O Monarca do Céu - Capítulo 342
Terceiro Círculo.
Havia um espaço vazio no plano astral, onde apenas fragmentos minúsculos de ilhas circundavam e onde Gorred estava de pé, flutuando.
Diferente de antes, ele agora tinha um corpo coberto por ossos, um corpo robusto. Seus chifres eram enormes, seus dentes assustadores e seu sorriso afiado. Ele tinha uma cauda de ossos que serpenteava de um lado para o outro.
— Como é bom voltar à minha verdadeira forma — disse em uma voz gutural, olhando para sua mão feita de ossos. — O mais irônico é que tive que usá-la com alguém como você, um maldito erro.
Colin estava em uma ilha com suas companheiras, encarando aquela criatura assustadora.
— Tsc… a mana dele dobrou… todos os atributos devem ter dobrado também…
— Mestre…
Colin apoiou a mão na cabeça de Leona.
— Tá tudo bem, a gente dá um jeito. Heilee, precisarei dos meus dois braços, consegue trazê-lo de volta?
Ela assentiu, tocando o braço decepado de Colin, banhando-o com mana.
“Meu corpo todo está latejando, e minha visão não está tão boa, mas não importa, ainda consigo vencer.”
— Heilee, continue fazendo o possível para retardar o pandoriano, e Leona, já faz um tempo, né? Hora da liberação do terceiro círculo.
Empolgada, as caudas dela iam de um lado para o outro. — Sério?
— Sim, vou usar a mana de Claymore para aumentar a mana de vocês, mas teremos alguns minutos. — Colin forçou um sorriso. — Tô exausto, não vou aguentar muito tempo. Claymore é a fonte, mas a mana dela precisa passar por mim para ir até vocês. Consigo manter isso por alguns minutos, depois vou simplesmente desmaiar.
— A gente consegue! — disse Leona empolgada.
— Sim! — Foi a vez de Heilee. — Confie na gente!
O Errante abriu e fechou o braço regenerado e um sorriso largo floresceu em seus lábios.
Woosh!
A mana de Colin começou a incendiar-se como uma fogueira, espalhando-se rapidamente para suas companheiras.
Enquanto Gorred permanecia imóvel, Leona, por sua vez, flexionou os joelhos e impulsionou-se em um salto audacioso na direção do pandoriano.
Foi nesse instante que sua metamorfose começou.
Seus braços cresceram, seu focinho se alongou, suas caudas se multiplicaram, e uma pelagem escura envolveu todo o seu corpo.
Ossos quebraram e se reconstituíram inúmeras vezes em uma sequência frenética, até que, em questão de segundos, Leona se transformou em uma imponente raposa preta, de olhos vermelhos faiscantes, exibindo uma presença carregada de mana agressiva.
Abrindo sua enorme boca, uma esfera de energia começou a se formar diante dela. A aura vermelha como sangue irradiava raios que serpenteavam em todas as direções, dando à conjuração um aspecto impressionante e ameaçador.
— Não cometerei os mesmos erros da outra vez — esbravejou Gorred. — Começarei eliminando o verdadeiro problema!
CABRUM!
Ele desapareceu em um instante, movendo-se velozmente na direção de Heilee que estava ao lado de Colin. O gesto foi tão rápido que pareceu um piscar de olhos.
Gorred ergueu a mão, preparando um golpe devastador de pressão, mas ele não esperava que Heilee ficasse ali, parada, erguendo as mãos em sua direção.
— Quer disputar suas forças contra as minhas? — bradou o irado Gorred. — Seu corpo vai se tornar pó!
Um arrepio serpenteou a espinha do pandoriano.
“Que sensação é essa?”
Leona surgiu atrás dele em um instante, mas não era apenas a habilidade dos passos fantasmas que o desconcertava; havia algo mais.
Ele sentiu a magia de Heilee sendo ativada na pandoriana.
“A garota… ela usa a habilidade arcana de um Monarca da Terra! Por isso, ela consegue paralisar qualquer um, ela aumenta a gravidade no seu alvo, mas o que ela está fazendo com essa raposa de nove caudas gigante é-”
BAAAAAM!
O impacto do golpe foi monumental, a pata de Leona descendo como se pesasse milhares de toneladas, desabando sobre Gorred.
A devastação se propagou por meio de dezenas de ilhas que colidiam com o corpo do pandoriano, uma dança de destruição avassaladora que alterou a paisagem.
A esfera ainda repousava diante dos lábios de Leona, pronta para ser lançada, e ela disparou.
CABRUUUUUUM!
O som de um majestoso ribombar rasgou o plano astral, indo em direção a Gorred que ainda não havia se recuperado.
“Esse é o meu terceiro círculo, então por que não estou conseguindo fazer nada contra essas formigas?”
WOOSH!
Colin emergiu silenciosamente, materializando-se atrás de Gorred. A aura de mana proveniente de Heilee o envolveu, porém, ao invés de deixá-lo pesado, seu corpo adquiriu uma incrível leveza, intensificando ainda mais a eficácia dos seus passos fantasmas.
Com destreza, Colin empunhava Claymore na forma de saque, imbuindo-a com uma energia elétrica carmesim.
“Ainda não consigo me recuperar, merda! O golpe da raposa estremeceu todo meu corpo!”
CABRUM!
Um corte de raios fulminantes atingiu Gorred nas costas, lançando-o diretamente para o impacto do poder de Leona. O que se desenrolou em seguida foi um clarão tão intenso que, mesmo com a luz ofuscante, nem Sirela, Vallkuna, nem mesmo os fiéis conseguiram desviar o olhar.
CABRUM!
Após o clarão, a escuridão devorou mais uma vez o plano astral. Agora, apenas a luz das estrelas iluminava o cenário.
O corpo de Gorred estava quase obliterado, com partes dele flutuando à deriva no plano astral.
Seus olhos observaram as estrelas, mas sua mente parecia vazia, desprovida de pensamentos. Suas feridas começaram a se curar lentamente, um processo notavelmente mais lento quando comparado a outros ataques que havia sofrido anteriormente.
O corpo recém-curado apresentava uma desproporção perceptível, como se ainda estivesse enfraquecido.
“Droga… estou ficando sem mana.”
BAM!
Colin havia pousado em uma ilha ao lado. Ele estava com o nariz empinado, um sorriso zombeteiro e a espada apoiada em seu ombro.
— Você não parece nada bem — zombou Colin.
Furioso, Gorred juntou as duas mãos e começou a concentrar sua mana.
— Foi um golpe de sorte, só isso! Eu vou matar você-
BAM! BAM! BAM!
Um estrondo retumbante ecoou através do espaço, marcando o início de uma transformação cósmica.
O ambiente se agitou com uma série de impactos impressionantes, enquanto ilhas inteiras se moviam em perfeita sincronia em direção a Gorred, convergindo para formar uma esfera imponente que crescia a cada segundo.
Heilee estava ao longe com as mãos juntas, seu nariz sangrava e seus dentes estavam cerrados.
Colin continuava com seu sorriso de canto, vislumbrando aquela nuvem de poeira se formar.
Assim que os estrondos terminaram, ele transformou Claymore em uma lança e a jogou, cravando naquela redoma de pedra de quase cinquenta metros de diâmetro.
— Acha que ele consegue sair? — indagou Heilee atrás de Colin enquanto limpava o sangue do nariz com o dedão.
— Provavelmente, mas ele está quase acabado. Fique junto de Leona, vou terminar com isso.
— Tá!
Heilee saltou para longe e Colin fez sinal de arma, apontando para a esfera de pedra que chacoalhava.
— O meu sussurro ecoa como um grito, minha voz é como o silêncio, e a tempestade banha o desastre. Quando o dia termina, nasce a noite, e quando a noite termina, começa o fim.
A lança Claymore começou a ser tomada por raios negros que a cada segundo ficavam cada vez mais agressivos. Não demorou até que os raios percorressem toda a esfera.
Com um sorriso, Colin estalou os dedos e usou os passos fantasmas para ir para bem longe.
CABRUM!
Uma explosão deslumbrante e ensurdecedora ecoou pelo espaço, rompendo a barreira entre o possível e o impensável.
Fragmentos das ilhas despedaçadas foram arremessados violentamente em todas as direções, como projéteis descontrolados, em um espetáculo de terror e desastre.
Mais uma vez, o céu astral se iluminou momentaneamente com a luminosidade da destruição, pintando o panorama de caos.
A escuridão então se abateu sobre o plano astral. Uma sombra profunda e impenetrável que envolveu tudo, como se o próprio tecido da realidade estivesse sendo engolido por um abismo interminável.
Onde antes havia luz e movimento, agora reinava um vácuo de obscuridade, uma presença sinistra que parecia ter sugado toda energia e vida.
Teimoso, Gorred ainda estava vivo, havia sobrado apenas metade de seu corpo da cintura para cima, mas seus braços estavam destruídos.
“Não pude fazer absolutamente nada nesta vez, mesmo ativando o meu terceiro círculo… entendi. O garoto não matou o ser da Antares, ele a domou… se soubesse que algo assim poderia guardar tanta mana, teria dito para Safira fazer o mesmo… porcaria… não consigo mais me recuperar, o dano foi muito grande…”
Lentamente, o corpo de Gorred começou a desfazer-se em cinzas.
— Dessa vez eu quase morri — disse Colin com um sorriso ao lado do pandoriano. — Nada mal para um “erro”, né?
Gorred abriu um sorriso convencido.
— Hehe! Pirralho de merda! Se quer vencer seu pai, precisará de bem mais do que mostrou hoje. Não se esqueça, ele é amado pela magia, diferente de você.
Colin assentiu.
— Sabe, agora minha mente clareou. — O sorriso maligno de Colin formou-se em seus lábios. — Você vai morrer, pandoriano, e isso enfraquecerá meu pai. Quando Ultan caiu, eu mal consegui tocá-lo, mas hoje, com sua morte, parte da alma dele será destruída.
Gorred estava quieto o observando.
— Se eu quisesse, poderia submeter todo esse plano, colocá-lo de joelhos, mas pensar em machucar inocentes não me causa nenhuma excitação. Isso muda quando penso no meu pai ou em Drez’gan. — O sorriso de Colin ficou ainda mais sinistro, e ele alisou o cabelo para trás. — Estou indo atrás deles, e quando isso acabar, haverá só um ser governando sobre todos os planos e não será nenhum deles.
Gorred abriu um sorriso de canto.
— Você devia estar morto… maldita aberração…
— Minha mãe deu a vida dela por mim para isso acontecer, e não pretendo desonrá-la perdendo para Coen ou Drez’gan. — Colin virou-se de costas e encarou Gorred por cima dos ombros com aqueles olhos assustadores. — É a vez de eles começarem a se desesperar.
“Foi como previ”, pensou Gorred, sua boca já havia virado cinzas. “Se Safira e a pixie continuassem aqui, elas seriam mortas por ele… hehe, mesmo você não o querendo, o seu pirralho ficou bem forte, não tive sequer a chance de usar minha liberação de terceiro círculo com eficácia… de qualquer forma, isso não é mais problema meu.”
O poderoso Gorred estava morto.
— A gente conseguiu! — Leona em sua forma normal se jogou nos braços dele, o girando. Suas roupas haviam sido destruídas na transformação. — O senhor viu os meus movimentos? Dei tanto soco naquele desgraçado que pensei que fosse abrir um buraco naquela cara horrorosa dele!
— É, você mandou bem, vocês duas, se não fosse por vocês, eu estaria morto. Obrigado, de verdade… — Ele olhou para cima, e Sirela estava lá, em outra ilha, segurando o choro. — Obrigado a você também por acreditar em mim e me deixar voltar para a luta!
Ela começou a limpar as lágrimas.
Heilee deu um soquinho na costela dele.
— O senhor devia descansar agora, o seu estado ainda é crítico!
— Crítico? — brincou. — Aquilo não foi nada!
— Mentiroso! — Ela fez beicinho.
Vallkuna observava aqueles quatro, sentindo o clima agradável de camaradagem.
— Ele conseguiu mesmo… — ela sussurrou. — Ele devorou o devorador…
Os fiéis também não conseguiram conter a emoção. Eles haviam presenciado algo inédito. Sua compreensão sobre o verdadeiro poder invadiu suas mentes.
Aqueles que se chamavam de deuses foram aniquilados pelos invasores, mas aqueles três haviam conseguido superá-los, derrotando alguém que julgavam invencível.
Esse era o poder que se aproximaria de uma divindade?
[…]
No plano da raiz, em um quarto escuro, havia uma mancha de sangue no chão enquanto se ouvia tosses agressivas.
— Merda! Merda! Merda! — Coen se revirava no chão com a mão no peito. — Gorred está morto? Impossível!
Bledha estava no canto com os braços cruzados.
— Avisei que o garoto seria um estorvo, mas o senhor insistiu em mantê-lo vivo. Acabou de se recuperar da luta contra aquele vampiro e agora perdeu o seu pandoriano…
Coen apoiou as costas na parede e abriu-se um sorriso ensanguentado.
— Foi só um contratempo, nada mudou… bem, é o meu filho, afinal…
Pela primeira vez em séculos, Coen não havia previsto aquilo, não considerou a derrota de Gorred, e pagou um preço alto por subestimar o seu filho. Parte de sua alma acabará de ser destruída.
Uma gargalhada alta tomou conta do quarto enquanto Bledha observava o seu mestre.
— Qual a graça?
Ele limpou o canto dos lábios novamente.
— Se Colin conseguiu fazer algo assim, então significa que ele tá cada vez mais parecido comigo. — Apoiando as mãos na parede, ele ergueu-se. — Precisamos acelerar as coisas.