O Monarca do Céu - Capítulo 303
Os ermos.
Vagando pela belíssima cidade, Colin e Scasya ficaram inebriados com tantos detalhes daquelas construções magníficas, mas não deixaram que as belas estruturas servissem de distração para seu real objetivo.
Ao caminhar pela cidade, notaram que várias pessoas pareciam estar de saída. Carros de boi puxavam carruagens enormes onde dentro haviam pertences que correspondiam a uma vida inteira.
Como sugerido, foram até uma das guarnições e o que viram foram de fato crianças usando armaduras e portando espadas. Os pequenos se assustaram com o tamanho de Colin e quase caíram para trás.
— Be-Bem-vindo, senhor! — O garoto levantou o Elmo, olhando para Scasya ao seu lado. — E senhorita! Pre-Precisam de informações?
— O senhor é um mercenário, não é? — perguntou outro garoto, mais novo e menor. Ele usava um elmo tão grande que mal podia ver por baixo dele. — Aposto que é um dos melhores!
Colin abriu um sorriso convencido.
— Quem sabe, agora me digam, como faço para falar com Kerie?
Eles entreolharam-se com os olhos brilhando.
— O senhor veio ajudar na guerra? — O menor quis saber. — Precisamos de alguém forte como o senhor!
Colin fez um gesto vago. — Quem sabe… Mas primeiro eu preciso falar com ela. Vocês podem me levar até lá?
O garoto assentiu e saiu de dentro da pequena guarnição de madeira, correndo pela rua.
— Me sigam, venham! — Olhou para o seu amigo. — Brad, eu já volto!
— Bem-vindo a Urock! — disse Brad empolgado. — Aproveitem a cidade!
Colin assentiu com um sorriso enquanto observava o garotinho desajeitado correndo com aquele Elmo desproporcional sobre a cabeça.
À medida que avançavam pelas ruas, não podiam deixar de notar a evidência de que mais e mais pessoas estavam abandonando a cidade.
Tavernas estavam vazias e meretrizes que haviam decidido morrer ali lutavam para atrair clientes.
Dirigiram-se então para uma colossal torre de pedra e atravessaram um posto guardado por jovens soldados que ficaram impressionados pelo porte físico de Colin.
Mesmo que essas sentinelas, incumbidos da proteção da entrada da torre, tentassem manter uma expressão firme, era impossível esconder o medo que sentiam.
Colin encarou cada um deles diretamente nos olhos, e quase podia sentir a tensão correndo por suas veias. O garoto que os conduzia continuou subindo as escadas, seguido por outros jovens que abriram caminho para Colin e Scasya.
Finalmente alcançaram o topo da torre, o local onde Kerie se encontrava.
Ela era uma mulher loira, de lábios rosados e olhos amarelos, brilhando com um tom mais intenso que o próprio ouro.
Vestindo uma reluzente armadura de prata, seu cabelo trançado caía sobre os ombros, enquanto suas mãos repousavam sobre uma mesa que sustentava um mapa gigante, pontilhado com totens que indicavam suas estratégias.
A seu lado, estava um jovem de cabelos escuros, olhos azuis e uma estrutura atlética, vestido com uma armadura de couro reforçada com placas de metal sobre o torso.
— Senhorita Kerie, senhorita Kerie! Temos visitas! — gritou o garoto, apontando para Colin e Scasya.
Kerie largou o mapa que estava estudando e seus totens rolaram pelo chão.
O homem que a acompanhava levou a mão à espada e encarou os recém-chegados com desprezo.
— Elfos Negros? — rosnou ele, com raiva. — O que fazem aqui? Voltem para o buraco de onde saíram!
Ele sacou a espada, que brilhou com mana, e a apontou para Colin. — Não queremos a ajuda de Elfos, caiam fora, ou eu mesmo vou expulsá-los à forç-
Bam!
Em um piscar de olhos, Colin o golpeou, quebrando a placa de metal e o fazendo soltar a espada enquanto apoiava a mão no abdômen. Deu alguns passos trôpegos e golfou, desabando no soalho.
Colin o olhou com olhos frios enquanto ele tentava recuperar o ar.
— Eu poderia ter obliterado você da cintura para cima, então me agradeça por eu não ter feito. — Ele desviou o olhar para Kerie, que tremia de medo com a demonstração de poder e velocidade. — Eu não vim para falar com seus capangas, vim para falar com você.
Kerie segurou a espada instintivamente, mesmo sabendo que era inútil. — Quem é você? — Ela recuou um passo, nervosa.
— Eu e minha amiga estamos aqui para ajudar.
Ela olhou de um para outro, desconfiada. — Como posso saber que você não é um assassino enviado por Morbash?
Colin sorriu de leve. — Se eu quisesse matá-la, já teria feito. E, francamente, o seu exército não me impressiona. Não seria difícil acabar com ele. Então, que tal conversarmos?
Kerie suspirou, guardando a espada e concordou. — Está bem, venham comigo.
Passaram pelo homem agonizando no chão e deixaram a sala. Viraram o corredor e adentraram um espaço aconchegante, digno de um Leerstrom.
As paredes eram enfeitadas com papel de paredes dourados, as poltronas ficavam entorno de uma mesa de madeira com uma chaleira em cima. Haviam algumas estantes de livros e até alguns porta-espadas.
— Fiquem à vontade. — Kerie tirou as luvas e as atirou para um canto, servindo-se de chá. Suas mãos tremiam. — Tem biscoitos ali, se quiserem.
Colin balançou a cabeça. — Não, obrigado.
— Nem eu — disse Scasya.
— Tudo bem… — Kerie suspirou. — Me desculpem pelo que aconteceu antes. Newil perdeu os pais para os Elfos Negros, ele ainda não superou… vai ficar um tempo de cama com as costelas quebradas, mas talvez aprenda a se controlar. — Ela tomou um gole de chá, tentando se acalmar. — Vocês vieram para ajudar na guerra?
Colin se acomodou na poltrona. — Queremos saber o que está acontecendo aqui. Viemos de longe, não temos ideia do que vocês estão enfrentando.
Ela bebeu mais um pouco de chá.
— Há décadas lutamos contra os Orcs, mas tudo piorou quando Morbash surgiu. Dizem que ele é um Monarca da Pujança… vocês acreditam nisso? Eu nunca ouvi falar de um Monarca da Pujança, e muito menos de um Monarca tão jovem… isso parece impossível…
— E os seus guardas? — perguntou Scasya. — O que houve com eles?
Kerie acabou com o chá e encheu a xícara novamente. — Foram muitas batalhas ao longo dos anos, e a maioria deles caiu diante de Morbash e seus lacaios… — Ela desviou o olhar e abraçou a xícara com as duas mãos. — Há algumas semanas, fomos emboscados nos ermos… foi um massacre, ninguém sobreviveu… as crianças que vocês viram são órfãs dos soldados que morreram pelo povo, mas o povo perdeu a esperança em nós, por isso estão fugindo da cidade. — Ela tomou outro gole de chá. — Talvez eles estejam certos.
— E por que você não foge também? — questionou Scasya. — É óbvio que se houver um ataque você vai morrer junto com essa cidade.
Kerie concordou com a cabeça. — Você tem razão, mas eu não vou fugir, nem esses garotos. Nós nascemos aqui e vamos morrer aqui como soldados!
Colin assentiu. — Você tem algum espião? Alguém que saiba dos movimentos de Morbash? Isso pode nos ajudar a nos prepararmos.
— Não, não temos, mas não é difícil saber quando eles vão atacar. Eles tocam as trombetas, e são muito altas. Mesmo que estejam longe daqui, podemos ouvi-las.
— Então vamos ficar de olho e esperar o seu comando.
Kerie terminou o chá com uma sobrancelha arqueada. — Vocês estão falando sério? Vão mesmo nos ajudar? Vocês parecem fortes, mas isso é suicídio, até para vocês…
— Não se preocupe — disse Colin levantando-se. — Nós damos conta. Vamos, Scasya.
A Alada se levantou e fez uma reverência. — Obrigada por nos escutar. Como meu amigo disse, estaremos por perto se precisar de ajuda.
Kerie permaneceu sozinha no recinto, questionando internamente como aqueles dois indivíduos haviam surgido ali. No entanto, não se importou muito com isso. Qualquer ajuda era valiosa, especialmente de pessoas poderosas.
Os dois deixaram a torre atraindo olhares curiosos à medida que seguiam em direção a uma estalagem. Lá, alugaram um quarto por conta de Kerie.
Seu quarto era um aposento espaçoso, com duas camas, uma sacada, guarda-roupa e estantes de livros vazias.
Colin se jogou na cama e retirou os sapatos.
— Urock está com os dias contados — Colin murmurou. — Não faço ideia de que época estamos, mas sinto que o fim está próximo.
Scasya observava a cidade pela janela, com um olhar distante. — Urock não sobreviveu no seu tempo?
Colin balançou a cabeça. — Nunca ouvi falar desse lugar, o que me faz pensar que ele foi arrasado, o que é uma pena. Essa cidade tem um charme único.
— É realmente uma pena… e Claymore? Você sentiu a presença dela?
— Não por aqui, ela deve estar mais a oeste. Nos ermos, onde tudo se consumou. — Ele se jogou na cama e cruzou as mãos atrás da nuca. — Minha esposa me contou como foi. Kerie encarou Morbash nos ermos e o venceu.
Scasya arqueou uma sobrancelha. — Você é casado? As mulheres do seu mundo devem ter baixa autoestima. Mas enfim, nada disso importa agora. Tudo o que vivemos aqui já é passado, o mundo de Antares só está reagindo à nossa presença. Podemos mudar algumas coisas, mas não serão mudanças reais, já que a história verdadeira já está escrita. O que você quer fazer? Seguir para o oeste ou ficar aqui?
Colin sorriu de canto. — Por que não nos divertimos um pouco? Deixemos os Orcs invadirem essa cidade e vamos defendê-la.
Scasya caminhou até a outra cama e se sentou, tirando os sapatos. — Você tem noção de que nada disso é real, certo? Esses garotos provavelmente morreram na batalha e Kerie escapou da cidade com os sobreviventes.
Colin concordou. — Eu sei, mas eu quero ver até onde isso vai dar.
— Você é louco. Vallukna está com as suas amigas, sabia? Você devia correr para salvá-las.
— Leona e Heilee são fortes, elas se viram, não se preocupe.
[…]
O som de passos pesados ecoou na direção das paredes cristalinas, que eram transparentes o suficiente para observar o que acontecia do lado de fora.
Lá dentro, Leona estava deitada em uma cama de pedra, inicialmente parecendo cochilar. No entanto, suas orelhas captaram o som se aproximando, e ela rapidamente se endireitou na cama, sua cauda oscilando de um lado para o outro.
A estrutura que a aprisionava era um cubo mágico, um cárcere feito de um material iridescente que refletia uma miríade de cores. Era um espetáculo hipnotizante e desorientador, que deixaria qualquer observador perplexo.
Além disso, o cubo parecia esconder um segredo intrigante, pois, por dentro, revelava ser maior do que sugeria sua aparência externa.
As paredes eram uma complexa matriz de runas mágicas, que pulsavam com uma luz sutil. Tanto o chão quanto o teto exibiam padrões intrincados que pareciam se mover e se transformar constantemente.
A cela havia sido projetada especificamente para neutralizar qualquer tentativa de uso de magia ou poderes mágicos por parte dos prisioneiros. A energia do cubo suprimia completamente essas habilidades, deixando-os impotentes.
— Ei, cadela! — chamou um homem alto e forte com enormes asas de anjo. — Vallukna quer falar com você, então levanta essa bunda daí!
Leona colocou o dedo na boca e fingiu pensar, com um olhar inocente.
— Hmm… — Ela exibiu seu sorriso largo com caninos a mostra. — Não quero!
Segurando a lança em suas mãos, ele deu um toque na porta do cubo e uma algema mágica cobriu todo antebraço de Leona.
— Vamos, não me faça perder tempo!
O sorriso zombeteiro permaneceu inalterado no rosto de Leona. Com um ágil salto, ela se levantou, caminhando em direção ao guarda.
Uma porta se abriu e Leona a atravessou, adentrando um amplo corredor com paredes que lembravam calcário branco.
Seus olhos perspicazes escrutinaram o cenário, revelando dezenas de outros alados, variando de idosos a crianças.
Ela atravessou uma porta majestosa e entrou em um imenso salão. O salão do trono de Vallukna era grandioso, posicionado no epicentro do palácio. As paredes eram adornadas com afrescos retratando cenas de glória e conquistas daquela nação celestial.
Lustres de cristal suspensos no alto do teto derramavam uma luz dourada sobre o ambiente, iluminando o rico tapete vermelho que se estendia até o trono.
O próprio trono era uma obra-prima de artesanato, esculpido em madeira de ébano e decorado com intrincados detalhes em ouro e prata. Leões alados e dragões estilizados adornavam os braços do trono.
E ali, no majestoso trono, encontrava-se a rainha Alada, uma figura de imponência incomparável.
Ela era uma mulher notavelmente alta, erguendo-se a cerca de 2,50 metros de altura, irradiando uma aura de grandiosidade e poder. Seus cabelos escuros e fluídos caíam em ondas suaves, estendendo-se até os ombros, intercalados por mechas prateadas que reluziam.
Os olhos de Vallukna eram uma profunda piscina azul, tão expressivos quanto o céu estrelado em uma noite serena.
Seu semblante era sereno, mas carregado de determinação feroz.
Ela estava adornada com túnicas elegantes, feitas de seda e veludo, em tons de azul e prata, ostentando delicados detalhes de penas bordadas nas golas e nos punhos.
Uma coroa incrustada com joias cintilantes adornava sua cabeça, refletindo ainda mais o esplendor de sua figura.
Ao seu redor, guarda-costas alados mantinham vigilância, suas majestosas asas recolhidas às costas, prontos para se lançarem em defesa de sua rainha a qualquer momento.
Vallukna sentava-se com uma elegância soberba, com as costas eretas e postura impecável, transmitindo a confiança e a autossuficiência de uma líder indomável.
Logo a frente, Sirela e Heilee também estavam ali, seus semblantes serenos e calmos, mesmo ao ver Leona.
— Pessoal! — Leona correu até elas, ignorando a rainha. — Caramba, já faz quanto tempo? Uma quinzena?
— Não tem tanto tempo — disse Heilee que também estava com os pulsos algemados. — Talvez alguns dias somente.
Bam!
Um dos Alados bateu o cajado de ouro no chão.
— Silêncio! Rainha Vallukna irá se pronunciar.