estava nublada, sem conseguir compreender porque Archie tentaria fugir sem dizer qualquer coisa. Mesmo que ambos não fossem tão próximos, ele ainda sentia que o rapaz era como um membro de sua família.
Em pouco tempo, o jovem Tenente e a comitiva do Batalhão Zero chegaram ao portão Norte. Ao verem isso, os Guardas rapidamente abriram a entrada para a guarita. Os olhos de alguns deles observavam o rapaz pálido e inexpressivo com uma miríade de variações em suas emoções.
Atualmente Fernando já não era mais um Tenente qualquer. Depois de seus feitos na Quinta Divisão, chegando a até a assumir seu comando de forma provisória, sua fama havia se espalhado entre as pessoas. Principalmente sua tática que tinha sido implementada na batalha, que foi posteriormente nomeada de ‘Corredor de Sangue’, sendo a principal responsável por repelir os Orcs.
Apesar do próprio jovem Tenente ter vindo a público alegando que só estava seguindo as instruções do General Dimitri, muitos não acreditaram nisso. Até porque, por mais que ele estivesse apenas seguido ordens, só o fato de ter conseguido implementar uma tática tão insana, exigia uma incrível coordenação, assim como força das tropas. Sem o Batalhão Zero encabeçando o centro do Corredor de Sangue e parando o avanço inimigo, essa formação teria sido completamente inviável de ser reproduzida.
“Tenente Fernando.” Um homem alto e magro disse, levando o punho ao peito esquerdo, em sinal de cumprimento ao sair da guarita, era o Chefe da Guarda do portão Norte. “É um prazer conhecê-lo, senhor! Realmente não gostaríamos de incomodá-lo, fazendo-o vir pessoalmente, mas devido à situação…” O homem disse, envergonhado.
Mesmo tendo uma idade muito maior do que o rapaz a sua frente, o homem não ousou demonstrar qualquer arrogância.
Vendo isso, o jovem Tenente assentiu.
“Onde estão?” perguntou, varrendo com seu olhar sobre os outros Guardas, em torno da entrada da guarita.
O homem mostrou apressadamente o caminho.
“Por aqui, por favor.”
Fernando logo o seguiu, assim como os demais. Os outros Guardas não puderam deixar de olhar para os membros do Batalhão Zero com admiração.
Não apenas o Tenente era famoso, como também seus Subtenentes e Oficiais. Muito era falado a respeito das tropas do Batalhão Zero. Alguns alegavam que seus Oficiais e até mesmo Cabos tinham uma força equivalente a um Subtenente, com muitos deles até mesmo abatendo Dobats Líderes Inferiores durante a última batalha.
A maioria via isso como apenas boatos infundados, mas para os soldados que fizeram parte do corredor naquele dia e puderam ver a força dessas pessoas pessoalmente, sabiam que isso não se tratava de palavras vazias.
Os Guardas, que haviam chegado a Garância recentemente, para assumir a defesa da cidade, só poderiam se basear nas palavras de terceiros, já que não puderam presenciar os feitos por si próprios.
Muitos dos olhares não estavam nem em Theodora ou Ilgner, os dois Subtenentes, mas em Thom, o Sargento.
“Ei, olha aquele cara, de cabelos pretos bagunçados, dizem que ele matou um Orc Líder sozinho!” Um dos Guardas disse.
“Um? Eu ouvi falar que ele matou dois! Pelo que ouvi, ele também teve um grande papel na batalha em Belai, as pessoas o chamam de Thomas, o Assassino das Chamas. Dizem que ele não é mais fraco do que o próprio Tenente do Batalhão Zero.”
“O quê? Isso só pode ser mentira, por que alguém assim aceitaria ser apenas um Sargento?”
“Não faço ideia, mas um Capitão Combatente, que estava na defesa da Quinta Divisão, alegou que viu isso pessoalmente.”
Os Guardas cochichavam, enquanto o grupo passava.
Thom, que ouviu algumas das conversas, sentiu-se envergonhado, mas ao escutar alguns comentários falando mal de Fernando, foi se irritando, quase começando uma luta, sendo parado antes por Noah.
Em pouco tempo o grupo chegou às celas, então Fernando e os outros puderam ver quatro indivíduos trancafiados. Estes eram Archie, Louise e mais dois Soldados, todos membros do Quarto Pelotão.
Ao ver o seu Tenente e os demais, Archie, que estava sentado, levantou-se. Seu cabelo, normalmente em formato de tigelinha, agora estava bagunçado e sujo, também havia alguns ferimentos em seu rosto, assim como um olho roxo. Seus dois punhos estavam amarrados por uma Algema de Ervral, assim como suas pernas.
“Eles foram parados numa inspeção nesta manhã, antes do nascer do sol. Tentaram sair da cidade junto a uma caravana de mercadores que iria partir para Estrona.” O Chefe da Guarda disse, com um olhar de raiva. “Quando descobrimos que havia algo de errado, esse cara tentou resistir. Ele é mais forte do que parece, derrubou a mim e alguns outros antes que pudéssemos fazer qualquer coisa.” Ao dizer isso, apontou para um hematoma em seu próprio pescoço.
Havia uma leve pitada de medo em seus olhos, se o homem loiro não tivesse usado o punho da espada para derrubá-los, mas sim a lâmina, vários na checagem do portão estariam mortos. O Chefe da Guarda não conseguia entender como alguém tão forte era apenas um mero Oficial, que deveria estar muito abaixo dele próprio em força. Este também era um dos motivos pelos quais não se atrevia a faltar com respeito com Fernando ou os outros membros do Batalhão Zero.
“Por sorte, um Capitão que estava nas muralhas notou a confusão e interviu, capturando todos.”
Além do Chefe, os outros Guardas também pareciam em alerta em direção a Archie e os demais.
Fernando ouviu tudo em silêncio, sem dizer uma única palavra. Então olhou em volta, para o ambiente apertado, das celas.
“Quero falar com eles, tem algum lugar mais espaçoso que podemos usar?”
O Chefe da Guarda ficou surpreso, mas assentiu.
“Sim, o senhor pode usar a área de treinamento.”
Pouco tempo depois, Fernando estava num local aberto. A frente dele estavam os Guardas, com Archie, Louise e os outros dois Soldados. Atrás dele estavam Theodora e os demais.
Ugo e Leo, como os membros de mais alto nível do Quarto Pelotão, também estavam presentes. Ambos tinham expressões complicadas ao verem o estado lastimável de seus companheiros. Ao mesmo tempo que havia um ressentimento em relação a ‘traição’, também sentiam pena.
Ugo, em especial, nutria um forte sentimento de amizade quanto a Archie e Louise, já que se conheciam desde a época em que faziam parte da Equipe 33 em Vento Amarelo, quando seu irmão, Kel, ainda estava vivo. Naquela época os dois choraram pela morte de seu irmão ao seu lado, sendo extremamente próximos.
“Fernando, eu…” Archie, que estava ajoelhado, tentou falar algo, mas foi subitamente interrompido por Theodora, que se adiantou à frente, sacando sua espada Céleres de sua Pulseira.
“Líder, não há necessidade de palavras. Devemos seguir as regras militares e executá-los agora mesmo.”
Ao ouvir isso, somado ao olhar frio da mulher, Archie sentiu um calafrio na espinha. Ele sabia que ela não estava blefando. O rapaz então olhou para a mulher loira ao seu lado, Louise, que estava com uma expressão aterrorizada.
“Nenhum deles tem nada a ver com isso, eu sou o único culpado, eles só estavam seguindo minhas ordens, foram coagidos!” Archie gritou, em plenos pulmões.
Vendo isso, Theodora o encarou, com seus olhos negros.
“Eles seguiram ordens que iam contra o Batalhão, contra o Tenente. Isso é motivo suficiente.” A mulher falou, ainda com a espada erguida, aproximando-a do pescoço do sujeito.
Sentindo o fio da lâmina, Archie engoliu em seco, enquanto olhava para Fernando, que se mantinha com um rosto inexpressivo, sem esbanjar qualquer reação.