Meu Não Tão Detestável Vilão - Capítulo 02
Após alguns minutos caminhando pelos arredores da academia, Rael finalmente chegou em frente ao enorme dormitório masculino, onde pretendia descansar um pouco e processar melhor a nova situação em que se encontrava.
Tudo aquilo ainda soava meio confuso, no entanto, procurar respostas agora seria inútil. Apesar de possuir o sistema, usá-lo estava fora de questão, pois ele não queria ficar dependente de uma entidade suspeita como aquela.
Baseado em seus conhecimentos sobre novels, ele sabia que sistemas de vilões geralmente eram extremamente traiçoeiros.
Muitas vezes, esses sistemas ofereciam objetivos arriscados e irritantes, enquanto entregavam recompensas ruins.
Mesmo Rael achando essa situação complicada, no fim, não era de todo ruim, pois nesse mundo, ele era alguém muito rico, e isso era algo muito vantajoso. Além disso, sua vontade de retornar para seu mundo era mínima.
Então, se ele evitasse agir feito um babaca como o dono original desse corpo, Rael poderia ter uma vida boa, desfrutando das regalias como atual herdeiro da família Entegarden, enquanto o protagonista e as heroínas seguem a história original.
No enredo do jogo, o papel dele seria apenas o de ser humilhado, e futuramente ele tentaria sabotar Sylfith e Adrian no torneio anual da academia. No entanto, ele acaba sendo descoberto por outra heroína, o que leva a família Layneth a pedir sua expulsão de Mystalora e da família Entegarden.
Sem muita opção, o patriarca da família o colocaria para fora de casa, e Rael acabaria se tornando praticamente um mendigo, esquecido por todos.
— “Talvez um vilão a menos não faça muita falta” — pensou Rael.
Ao entrar no dormitório e subir quatro andares, ele finalmente chegou à porta de seu quarto. Tirou a chave do bolso e a inseriu na fechadura, abrindo-a.
Assim que entrou e olhou ao redor, logo percebeu o quão bagunçado o quarto estava. Ficava claro que o Rael original daquele mundo não era uma pessoa muito organizada. Sua cama estava cheia de roupas sujas, e o lugar parecia bastante empoeirado, fazendo-o se perguntar como diabos alguém conseguia viver em um lugar assim.
Aquela visão o deixou irritado, levando-o a decidir limpar o quarto antes de descansar. Talvez demorasse um pouco, mas Rael tinha tempo de sobra. Segundo suas memórias, as aulas daquele dia já haviam terminado, pelo menos para os magos da academia.
Durante o restante do dia, uma série de duelos classificatórios ocorreria entre os guerreiros e os invocadores, enquanto os magos foram dispensados mais cedo. Como Rael era considerado um deles, não precisava mais comparecer pelo resto do dia.
— Que droga… por que um cara rico como esse não tem pelo menos uma empregada para limpar essa imundice de lugar? — Rael resmungava para si mesmo enquanto juntava algumas peças de roupas sujas.
Depois de algum tempo limpando o quarto, Rael olhou pela janela e percebeu que o céu estava quase escurecendo. Ele parou por um momento para contemplar o belo pôr do sol.
A lua já estava visível por todo o céu de Grevar, e Rael finalmente tinha terminado de organizar aquela bagunça. Após separar todas as suas roupas sujas e remover toda a poeira do local, seu corpo implorava por uma pausa.
Ele decidiu ir para o banheiro tomar um banho e depois comer algo na cantina da academia, que ficava disponível vinte e quatro horas devido às aulas noturnas realizadas com alunos veteranos.
Depois de terminar o banho, Rael vestiu novamente seu refinado uniforme, em tons de preto e azul, adornado com o brasão de Mystalora no peito. Sentindo-se renovado, ele decidiu dar uma última olhada no espelho antes de sair.
Quando viu sua imagem refletida, logo notou que sua aparência era idêntica à do personagem do jogo. Seus cabelos loiros claros, olhos vermelhos penetrantes, rosto anguloso e um sorriso vilanesco não deixavam dúvidas de que ele realmente era o vilão Rael de O Imperador do Artherian.
***
Mesmo à noite, a academia de Mystalora estava bastante movimentada. Vários alunos ainda vagavam pelo local, enquanto alguns professores escoltavam suas turmas para uma suposta patrulha noturna pelas redondezas.
Rael caminhava próximo ao prédio dos invocadores, onde os alunos aptos em invocação de bestas estudavam. Segundo suas memórias, a maneira mais rápida de chegar à cantina era passando pelo antigo prédio de treinamento de invocações.
Mesmo sendo antigo e inutilizado, o lugar ainda aparentava estar bem conservado, não apresentando qualquer perigo aparente ao atravessá-lo.
Determinado em pegar logo sua janta e ir dormir, Rael abriu a porta e adentrou o local. Nada parecia estar errado, o lugar estava bem iluminado por algumas esferas de fogo colocadas dentro de caixas de vidro espalhadas pelas paredes.
Enquanto se aproximava da saída, Rael ouviu um barulho estranho vindo de uma das salas fechadas, fazendo seu coração disparar de medo. Apressando o passo, ele se dirigiu rapidamente à porta de saída no final do corredor. Sentindo um pouco de medo, ele tentou abrir a porta, suas mãos tremiam levemente.
— “Acho melhor eu sair daqui logo” — pensava Rael enquanto tentava girar a maçaneta.
Porém, a porta não se abria de jeito nenhum, pois ela parecia estar trancada, tornando impossível sua abertura. Decidindo deixar para lá, Rael opta por retornar pelo caminho por onde veio. Ele só havia entrado ali porque era um atalho frequentemente usado por outros estudantes, o que tornava muito estranho encontrar essa porta fechada.
No caminho de volta para a entrada do prédio, um barulho alto pôde ser ouvido novamente, seguido de alguns rosnados vindos da mesma sala de antes. Algo não muito agradável estava por ali, e ele não queria dar de cara com seja lá o que fosse aquilo.
Ao passar silenciosamente pelo corredor da sala de onde vinha o barulho, ele sentiu alívio por não ter chamado a atenção da criatura responsável por aqueles sons. Tudo parecia estar indo bem até ele sentir um calafrio na espinha, deixando-o brevemente desconcertado.
Uma estranha sensação de estar sendo observado surgiu, tornando a situação ainda mais bizarra. Rael sabia que não seria sensato ficar ali por mais tempo e precisava sair daquele lugar o quanto antes. Com isso em mente, ele decidiu correr, em vez de arriscar ser pego por seja lá o que estivesse espreitando naquele local.
— Ei, o que você está fazendo aqui?
Quando ele estava prestes a correr, uma voz surge vinda de suas costas, fazendo-o gritar:
— AAAAH!
Sem pensar duas vezes, Rael disparou assustado. No entanto, enquanto corria pelo corredor, uma parte do chão de madeira cedeu sob seus passos apressados, fazendo-o tropeçar e cair violentamente.
Uma dor insuportável começou a surgir em seu braço esquerdo, e quando Rael foi analisar, percebeu que seu braço estava meio envergado. A cada movimento, uma pontada aguda o incomodava, e ele também começou a sentir dores na região da cintura.
— DROGA! — Ele gritou, agonizando no local.
— EI! Tá tudo bem aí? — Aquela mesma voz anterior falou meio preocupada.
Ao olhar na direção daquela voz, Rael avistou uma garota de longos cabelos lisos alaranjados, que caíam graciosamente sobre seus ombros. Seus olhos verdes pareciam refletir a luz intensamente, conferindo-lhe um ar enigmático.
Seu semblante transmitia um certo tom de aflição, contrastando com a tensão de Rael. Ela estava vestida com o mesmo uniforme elegante das garotas da turma de invocadores: um vestido preto e branco, complementado por uma boina preta feminina.
Rapidamente, ela corre na direção dele, que estava agora sentado no chão segurando seu braço machucado. Quando chegou perto dele, a garota se ajoelhou e o encarou fixamente dizendo:
— Seu braço não parece nada bem. Deixa eu dar uma olhada!
— A-Arlette? — perguntou Rael, surpreso ao reconhecer a garota.
— Hmm? Você me conhece? — retrucou Arlette, surpresa por ele a reconhecer.
— É- Aiaiai… — O braço de Rael começou a doer ainda mais, interrompendo sua resposta.
Arlette percebe a intensa dor que Rael devia sentir com o braço quebrado. Sem hesitar, ela coloca sua mão sobre o braço dele, concentrando-se para usar sua magia de cura.
— <Curantius Lottai!>
Uma leve luz dourada envolveu o braço de Rael, e a dor diminuiu consideravelmente. No entanto, seu braço ainda estava em estado ruim, pois a garota não era uma maga e sua afinidade com magia era limitada.
— Me desculpe, mas como sou uma invocadora, minha magia de cura apenas vai aliviar sua dor — explicou Arlette, sentindo-se culpada.
Notando a expressão desolada da garota, Rael colocou uma mão sobre o ombro dela e explicou que não precisava se preocupar com isso. Afinal, a culpa foi dele por sair correndo naquele lugar como um idiota.
Arlette insistiu em ajudá-lo, decidindo acompanhá-lo até a enfermaria da academia. Ela ergueu Rael e sugeriu que ele se apoiasse nela com seu braço direito, que ainda estava em boas condições.
Ele se sentiu um pouco estranho, sendo carregado pela mesma heroína que acabaria por revelar o plano do verdadeiro Rael. De certo modo, aquilo soava irônico, entretanto ele não tinha outra opção senão aceitar essa ajuda.
Provavelmente, ela estava se sentindo culpada por vê-lo nesse estado. No entanto, ele não a culpava verdadeiramente e achou essa atitude característica dela. No jogo original, ela era um pouco reservada e difícil de se relacionar, mas não era má pessoa.
Com isso, ambos saíram do prédio e foram até a enfermaria, com Rael se apoiando nela. Ele fazia um grande esforço para não ter nenhum tipo de pensamento impróprio, pois Arlette era muito atraente, e manter sua mente limpa se tornava um desafio cada vez mais difícil.