Sirius - Capítulo 59:
Capítulo 59: Alvorada
Após algumas horas, perto dos limites da floresta, o grupo ouviu o cavalgar de cavalos se aproximando. Achar a saída foi bem mais fácil do que o caminhar por dentro anteriormente, afinal, as raízes das árvores já se decompunham junto de suas folhas. O lugar, no entanto, estava um tanto quanto macabro. O decair das plantas da região, revelou dezenas de corpos de animais e humanos espalhados pelo solo.
Entre esses corpos, havia um que ainda estava vivo, embora por um fio. Lisa rapidamente usou seu poder para segurar essa linha de vida que o homem tinha. Tal pessoa possuía uma insígnia de Alferes e estava sendo carregado por Glória. Li, que por algum motivo estava cheio de energia, carregava facilmente os dois homens desacordados entre seus braços.
Quando finalmente saíram da floresta, se depararam com uma frota de duas duzias de cavalos. O que parecia mais imponente, preto e equipado com uma armadura de prata se aproximou. O homem que estava em montado desceu próximo a Jihan, que colocou com suavidade seus dois companheiros desacordados no chão.
Descendo de seu cavalo, o cavaleiro se aproximou, da mesma altura de Li, sua grande armadura parecia torná-lo mais largo, porém, apesar dos olhos afiados atravessando seu capacete, Jihan não foi nem um pouco afetado pela chegada do indivíduo.
— Estou envergonhado — disse o homem numa voz grave e calma. — Não tenho palavras para me expressar nesse momento, por isso vim pessoalmente.
— Desculpe se eu soar grossa, mas quem é você? — perguntou Glória.
— Certo, é melhor que eu me apresente — respondeu. — Meu nome é Victor III, sou o tenente responsável… bem, que deveria ser responsável pela vila de Clarusvallis. Infelizmente, devido à força maior, eu estava ausente do cargo nos últimos meses e deixei um certo alguém como representante.
Victor olhou para trás com um olhar cortante, encarando um dos soldados que ainda estava montado. O homem encolheu-se em cima de sua montaria, mas Li rapidamente reconheceu que era Jacó, o Alferes, que havia os recebido na entrada da cidade.
— Chegou a meu conhecimento também que ele foi desrespeitoso com o líder da equipe de vocês quando chegaram na cidade — continuou Victor. — É conhecimento comum dentro do exército de que líderes de equipe tem patente similar a Tenentes, logo, desrespeito a oficiais de patentes mais altas é punido severamente dentro do exército, e assim será. Por isso, mais uma vez peço desculpas.
Glória levantou sua palma, interrompendo o homem.
— Está tudo bem, nesse momento mais do que desculpas precisamos de ajuda, primeiro com esse homem e em seguida com buscas pela floresta — disse a mulher, apontando para a pessoa que carregava em suas costas.
— Hm… esse é?
— Ele possuía uma insígnia de Alferes em seu peito, então deve conhecê-lo, certo?
Os pelos no braço de Li arrepiaram momentaneamente quando Victor reconheceu o homem. Ele conseguiu sentir certa hostilidade vindo do Tenente, mas tal hostilidade não estava direcionada a eles, muito menos aos soldados atrás dele, porém uma coisa era fato, o sentimento carregava uma força diferente do que a patente dele dizia. Virando-se para os soldados, gritou:
— Todos vocês, realizem uma busca imediata por toda a floresta! Tragam qualquer corpo que não seja animal, achem suas famílias e deem a eles um enterro apropriado!
Os soldados não questionaram, mas hesitaram por um segundo para obedecer a uma ordem que demoraria tanto tempo.
— Eu preciso repetir!?
A voz do Tenente varreu as duas dúzias de cavaleiros, que imediatamente adentraram a floresta, deixando algumas carroças que trouxeram na entrada. Quando se virou de volta para o grupo, a mulher notou uma tatuagem escondida no pescoço de Victor.
— Me desculpem por isso também… — disse ele a Glória, que parecia ser a líder suplente. — A verdade é que eu não tenho muito tempo como tenente, exerci a função por algumas semanas logo antes de ser chamado de volta para casa devido a um problema familiar…
Victor estava visivelmente incomodado com toda aquela situação.
— Mas vocês não devem estar com a mente para ouvir meus problemas… certo.
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Assobiando, o cavalo dele aproximou-se.
— Ela vai levá-los para vila, utilizem uma das carruagens para carregar os feridos e não se preocupem, Estella é mais do que forte o suficiente para carregar todos vocês juntos.
— E quanto a você? — perguntou Li.
— Vou auxiliar na busca, é o mínimo que posso fazer depois de tudo que aconteceu… se vocês puderem tomar conta dele, eu agradeço… seu nome é Jonas… tenho certeza de que seu filho deve estar preocupado… — respondeu Victor, apontando para o Alferes desacordado.
— Jonas… não se preocupe, pode deixá-lo conosco — disse Glória.
— Obrigado, nos encontraremos mais tarde — despediu-se, antes de entrar na floresta.
Após o Tenente se distanciar, Jihan, Glória e Lisa que havia ficado calada amarraram uma das carroças em Estella e colocaram os feridos deitados nela. A sacerdotisa e Li sentaram-se junto aos inconscientes, a garota, exausta depois de tanto usar sua magia, dormiu no ombro de Jihan e a mulher montou no cavalo para guiá-lo.
— Líder, você parecia um pouco cautelosa conversando com aquele Tenente, ele não me parece uma má pessoa apesar de tudo e por mais que tenha uma diferença de patentes, não acho que ele estava em posição de abusar disso… — disse Li.
— Tem outro motivo além da patente para minha postura… você não deve reconhecer já que sabe tão pouco desse mundo, mas com certeza viu a tatuagem no pescoço dele.
Jihan acenou com a cabeça, confirmando.
— Aquilo não é uma simples tatuagem, é um brasão, assim como nós temos um que simboliza nosso pertencimento a Facção de Arcadia.
— Ele é de alguma facção poderosa? — perguntou.
— Não… aquele símbolo é famoso por ser a insígnia do Duque de Wallenstein, uma família colateral do Imperador de Anpýrgio.
— Por que ele está no exército se é de uma família tão poderosa?
— Não pergunte a mim, é incomum alguém tão próximo da realeza virar um militar, visto que você tem que abandonar parte de seus privilégios quando o faz. Talvez o problema na família dele seja relacionado a isso. De qualquer forma, não é de nossa conta… mudando de assunto… — Glória sorriu olhando de canto para Lisa, que dormia babando no ombro de Jihan.
— Ela é uma graça — disse Li. — Eu nunca tive uma irma ou irmão, mas imagino que seria algo parecido com isso.
— Vai ter problemas se deixar ela se apegar tanto a você, o que fara se ela não quiser ir embora?
— Isso é um problema? Líder… ela não pode ficar conosco? Eu a adoto!
TSK
— Jihan, você tem o que 20 anos? Ela é uma adolescente, acha mesmo que pode cuidar de alguém dessa forma?
— Bem, eu vou fazer 21 em 6 semanas e 3 dias e eu tenho vocês para ajudar…
— Li…
— Hahaha, estou brincando… mas… — Jihan adulou a cabeça da menina suavemente. — Deve ter sido difícil crescer sozinha naquela igreja… espero que ela possa se apoiar na gente independente de qualquer coisa…
Glória preferiu não comentar nada mais sobre o assunto.
— Durma você também. Ainda temos a viagem de volta, se prepare para receber uma punição quando chegarmos.
— Punição? Achei que estaria tudo bem se tudo desse certo.
— Regras são regras, Li. Podemos ter saído vivos dessas, mas, na minha honesta opinião, foi pura sorte… imagine se todos decidissem fazer o mesmo que nos, a estrutura da guilda colapsaria com tantas mortes.
— Você tem um ponto… não deve ser tão ruim…
— Ah… — suspirou a mulher. — Não deveria ser, mas Arcádia é muito dura com as normas, não espere nada muito brando… especialmente se aquele homem estiver envolvido…
— Aquele homem?
— Sim… ouvi dizer que ele gerenciou o Testes dos Deuses esse ano, você deve ter visto ele… cabelos pretos longos e uma aura tenebrosamente obscura… Ya Shen, o lorde das correntes. — Um calafrio subiu pela espinha da mulher. — IHH, só de falar o nome dele já me dá arrepios.
— Argh, aquele cara é de Arcádia…
— Viu! Então você entende do que estou falando!
E assim seguiu a conversa até Li pegar no sono. Não demorou muito para alcançarem a vila de Clarusvallis, onde foram rapidamente recebidos por soldados de prontidão, que reconheceram o cavalo do Tenente.
Matheus, Fynn e Jonas foram levados de imediato as instalações médicas da vila localizadas próximas à prefeitura, onde receberiam tratamento adequado por sacerdotes locais. Glória e Lisa se dispuseram a acompanhá-los.
— Glória, você deveria descansar, ficou acordada a viagem inteira… — disse Li.
— Não se preocupe, é meu trabalho como líder substituta, vá buscar o garoto, tenho certeza de que ele vai ficar feliz em saber que o pai está vivo… e mais ainda de vê-lo.
Escutando o pedido, Jihan se separou das duas e foi até a estalagem que ainda estava sendo remendada pela luta de antes. Entregando algumas moedas para o dono do estabelecimento como agradecimento por cuidar da criança, pegou o garoto inconsciente pela magia em seus braços e o levou em direção ao seu pai.