O Som da Guerra: A Origem - Capítulo 37
Capítulo 37
Na sala de estar da nova casa, os três membros do clã celestial — Gael, Dariel e Ariel — escutavam atentos, sentados em cadeiras simples, enquanto Ezrael permanecia de pé, um olhar sério e distante no rosto. Ele sabia que aquela conversa mudaria tudo entre eles.
— Quero que entendam algo antes de continuarmos essa jornada juntos — começou Ezrael, com a voz calma, mas firme. — O motivo pelo qual me importo tanto com vocês… e o porquê do meu ódio pelos demônios.
Aqueles três guerreiros, forjados na dor e na luta constante, o encaravam em um silêncio que quase parecia palpável. Gael finalmente quebrou a quietude, seu rosto tenso de expectativa.
— Ezrael, o que quer dizer com isso?
Ezrael fechou os olhos por um momento, e quando os abriu, um brilho antigo e quase esquecido emanava de seu olhar.
— Já fui um de vocês, Gael. Eu também fazia parte do clã celestial. Na verdade, fui o Supremo Ancião da Torre Mágica Céu Nublado, no Continente Desabrochar do Espírito Nevado.
A revelação caiu como um relâmpago sobre os três. Dariel e Ariel trocaram olhares incrédulos, incapazes de processar imediatamente o que acabavam de ouvir. Ariel foi o primeiro a balbuciar uma pergunta.
— Mas… Supremo Ancião? Como…?
Ezrael ergueu uma das mãos, pedindo silêncio enquanto continuava.
— Fui traído. Por Natanael, alguém em quem confiava como se fosse meu próprio sangue. Essa traição me levou à morte. Porém, de algum modo, renasci em um mundo mortal, neste corpo jovem antes de retornar para esse mundo divino — Ezrael tocou os próprios cabelos avermelhados, como que para reforçar a estranheza de sua nova aparência. — O corpo humano que agora habitam os resquícios do meu antigo poder e as memórias de quem eu realmente sou.
Gael parecia atônito, lutando para compreender a grandiosidade da confissão de Ezrael. Ele abriu a boca, mas nada saiu. Já Dariel, com olhos brilhando de surpresa e respeito, apenas conseguiu sussurrar:
— Então… é por isso que nos ajuda. É por isso que odeia os demônios…
— Sim — respondeu Ezrael, com um peso na voz. — Eles não só destruíram meu clã, mas também minha própria vida. Prometi que, nesta nova vida, reconstruiria o que perdi e vingaria aqueles que foram traídos e assassinados.
Por um longo momento, todos ficaram em silêncio, absorvendo cada palavra dita. Finalmente, Gael, com uma determinação nova, murmurou:
— Então, lutaremos ao seu lado.
Após uma breve pausa, Ezrael pediu para que alguém entre eles cedessem um pouco de seu Sangue Celestial, para despertar novamente a linhagem do clã celestial dentro do corpo humano de Ezrael, e Ariel, o mais velho entre eles prontamente se voluntariou para fazer lhe entregar seu sangue.
Quando Ezrael pegou a pequena adaga e fez um corte no dedo de Ariel, agradeceu ao amigo com um olhar sincero, que Ariel retribuiu com um sorriso de encorajamento. Sem hesitar, ele bebeu o sangue celestial, sentindo o calor poderoso daquela essência divina atravessar cada fibra de seu ser. Nesse momento, uma notificação ressoou de forma clara em sua mente, vinda do Sistema Nova:
[Sistema Nova] — Deseja o Usuário Ezrael despertar a linhagem do Clã Celestial através do estímulo deste sangue?
Com o coração acelerado e os olhos repletos de determinação, Ezrael confirmou mentalmente. A energia começou a pulsar dentro dele, e, guiado pela antiga técnica do Clã Celestial, ele invocou uma habilidade oculta, ativando a Transição da Linhagem Divina. O Sistema Nova controlava cada etapa, mantendo o equilíbrio e regulando o processo para que a força ancestral não despedaçasse seu corpo humano.
O despertar era intenso e devastador. O calor em seu peito tornou-se insuportável, irradiando por todo o corpo enquanto a energia celestial agia como uma força renovadora, reconfigurando seus músculos, ossos e células. A transformação era uma agonia além das palavras, como se cada nervo estivesse sendo repuxado e cada fibra rasgada para se moldar a algo novo. Seu cabelo avermelhado começou a clarear, fios prateados surgindo, iluminando sua face enquanto a transformação prosseguia. Ezrael mal podia respirar, mas sua determinação o mantinha firme.
Nas costas, um desconforto crescente tornou-se uma dor cortante, e, após horas de agonia, dois pontos de luz começaram a se formar, expandindo e tomando forma. Lentamente, emergiam asas, majestosas e brancas, enquanto cada pena tomava forma com a precisão de uma escultura divina. Ezrael arfou, o suor escorrendo enquanto suportava a dor, mas sua expressão era de puro foco. As asas enfim se abriram, grandes e reluzentes, como uma marca de sua herança celestial finalmente despertada.
Ele se ergueu, arfando de cansaço e dor, mas sentindo, ao mesmo tempo, uma leveza incomparável. Os três guerreiros do clã celestial, que haviam acompanhado o processo com olhares tensos e inspirados, o observaram em reverência. Gael sussurrou com admiração:
— Supremo Ancião… bem-vindo de volta.
Ezrael assentiu, ainda se acostumando com o peso de suas novas asas e com a energia renovada que agora corria em suas veias, como uma promessa de que ele havia retornado para cumprir seu destino.
Ezrael sentia a energia pulsante ao seu redor, uma coroa de relâmpagos dançando em sua cabeça, simbolizando sua linhagem nobre do clã celestial. Aquela imagem poderosa deveria representar seu status como Supremo Ancião, mas para ele, era apenas um lembrete do peso que carregava. Ele olhou para Ariel e os outros, que estavam maravilhados, suas expressões revelando a reverência que sentiam.
— Vocês têm certeza de que eu sou quem pensam que sou? — Ezrael murmurou, sua voz baixa, mas cheia de sinceridade.
Ariel e os demais trocaram olhares, e Ariel respondeu, com a voz firme:
— Sim, você é o Supremo Ancião. Isso é inegável.
No entanto, Ezrael não conseguia sentir orgulho daquela designação. Ele havia reencarnado em um corpo humano, e sua força ainda não era digna do título que um dia carregou. Com um gesto decidido, ele desativou a linhagem celestial, e a coroa de relâmpagos desapareceu, dando lugar a uma forma humana comum. As asas majestosas que se abriram atrás dele se recolheram, tornando-se invisíveis para os outros.
— Por favor, guardem suas palavras de admiração por enquanto — ele pediu, sua expressão séria. — Ainda não sou forte o suficiente para sustentar este título, por isso continuem me chamando apenas de Ezrael. E mais importante, devemos ser discretos. A cidade é mestiça, sim, mas a supremacia ainda pertence aos humanos. Não podemos arriscar que minha verdadeira natureza seja descoberta.
Gael acenou com a cabeça, compreendendo a preocupação do líder.
— Entendemos, Ezrael. Faremos o que for necessário para manter sua identidade em segredo.
Ariel completou, determinado:
— Estamos com você, e faremos o possível para proteger sua nova vida.
Ezrael sentiu um calor no peito ao ouvir as palavras de apoio dos amigos. Eles podiam não entender completamente a profundidade de sua luta interna, mas a lealdade deles o fortalecia. Sabendo que tinha aliados ao seu lado, ele se preparou para o que viria a seguir.
— Vamos nos organizar e planejar o próximo passo. A luta contra os demônios ainda não acabou, e eu preciso da força de vocês.
Com isso, eles se reuniram, dispostos a enfrentar qualquer desafio que aparecesse em seu caminho. A jornada estava apenas começando, e a determinação de Ezrael em se tornar verdadeiramente forte ressoava em cada um deles.
***
Enquanto estava diante de seu mestre, Ezrael mantinha uma postura impecável, escutando atentamente cada palavra de Zephyr Bright. Embora já conhecesse em profundidade os conceitos do cultivo e o manejo da energia mágica — conhecimentos adquiridos em milhares de anos de prática e estudo na sua vida passada —, ele compreendia que demonstrar respeito ao Supremo Ancião era fundamental para manter a confiança e o amparo daquele que o orientava. Além disso, Ezrael sabia que o apoio de Zephyr era crucial para manter sua posição e avançar na Torre Mágica Amanhecer.
Zephyr, sentado em um pedestal de jade rodeado por talismãs e cristais arcanos, falava com serenidade sobre os princípios de fluxo e equilíbrio da energia mágica. Ele pausava entre as explicações, analisando cada reação do discípulo com olhos sábios e penetrantes.
— Você sabe, Ezrael — comentou Zephyr, com o olhar profundo fixo no jovem —, a força de um cultivador não se mede apenas pelo poder que ele pode exercer, mas pela harmonia que mantém dentro de si. Equilíbrio e força são faces da mesma moeda.
Ezrael fez uma breve reverência, respondendo com um tom respeitoso: — Entendo, mestre. Suas palavras são tão profundas quanto a vastidão do mundo.
“Se ele soubesse a profundidade de minhas habilidades… talvez ele enxergasse mais que apenas um discípulo promissor,” pensou Ezrael, ocultando um leve sorriso. Contudo, ele sabia que ser um aluno dedicado era parte do disfarce que escolhera. Afinal, seu passado como Supremo Ancião do Clã Celestial ainda era algo que deveria permanecer nas sombras, ao menos por enquanto.
Assim que deixou a presença do Supremo Ancião e soube que seu mestre mergulharia em uma reclusão prolongada, Ezrael sentiu a janela de oportunidade se abrir diante dele. Com Zephyr comprometido com seu avanço para o Sexto Estágio do Domínio Divindade Soberana, Ezrael teria tempo e liberdade para plantar as sementes de sua própria ambição. Era o momento perfeito para construir a estrutura de um império, uma força que ele poderia moldar desde o início.
“Essa é a hora. Com um mentor em isolamento, estou livre para consolidar minha influência,” pensou Ezrael, já esboçando mentalmente os passos a serem seguidos. Ele visualizou um grupo unificado, uma força de elite que transcenderia os limites comuns e se tornaria uma lenda nas terras divinas. E assim, o nome Aliança Rei Estelar ecoou em sua mente como uma profecia que ele estava destinado a realizar. Sob essa bandeira, ele reuniria guerreiros talentosos, místicos poderosos, cultivadores implacáveis, e os treinaria ao lado de seus companheiros para que todos pudessem aspirar ao ápice do poder: o Domínio Criação do Céu.
— Esse será o princípio de uma nova era — murmurou para si mesmo, já imaginando como transformar seu plano em realidade.
Seu primeiro passo seria reunir recursos, mas não qualquer tipo de riqueza; ele precisaria de artefatos raros, núcleos de mana pura, armas espirituais e contratos de lealdade. Com uma base bem fortificada e lealdades cultivadas de maneira estratégica, a Aliança Rei Estelar seria invencível. Ele pretendia construir uma rede de poder autônoma, que não dependesse dos anciões ou autoridades da Torre Mágica Amanhecer.
Ezrael passou as semanas seguintes mergulhado em cálculos, aquisições silenciosas, e buscas incessantes por aliados potenciais. Ele sondou discretamente as fortalezas vizinhas, observando os cultivadores de promissor talento, alguns dos quais pareciam marcados pelo mesmo desejo por poder e liberdade que ele.