O Perigo nas Sombras - Capítulo 6
Kazuo abriu a tampa da garrafa, levando-a até a boca. O líquido que refrescara sua garganta desceu até a metade do recipiente em poucos instantes.
— Nossa! Isso estava muito bom.
Sachie riu, caminhando ao seu lado. Ela abriu sua garrafa e também bebeu um pouco de água.
Eles estavam próximos de atravessarem a rua, para seguir o caminho até a estação.
— Sachie, o que achou do passeio?
— Eu gostei muito. A Yui-san e a Asuka-san são muito legais. — Sachie olhou para o lado, aproveitando o tempo em que ainda conseguia olhar para o mar, naquele entardecer silencioso.
— Você se divertiu?
— Sim! Eu me diverti muito, muito mesmo. — Sachie trocou o olhar para Kazuo, com uma expressão gentil. — E você, maninho?
— Eu também… Hoje foi um dia bem legal. — Ele olhou para cima, vendo o céu, e as nuvens lentamente tomarem seus rumos.
Valeu a pena ter saído hoje.
Repentinamente, imagens das reportagens sobre o serial killer vieram à mente de Kazuo. Ele olhou em volta, se lembrando da ausência de pedestres, e de Asuka e Yui.
— Vamos, Sachie. Precisamos alcançar logo as duas. — Kazuo acelerou os passos, começando a andar rapidamente.
— A-Ah, tá bom. — Sachie tentou não ficar para trás. — Maninho, você acha que foi uma boa ideia ter falado pra elas irem na frente?
— Eu nem pensei na hora. Agora eu percebi que essa foi uma decisão meio idiota.
Eles atravessaram a rua, deixando para trás a praia e a cada passo se distanciavam dela.
— Já fecharam todas as lojas… — Sachie observou as vitrines opacas, sem visão de dentro, assim que chegou na rua que levava à estação.
— Aqui também está quieto e para…
— Yui-chan! — O longínquo ruído ecoou baixo nos ouvidos de Kazuo, fazendo-o parar.
Sachie olhou para ele, também sem se mover. Os olhos violeta estavam levemente arregalados.
— Sachie, você ouviu isso? — Kazuo tirou o boné, um pouco arrepiado, com seu cabelo negro caindo ao rosto.
— Eu ouvi… Parecia a voz da Asuka-san.
Ele olhou mais à frente, um pouco distante. Com a visão ligeiramente embaçada pela longitude, Kazuo apertou os olhos, vendo algumas silhuetas se movendo.
Kazuo rapidamente puxou sua bolsa para frente, abrindo-a. Ele guardou o boné, e então retirou dois frascos pequenos de alumínio.
— M-Maninho? — Sachie se virou para Kazuo preocupada, vendo-o se mover apressadamente.
— Aqui, pega. — Ele segurou a mão da garota, estendendo-a, então colocou um dos frascos de alumínio, fechando seus dedos. — Isso é um spray de pimenta que eu comprei hoje. — Kazuo falou, tirando a alça da bolsa do ombro.
— O que? Espera. O que você vai fazer? — Sachie estendeu de volta o frasco gelado, sentindo o coração acelerar.
O rapaz se aproximou mais da garota, colocando a bolsa camuflada em seu ombro.
— Sachie, elas podem estar em perigo. Fica com isso e usa se alguém chegar perto de você. — Kazuo segurou os ombros de Sachie, com a voz apressada. — Eu vou na frente, se você ver que a coisa está estranha, fica afastada.
— Eu sei! Mas… — Ela segurou sua camisa.
Kazuo encostou na mão de Sachie, olhando profundamente em seus olhos. — Eu não sei o que está pegando, mas não vou ficar aqui esperando alguém me dizer. — Ele soltou a mão dela da camisa, então se afastou.
— Maninho! — Ela tentou o impedir, mas o rapaz já havia se distanciado, correndo em direção às silhuetas.
…
— Yui-chan! Não! Eu não vou deixar! — Após perder a visão de Yui, o desespero em Asuka aumentou como fogo em contato com álcool. Ela reuniu forças, começando a se levantar.
— Cala essa boca! Vai chamar a atenção de alguém! — O homem com a cabeça raspada se aproximou rapidamente da garota e…
Um estalo ressoou na rua silenciosa, seguido de um gemido agudo. Mechas prateadas voaram ao vento.
O rapaz deu um tapa com toda a força no rosto de Asuka, desequilibrando-a. Ela caiu novamente no chão, batendo os cotovelos. A garota sentiu o lado do rosto em que foi acertada ficando quente, ardendo como se fosse ácido.
— Agora tenho que pensar no que fazer com você.
Que dor… ai… meu rosto…
Os olhos de Asuka se encheram de lágrimas. Ela passou alguns segundos olhando para o vazio, com uma bochecha encostando a calçada gelada, porém, mais uma vez a garota começou a se mover. Asuka encostou os joelhos e as mãos no chão, olhando para baixo, sentindo um lado do rosto queimar. Ela viu outra lágrima cair e molhar a calçada.
O que eu faço? O que eu posso fazer…?
A garota cerrou os punhos, a adrenalina começou a ser bombeada pelo corpo.
Asuka repentinamente se moveu, ela se levantou e correu na direção do homem.
— Hã? Que merda é essa? — Ele colocou as mãos na cintura, olhando-a com desprezo.
A garota chutou para acertar entre as pernas do delinquente, mas ele se esquivou.
— Você não se cansa de lutar, hein. — O homem jogou Asuka no chão, fazendo-a cair sentada.
— Vamos ver se agora você dá um tempo.
Ele pegou um curto embalo e então chutou de frente o rosto da garota, acertando com o solado do tênis. Ela soltou um gemido de dor, voltando ao chão com força.
Asuka bateu a cabeça e as costas na calçada, sentindo uma dor profunda no nariz. Inevitavelmente, mais lágrimas de sofrimento vieram, enquanto ela levava as mãos até o rosto contraído.
— Argh! — A garota apertava os olhos com força, encolhendo as pernas.
Ela os abriu, ainda com as mãos sobre o nariz, assim viu o céu com a visão turva, um pouco atordoada.
Como se fosse um sonho, uma ilusão de sua mente, ela ouviu o grito de uma voz familiar.
— Seu desgraçado!
Um vulto passou rapidamente do seu lado, seus cabelos negros a reconfortaram.
Kazuo passou correndo do lado de Asuka, indo em direção ao delinquente.
— Ei. Quem é você? — Ele o olhou com os mesmos olhos desprezíveis.
Kazuo sem hesitação alguma, socou o rosto do homem, e sem esperá-lo ter alguma reação, socou mais uma vez, porém, quando ia acertar o seu nariz, o rapaz se esquivou, golpeando sua barriga e depois seu rosto.
Kazuo se afastou usando o impacto, cambaleando para trás em seus passos.
Asuka recuperando-se de sua tontura, começou a se sentar, olhando os dois, mas não percebeu o sangue que escorria de seu nariz.
— Você não devia ter se metido nessa. Agora eu vou te amassar todo. — O homem estalou os dedos, escondendo por trás de seu sorriso um ódio.
Ele se aproximou rapidamente, agarrando a gola da camisa de Kazuo, então com a cabeça, golpeou seu nariz. O rapaz de cabelos negros deu mais alguns passos para trás, com a mão no rosto.
Insatisfeito, o homem avançou mais uma vez, mas Kazuo lhe acertou outro soco.
O delinquente deu poucos passos para trás, e então gritou de raiva. Ele puxou uma pequena faca da roupa.
— Você me irritou, seu merda! Agora você vai morrer!
— Não! Kazuo-kun! — Asuka começou a se levantar.
Um calafrio percorreu a espinha de Kazuo. Ao ver a lâmina, ele sentiu uma vulnerabilidade na região do abdômen.
O homem deu um passo em sua direção, com uma expressão insana.
Suprimindo o medo, Kazuo lentamente levou uma mão até o bolso, tocando em um cilindro.
O delinquente gargalhou de uma forma anormal. — A próxima vai ser você, princesinha! — Ele avançou para cima do jovem, preparado para perfurar sua barriga.
— Kazuo-kun! — Asuka gritou.
Kazuo agarrou o cilindro dentro do bolso, retirando o que na verdade era o spray de pimenta. Ele apontou para os olhos vermelhos de ódio do homem, disparando o líquido no último segundo que restava, antes do delinquente tentar cravar a lâmina em sua barriga.
— Argh!!! — O homem andou para trás, soltando a faca para levar as mãos até os olhos.
Kazuo se aproximou, parando um pé na frente. Ele girou o corpo rapidamente, fazendo o vento tremer com sua perna de trás, que desferiu um chute giratório. Seu pé acertou o queixo do homem com potência, lançando-o ao chão.
Asuka, como se não acreditasse, olhava Kazuo de costas, com a boca um pouco aberta.
O jovem se aproximou do homem, abaixando-se e mexendo nele. O delinquente não mostrou resposta, estava com os olhos fechados, com alguns hematomas em torno deles, aparentemente desacordado.
Kazuo se levantou, o sangue escorria um pouco do rosto machucado, como também das mãos, onde tinha os ossos dos dedos doloridos.
Ele se virou rapidamente para trás, olhando Asuka. Ela estava de pé, olhando-o com uma mão ao peito. A camisa branca estava ligeiramente suja, e o cabelo um pouco desgrenhado. Havia uma marca vermelha na pele branca de seu rosto. O rastro de sangue que vinha do nariz chegou ao queixo, caindo e manchando a camisa.
Kazuo não conseguiu suprimir a emoção olhando para aquela cena, olhando o que uma pequena imprudência de sua parte causou para aquela garota inocente. Uma lágrima escorreu de seus olhos.
Ele correu até Asuka e a puxou para si, abraçando-a. Ela arregalou os olhos azuis, sentindo o peito de Kazuo em seu rosto, e em sua nuca, a mão dele, apertando-a contra o corpo. Apesar de tudo, o coração da garota palpitou, alegre. O rapaz aproximou a mão do rosto dela, e então o limpou do sangue. Asuka viu o líquido vermelho na mão de Kazuo, então rapidamente levou os dedos até o nariz, tocando um pouco acima dos lábios.
— O que? Não… — Ela olhou o sangue nos dedos.
Apesar de sentir muita dor no nariz, ela não imaginou que ele estaria sangrando.
— Kazuo-kun, a gente tem que ir atrás da Yui-chan! — Asuka pegou a mão de Kazuo, começando a correr com ele até o beco.
— Asuka! O que aconteceu com ela?! Pra onde ela foi? — Ele acompanhou a corrida, olhando-a preocupado.
— Tinha outra pessoa. Ele pegou a Yui-chan, dizendo que a levaria para esse beco. — O beco do qual Asuka se referia estava logo à frente. — Kazuo-kun, ele vai fazer aquilo com ela! — A garota aumentou a velocidade, puxando Kazuo.
— O que?! Merda!
Eles entraram na viela, correndo de mãos dadas sobre o chão acinzentado. O caminho mal iluminado seguia vários metros à frente, e no final, era notável uma curva.
Próximos de virarem para seguir o caminho que continuava ao lado, eles começaram a escutar um barulho. Era um ruído abafado, e rítmico, havia um intervalo de poucos instantes entre um e outro.
Kazuo e Asuka finalmente fizeram a curva, parando instantaneamente, atordoados com o que viram — e o que viram não era nada próximo do que estavam imaginando.
Yui estava de costas, vagarosamente andando para trás. Um pé tocava o chão, gentilmente, sem produzir ruídos, então o outro pé seguia lentamente em mais um passo para trás. Ela olhava para algo no chão, mais à frente.
O delinquente loiro estava deitado sobre o solo cinzento, olhando para cima, imóvel. Seus olhos miravam o vazio, sem brilho.
Acima do homem, uma máscara branca flutuava sob o capuz escuro e retorcido.
— S-Stabo… — Os lábios de Kazuo começaram a tremer.
O mascarado, coberto por um grande sobretudo opaco e negro, levantava as mãos envolvidas por uma luva cirúrgica preta, então perfurava repetidas vezes o abdômen do homem, com uma faca pontuda.
O sangue transbordava da camisa ensopada, escorrendo e formando uma poça, que encontrava o nariz de Kazuo como um odor de ferrugem.
Ele sentiu Asuka apertando fortemente a sua mão. Ao olhá-la, viu a garota boquiaberta e com olhos assustados, encarando aquela cena sangrenta.
Yui deu mais um passo para trás, apavorada.
O mascarado subitamente parou com as estocadas. Ele lentamente começou a virar a cabeça em sua direção.
— Que pele suave! Eu preciso cortá-la e ver ela se dividir pela minha faca. — O mascarado falava com uma euforia em sua voz, levemente abafada pela máscara.
Yui deixou escapar um curto grito de susto. Ela deu outro passo para trás.
Kazuo arqueou as sobrancelhas, recuperando a coragem.
— Vem! Rápido! — Ele pegou a mão de Yui, se virando e correndo.
Eles fizeram a curva, conseguindo ver a fraca luz que vinha do final da viela.
— Kazuo-kun! — A garota de cabelos rosa ficou surpreendida ao ver Kazuo repentinamente.
— Só corre! — Ele puxou as duas, segurando em suas mãos.
Como se estivessem em câmera lenta, eles corriam, porém, nunca chegavam ao final do beco, sentindo um enorme desconforto em suas costas, como se algo estivesse prestes a pegá-los.
Essa sensação perdurou por um momento, até que a luz alaranjada do sol na calçada trouxe um alívio para os seus corações — o que não durou por muito tempo.
— Sachie! Sachie! — Kazuo gritou, olhando para todos os lados.
Eles haviam saído do beco, contando somente com mais alguns minutos de luz solar.
— Sachie-chan! — Asuka começou a procurar em volta.
— Ela está ali! — Yui conseguiu avistar de longe Sachie correndo para encontrá-los.
A garota se aproximou um pouco ofegante. A bolsa camuflada balançava.
— Maninho! O que aconteceu?! — Sachie parou, vendo os hematomas no rosto de Kazuo. — Asuka-san! — Ela trocara o olhar para Asuka, vendo sua roupa suja e o rastro de sangue embaçado e pouco limpo que vinha de seu nariz.
Apenas neste momento Yui notou o estado de ambos. Vê-los em tais condições fez um arrepio subir até a cabeça, e uma lágrima escorrer de seus olhos.
— Não temos tempo, Sachie! Nós precisamos sair daqui agora!
Kazuo olhou para trás, tentando enxergar algo dentro do beco, porém, ele não viu nada.
— Eu liguei pro tio Kimura. Ele disse que ia me encontrar ali na frente. — Sachie apontou para a direção de onde viera, em um ponto longe de onde estavam.
— Vamos! Rápido! — Kazuo pegou a bolsa camuflada da garota, e começou a correr.
— Ele deve chegar a qualquer momento. — Sachie o acompanhou.
Asuka e Yui correram, seguindo ambos.
No meio do caminho, a garota de cabelos prateados olhou para trás, na direção da viela. Ela viu um contorno escuro, que mesmo de longe, era visível que se tratava do mascarado. Ele se abaixou, pegando sua boina azul, depois se levantou, encarando-a.
Chegando em uma praça, onde os primeiros postes de luz começavam a acender, eles avistaram um carro da polícia dobrar a esquina, um pouco distante.
— É ele.
A viatura se aproximou, e no volante estava Takeshi, de farda policial. Ele parou o veículo próximo da calçada onde os jovens estavam esperando. O homem soltou o cinto, abrindo a porta para sair.
— Kazuo! — Ele se espantou ao ver a condição do rapaz.
— Tio, aquele assassino apareceu! Ele estava em um beco perto daqui. — Kazuo deu um passo à frente, se aproximando do policial.
— O que?! Kazuo, você tem certeza disso?
— Tenho. Ele estava com aquela máscara branca… matando uma pessoa. Elas também viram. — O jovem estendeu o braço na direção das garotas, apontando-as.
— É verdade, senhor… Ele realmente estava… — Yui olhou para baixo.
— Que droga está acontecendo…? — Takeshi colocou uma mão no rosto, segurando a cintura. — Certo, vocês precisam sair daqui. — Ele pegou o rádio preso ao colete, levando para perto de sua boca. — Câmbio, Taka Dois falando do Centro, solicito reforço imediato, Stabo foi avistado por alguns civis em um dos becos aqui da Bravo.
Após alguns chiados emitidos pelo rádio, uma voz com ruídos ao fundo pôde ser ouvida.
— Entendido, Taka Dois, estamos a caminho. — A voz terminou com mais chiados.
Após poucos segundos, outra voz foi emitida.
— Nora Três saindo de Foxtrot, logo chego aí. — Outro chiado encerrou o contato.
— Entendido, levarei os civis daqui. — Takeshi prendeu novamente o rádio ao colete e então olhou para os jovens.
— Alguém quebrou alguma coisa?
— E-Eu acho que não… — Asuka tocou levemente o nariz.
Kazuo se virou para Yui.
— Ele não fez nada com você, não é?
— Eu estou bem, diferente de você que se machucou todo… — Ela estava com os olhos tristes, sentindo uma sensação horrível.
— Estou tranquilo. — Kazuo se virou para frente novamente, com as sobrancelhas arqueadas.
— Depois você precisa ir ao hospital, mas como não há nada urgente aqui, devo levá-los à delegacia. — Takeshi se virou para o carro, caminhando até ele. — Vamos, vamos sair logo daqui. — Ele abriu a porta, esperando os jovens.
— À-À delegacia? — Asuka perguntou, preocupada.
— Fiquem tranquilos, é o procedimento. Eles vão fazer algumas perguntas pra vocês.
— Ah… — Ela olhou para o chão, com as mãos ao peito. A garota começou a sentir medo quando pensou no que seus pais fariam assim que descobrissem de tudo.
Kazuo pousou uma mão em seu ombro.
— Está tudo bem, Asuka, é esperado que eles vão nos interrogar, ainda mais quando o assunto é esse assassino. — Ele caminhou até o carro, abriu a porta e se sentou no banco do carona, então, Takeshi também entrou.
As garotas andaram até as portas de trás, e então as abriram e se sentaram. Sachie ficou no meio, Asuka atrás de Kazuo, e Yui atrás do policial, assim, ele começou a acelerar e a seguir a rua.
Após fazer algumas curvas, Takeshi deu uma olhada para Kazuo, depois voltou o olhar para frente, então mais uma vez ele o olhou.
— Kazuo, como foi que você foi ficar assim?
— Um desgraçado bateu na Asuka, então eu briguei com ele e acabei assim. Na verdade, eram dois caras, mas o segundo… acabou se dando mal.
— Devem ter sido delinquentes, Kazuo. Ainda bem que não aconteceu algo pior com você. Tsc. — As sobrancelhas de Takeshi desceram em uma pequena irritação. — O que é que está acontecendo que a violência só aumenta? Que droga…
Depois de dobrar outra curva, o policial olhou pelo retrovisor a garota de cabelos prateados. Ela observava desanimada a paisagem da cidade, pela janela do seu lado.
— Como você se chama? — Takeshi perguntou, ainda olhando-a.
Asuka se virou para frente, então percebeu o olhar do policial pelo retrovisor.
— H-Horie Asuka.
— Horie-kun, o que aconteceu com seu nariz? Tem um pouco de sangue.
— Ah! — A garota pegou um pequeno lenço branco de sua bolsa e limpou o restante do sangue. — Foi aquele homem… ele me deu um chute bem no rosto…
No momento em que Asuka respondeu, Kazuo cerrou os punhos com força.
— Como é?! — Takeshi olhou de volta para o retrovisor, ligeiramente assustado. — Não está doendo? Você está aí como se nada tivesse acontecido.
A garota juntou as mãos, que tremiam um pouco, ainda se recuperando do choque.
— Sim, está doendo muito. O tapa que ele me deu doeu tanto…
— Nossa, que sujeito ruim. Como ele conseguiu fazer uma coisa dessas com você? — Takeshi virou o volante para fazer outra curva, após sua pergunta retórica.
— A-Asuka-chan… me desculpe… Aconteceu isso tudo com você e… — Yui se virou para Asuka, olhando-a com olhos tristes.
— Não, Yui-chan, você não tem culpa de nada. — A garota de cabelos prateados balançou os braços lentamente, em negação.
— É verdade, Yui… Eu que tenho que me desculpar com vocês, se não fosse por mim, nada disso teria acontecido. — Kazuo olhou pela janela, apertando os punhos.
— Kazuo-kun… — A voz de Asuka soou entristecida.
— Não, Kazuo-kun, você não poderia saber que isso aconteceria. — Yui inclinou um pouco o corpo na direção do jovem.
— Yui, foi idiotice minha. Estava tudo deserto e fazia tempo que eu sabia das coisas que estavam acontecendo na cidade. Estamos há meses escutando, assistindo reportagens, e até tendo nossos colegas assassinados. Se alguma coisa tivesse acontecido com vocês, eu entenderia se seus pais colocassem toda a culpa em mim, e até se começassem a me odiar.
A garota de cabelos rosa esfregou os olhos quando os sentiu se encherem de lágrimas. Ela olhou mais uma vez para Kazuo.
— Está tudo bem, porque você nos salvou. — Yui sorriu gentilmente.
O jovem se virou para ela, olhando-a nos olhos.
— Se o assassino não tivesse aparecido, será que eu ia conseguir te salvar?
Kazuo esperou uma resposta da garota, mas ela olhou para baixo, procurando palavras para dizer, então ele se virou novamente para frente.
Takeshi trocou o olhar da rua para o retrovisor, vendo Yui olhando tristemente para o nada, assim ele mais uma vez mirou a rua.
— Kazuo, ela está tentando te falar que não está brava com você, que está tudo bem e que não te culpa pelo que aconteceu. — Após terminar de falar, o homem avistou a grande delegacia um pouco mais à frente, e os altos prédios desta região começarem a preencher o céu.
Kazuo apertou os olhos, olhando o asfalto passar com velocidade.
— Desculpe, Yui. E obrigado.
Os lábios da garota se transformaram em um sorriso, então, repentinamente ela deu alguns tapinhas no rosto, ficando com uma expressão séria. Espero que o pai e a mãe não fiquem bravos demais.
Takeshi virou o volante, entrando com o veículo na marca de estacionamento, na frente da delegacia, com algumas outras viaturas esparsas no local.
O céu carmesim já havia dado lugar à noite. Os postes refletiam a luz branca em alguns pontos da rua, como também dentro do estacionamento.
Todos saíram do veículo. Seguindo Takeshi, eles caminharam até a porta dupla da delegacia, subindo alguns degraus.
Após todos entrarem no ambiente bem iluminado, vendo alguns policiais fardados andando de um lado para o outro, Takeshi os guiou até alguns bancos, do lado de um escritório. Lá dentro havia um homem, com aproximadamente quarenta anos, sentado, com várias folhas e pastas em cima de uma mesa. Ele escrevia algo, com um cotovelo apoiado na mesa e a mão segurando a cabeça.
Eles se sentaram, um do lado do outro, assim Takeshi entrou na sala, fechando a porta.
Sachie, estando ao seu lado, se virou para Kazuo.
— Maninho… está doendo muito? — Ela estendeu a mão, tocando gentilmente o rosto dele.
Ele sorriu, olhando-a.
— Não, Sachie, agora não está doendo como antes. Você só não pode apertar muito forte.
— Ah… Entendi. — Sachie acariciava a bochecha de Kazuo com os dedos.
— Não se preocupe, eu estou acostumado com isso, lembra? — Ele falava com uma voz gentil.
Os olhos violeta da garota cresceram por um segundo, então ela riu, feliz por seu irmão ter falado sobre o passado depois de tanto tempo, mesmo que superficialmente.
— É verdade! Lá na nossa cidade, quando os garotos da escola implicavam com você, você nunca deixava barato.
Enquanto Kazuo e Sachie conversavam, Yui olhava para as mãos que seguravam a bolsa de couro sobre as pernas.
Asuka abriu sua bolsa retirando o seu celular. Ela ligou a tela, pensando justamente em seus pais, que haviam lhe enviado uma mensagem. Eles me enviaram uma mensagem…? Não tem como eles já saberem do que aconteceu. A garota apertou na notificação, e pela indicação do horário ao lado, ela percebeu que a mensagem havia chegado algumas horas atrás.
O texto se abriu.
“Boa tarde Asuka.
Espero que você esteja aproveitando o dia, porque você ficará um tempo sem poder sair.
Eu e seu pai estamos saindo agora para o aeroporto. Algo aconteceu na sede da empresa em Tokyo, não conseguimos entender direito o que aconteceu, mas é algo muito urgente.
Não sabemos quantos dias ficaremos lá, mas como você já sabe, durante esse tempo está proibida de sair de casa, com exceção se for algo realmente importante.
Eu já expliquei tudo para a Kobayashi, ela ficará no comando das coisas da casa.
Asuka, você pode levar alguma amiga ou amigo para lá se quiser, só não os deixe tocar nos meus lírios, e se for um garoto, não faça nada inadequado.
Agora, por fim, se você tentar nos ligar e não atendermos, é porque já devemos estar no avião.
Me perdoe, Asuka, por mais uma vez sairmos assim e por não darmos a atenção que você merece. Saiba que você é uma filha maravilhosa e que nós te amamos.
Obs.: Não assista muitos filmes de terror à noite, quando está escuro a casa fica assustadora.”
Asuka deixou uma lágrima cair em sua mão branca, segurando o celular sem forças.
Vocês tinham que ter ido agora…? E se algo tivesse acontecido comigo? Onde vocês estariam?! Estariam indo para Tokyo! Sem suspeitarem de nada!
Ela desligou a tela do celular, então levou uma mão até o rosto, secando as lágrimas.
Eu sei, mãe… Eu sou a pessoa que passou mais tempo naquela casa, eu sei que de noite ela fica assustadora.
Asuka, olhando a tela escura do aparelho, sorriu.
Mas eu também amo vocês dois.
Neste momento, todos ouviram passos vindos de dentro da sala. A porta se abriu, saindo Takeshi e o homem que antes já estava dentro do local. Ele vestia uma calça preta, e uma camisa social branca, com as mangas dobradas. Por cima da peça branca, havia um coldre de couro marrom, portando uma pistola.
— Esse é o delegado Hiroshi. — Takeshi apontou para o homem, então sorriu. — Mas nós o chamamos de chefe Hiro.
Hiroshi riu simpaticamente.
— Então, eu preciso dizer a vocês que sei que passaram por um momento difícil, então vamos fazer isso logo para podermos ligar para os seus responsáveis, e assim, todos irem para casa descansar.
Ele olhou para Yui, vendo-a cabisbaixa.
— Quer ser a primeira?
— O que? E-Eu? — Ela olhou para seus amigos, e então se levantou. — Tudo bem…
— Certo, me acompanhe. — Hiroshi continuou o corredor, indo em direção a uma porta.
Yui o seguiu, então ambos entraram na sala que se seguia da tal porta.
— Kazuo, eu vou estar aqui pela delegacia. Quando você e a Sachie estiverem liberados, me procure. — Takeshi se aproximou de Kazuo, falando.
— Tio, não tem nenhuma enfermeira ou enfermeiro aqui? — Ele olhou para o homem.
— Ah, tem o Tanaka.
— Você pode me levar até ele? Eu realmente não quero ter que ir ao hospital.
— Ah, claro, vou pedir pra ele dar uma olhada em você. Vamos. — Takeshi fez um sinal para Kazuo, chamando-o, enquanto retornava para a entrada.
O jovem o seguiu, assim ambos foram para outro lugar.
Vários minutos se passaram em uma espera lenta e reflexiva, até que Yui finalmente saiu da sala, acompanhada do delegado. Ela se aproximou de Asuka e Sachie, segurando sua bolsa com as mãos.
— O delegado Hiroshi ligou para os meus pais, eles já estão vindo me buscar.
— Q-Qual foi a reação deles? — A garota de cabelos prateados perguntou, hesitante.
— Minha mãe tomou um susto… e depois ficou muito preocupada. Eu ouvi meu pai de fundo, ele parecia nervoso. — De onde estava, Yui olhou para a entrada da delegacia, preocupada.
— Vai ficar tudo bem, né? — Asuka se inclinou levemente para a garota, com os olhos tristes.
— Eu espero que sim. Tenho medo de que meu pai queira falar com o Kazuo-kun.
— Eu espero que não coloquem a culpa nele.
— Eu também… Eu vou esperar lá na frente, eles já devem estar chegando. — Yui se virou para Sachie. — Até mais, Sachie-chan.
— Até mais, Yui-san. — A garota respondeu tristemente, olhando-a.
— Até mais, Asuka-chan. — Yui se virou para Asuka.
— Até mais… Quando você conseguir, me liga ou me manda uma mensagem, tá?
— A garota de cabelos prateados se levantou, vendo Yui se afastando.
— Está bem! Eu vou tentar! — Ela falou alto, se virando para trás enquanto ia embora.
Asuka e Sachie se entreolharam, ambas com uma expressão triste.
— Pode ser você agora. — Hiroshi se aproximou, olhando a garota de cabelos negros.
Ela olhou para Asuka, como se dissesse “eu vou lá”, então se levantou indo até o delegado.
Assim, ambos entraram na sala.
— Certo, Kazuo, parece que está tudo bem. Você só vai ficar com o rosto dolorido nos próximos dias, e talvez com umas pequenas manchas roxas. — O enfermeiro terminou de analisar Kazuo, se levantando para voltar ao que estava fazendo.
O jovem se levantou e Takeshi o esperava na porta.
— Obrigado, agora sei que realmente não preciso ir ao hospital. — Kazuo se curvou, então andou para sair da sala.
— De nada!
Kazuo e Takeshi retornaram à entrada da delegacia.
— Certo, você está com dinheiro pra pegar um táxi? — O policial parou de andar, colocando as mãos na cintura.
— Ah, eu tenho dinheiro o suficiente.
— Ótimo. Eu ainda tenho que ficar aqui, sabe? Então não vou poder te levar pra casa. — Takeshi estendeu a mão na direção de Kazuo. — Então, vamos ir mantendo contato?
— Claro. Não deixe a tia Natsuko muito preocupada quando for contar o que aconteceu. — Ele apertou a mão do homem.
— Pode deixar comigo. Até mais, Kazuo.
— Até mais, tio.
Kazuo começou a andar para voltar até o corredor com os bancos.
Chegando lá, viu Asuka deitada por cima das pernas, com um olhar pensativo para o vazio. Ele se aproximou e se sentou ao lado da garota.
— Kazuo-kun…? — Ela se levantou, tocando as costas no encosto do banco, sentando-se ereta. — O que o enfermeiro disse?
— Eu vou ficar bem. Dolorido e talvez com o rosto um pouco roxo, mas bem.
— Ah, isso é ótimo… — Asuka disse, aliviada. — Espera, não é porque você pode ficar com o rosto roxo, é porque não há algo mais grave. — Ela subitamente ficou mais agitada.
Kazuo riu baixo, olhando-a tentar se explicar.
— Eu sei disso… Fica calma.
—Ah… Tá bom. — Asuka ficou um pouco corada, parando de se mexer.
Eles estavam com os corpos virados um para o outro.
— Seu nariz ainda dói?
— Agora só está um pouco dolorido. Você acha que nos próximos dias vai continuar assim?
— Deve continuar incomodando um pouco, acho que seria o normal.
— Ah, entendo…
Asuka desviou o olhar de Kazuo para baixo, juntando as mãos.
— Kazuo-kun…
— O que foi? — Ele a olhava, levemente preocupado.
— Antes… — A garota subiu novamente o olhar até ele, encarando seus olhos escuros. — Naquela hora que você me abraçou, você me apertou muito forte e… bom, eu quero saber se você me abraçou para me consolar, ou… se você fez aquilo porque quis…
Após encará-la nos olhos por alguns segundos, Kazuo se virou um pouco para frente, então olhou para cima, para o teto.
— Eu fiz aquilo porque eu quis… Eu fiquei me sentindo mal depois de ter visto o que aquele cara fez com você. Então, eu te abracei porque eu precisava disso. — Ele trocou o olhar para os olhos azuis de Asuka, eles estavam grandes, arregalados de surpresa.
Ela sentiu o rosto ficar quente, o coração acelerar.
Ainda olhando para Kazuo, a garota sorriu, confiante.
— Kazuo-kun…
— Pode falar.
— Você quer dormir na minha casa?