Uma Nova Lenda Surge - Capítulo 1
Quando abro meus olhos pela primeira vez no mundo, percebo que estava rodeado por areias das quais eu desconhecia, sua tonalidade negra lembrava a um ritual, e remetia a um vazio profundo.
Eu estava deitado no centro daquela caverna, gemendo em uma dor profunda em meu olho esquerdo. Quando a dor ameniza, movo-me até a sua saída e sinto os primeiros raios me tocando.
Desde então caminhei, deixando as sombras de meu passado para trás, rumo ao desconhecido, seguindo a voz que me dizia como realizar minhas ambições, meus desejos. Sigo ela até o império espartano, onde eu encontraria a minha gloria e fartura.
Seguindo seus conselhos cheguei até o imperador, lhe prometendo fartura e terras, o convencendo, assim como a voz dizia. Mas o processo percorreu dias, até eu ter a chance de demonstrar a minha capacidade.
Me lançam em uma luta direta contra um de seus generais mais contemplados, mas por um breve instante o meu corpo não era meu, e a cabeça de meu inimigo rolara pelos meus pés.
Apesar da grande perda obtida ao império, não tive penalidades, mas como ato de pena fui lançado na linha de frente, assumindo a posição de meu antecessor.
Enfrentando vários inimigos poderosos seguindo as estratégias ditas pela voz. Sempre que eu partia para os campos de batalha, perdia o controle de meu corpo, como se algo se apossasse dele.
Por causa das causalidades que causei em meio aos massacres sangrentos, recebi o titulo de “emissário da morte”. Muitos começaram a acreditar que eu era um oraculo de Ares, demonstrando grande respeito em minha presença.
Luta após luta, guerra após guerra, dia após dia, eu já estava a me perder duvidando quem eu realmente era, mesmo lutando contra um inimigo invisível, e aquela dor, a maldita dor em meu olho esquerdo, não sabia mais quanto tempo eu aguentaria.
Pensava em pedir uma dispensa do exercito para enfim ter dias de paz, sem ter que rever a dor que pendurava em todas as minhas batalhas.
Após vencermos mais uma luta, dessa vez derrubando Micenas, me encontrei com uma das refugiadas, pela qual me entreguei por completo.
Seu cabelo dourado e pele pálida demonstravam a sua fraqueza, nascida com uma terrível doença, ficou presa dentro de seu lar toda a sua vida, não conhecendo o mundo que nos rodeia.
Foi à chance de ouro que tive, me casei com ela um ano após o fim da guerra, todos os lideres do império se mostraram presentes em nosso casamento, e durante a lua de ouro, que pairava sobre nós, uma pessoa entrou em nosso relacionamento.
Uma pequena menininha de cabelos dourados como sua mãe e olhos esmeraldas parecidos com os meus, seu nome era uma homenagem a antiga deusa da Lua, Selene.
No entanto toda a paz dura pouco, Olímpia era a próxima. Segui para a linha de frente sobre as ordens do imperador, após o aniversário de seis anos da minha pequena filha.
Assumo o posto no qual tinham me designado, e começo a planejar o próximo embate em minha mente, enquanto a voz me aconselhava e mostrava meus erros.
Faltando dois dias para partirmos do acampamento, uma grande tempestade de areia nos atingiu, eu permanecia na barraca principal armando os últimos detalhes para a grande guerra.
Mas a voz não falava comigo naquele dia, algo estava ocorrendo, algo que eu me lembraria para o resto de minha vida.
— Meu senhor! — Meus pensamentos são interrompidos com um dos soldados entrando aos prantos na barraca. — Avistamos uma grande movimentação ao norte!
— Dê-me mais detalhes.
— Soldados! Dezenas deles marcham em nossa direção!
— Quanto tempo é estipulado para a sua chegada?
— Acreditamos que ainda nesta noite!
— Certo, prepare todos os nossos homens no portão norte, acabaremos com eles nesta noite.
— Sim, senhor! — O homem parte me deixando com os meus pensamentos.
— No fim eles resolveram agir antes… O que eu devo fazer?
Pego meu gládio, o embainhando calmamente, tentando rever a situação, estava com medo, nunca tinha matado ninguém desde que nasci, mas já presenciei muitas mortes insignificantes em minha jornada.
Pela primeira vez estava só, sabia como deter o avanço do exercito inimigo, mas não tinha ideia de como segurar uma arma.
Caminho até o portão norte, onde os soldados permaneciam em posição esperando as minhas ordens, segurando suas espadas, escudos e lanças.
— Estejam prontos para morrerem! Nenhum homem sairá desse campo sem morrer e renascer mais forte! — Inicio falando meu grito de guerra. — Formem uma muralha quem carrega escudos! Armem seus arcos quem carrega espadas! Perfurem o coração deles e morram!
— Sim, Senhor!
Todos foram para as suas devidas posições, aqueles que tinham os escudos em mãos se colocaram a frente esperando o inimigo se aproximar, os que tinham suas espadas foram para os depósitos se armar com arcos e flechas.
A hora estava chegando, e todos permaneciam em suas devidas posições, apenas esperando o avanço do exercito.
— Se vencermos essa, pagarei bebidas e mulheres para todos! — Falo momentos antes do confronto.
As flechas voaram sobre nossos escudos derrubando a cavalaria inimiga e a nossa muralha bloqueou a passagem de muitos.
Mas algo estava errado… Não só a tempestade tinha acabado como também o relampejar estourava areia para todos os lados. Até que o culpado se revelou diante de meus olhos.
Um velho homem estourava grandes lanças de raio em nosso campo de batalha, escondido pelas nuvens, que faziam parte de sua barba, ele lançava um olhar mutuo de ódio e pena para nós.
Meus homens foram caindo, um após o outro até que sobrou apenas eu e o exercito inimigo que me rodeavam prontos para me matar.
— Vejo que ainda se esconde mesmo em uma situação de vida ou morte! — Um dos homens falou se aproximando de mim.
— … — Permaneço em silencio esperando a morte iminente.
— Não esperávamos tal ato de covardia, vindo do senhor cavaleiro negro! — O homem falava em um tom irônico, como se conversasse com outro ser.
— Basta! — O homem nos céu fala como se fosse um trovão. — Não atormente a mente de um homem justo sem revelar a ele a verdade!
— Sim! Meu Senhor!
O soldado se aproxima de mim preparando a lança em sua mão para dar o golpe final, pelo menos era o que eu acreditava… Sua lança perfurou meu olho direito, até se ouvir um estouro, quando ele arrancou sua lança levou meu olho junto dela.
Uma grande dor me atingiu e junto dela eu soltei um alto berro ensurdecedor. Levo as minhas mãos para o buraco deixando, sentindo o calor de meu sangue escorrendo entre os dedos.
— Vamos abra o seu olho! Veja o que é escondido de você!
Abro calmamente o meu olho esquerdo e me espanto, os soldados que me encaravam não eram humanos, mas sim seres iluminados com grandes asas plumadas sobre suas costas ou bestas imundas de grandes chifres e uma espessa camada de pelos amarronzados.
Aquele que havia me retirado o olho, vestia uma armadura dourada que refletia a menor fagulha luminosa que capita-se, e em suas costas um grande par de asas de plumagens brancas.
— Observe atentamente! Pois essa será a ultima visão que você terá antes de ir para o Tártaro!
— Sobre o pecado cometido de se unir a um espirito maligno, você é sentenciado à morte eterna, pelas leis do céu!
O velho homem estende um de seus grandes dedos em minha direção, e dele a ultima coisa que eu pude presenciar foi uma forte luz, antes de ser lançado a uma escuridão eterna…
Não sabia quanto tempo já havia se passado em meio a aquele mar obscuro, a minha mente estava a se despedaçar, eu lembrava de coisas que tinha certeza que não existiam, lembrava de pessoas que nunca tinha visto.
Será que eu realmente era eu?
— Escolha! — Uma voz começa a ressoar em minha cabeça, e uma dor insuportável começa a me abalar. — Escolha! Nunca ter existido, assim salvando seu povo da destruição ou permitir que a história siga?
— Q-quem é você? — Falo com dificuldade, enquanto a dor me derrubava aos poucos.
— Escolha! — Ela repetia a mesma frase, em meio aquele vazio eterno. — Escolha! Escolha!
— Sa-salve o meu povo! Mesmo que isso me custe à vida! — Grito com todas as forças que possuía.
— Então, que assim seja! — A dor fica mais intensa, até eu não aguentar mais e começar a perder a consciência.
Ao recobra-la, abro os olhos e noto que estou em um salão circular que aparentava ser feito de ouro, com seis pilastras tendo serpentes entalhadas nelas.
Um quadro estava pendurado entre duas pilastras, nele havia a imagem de uma bela mulher, mas a sua pele possuía uma tonalidade fria, como se estivesse morta, com um capuz de tonalidade negra, que cobria a sua cabeça deixando seus logos cabelos brancos passarem, segurando uma foice, com detalhes de rosas em sua saliência central, com a mão direita, e com a esquerda, ela segurava uma taça de ouro, que provavelmente possuía vinho em seu interior. Do lado oposto ao quadro tinha uma porta que se encontrava entre duas das pilastras.
— Onde, que eu estou?! — Falo ao me levantar em um pulo reconhecendo o local, mas não sabendo da onde.
— Você finalmente voltou! — Uma mulher fala ao abrir as portas daquele salão de forma abrupta e rápida, ela era a pessoa do quadro.
— Q-quem é você?! — Olho para ela atormentado.
— Sou eu, Morte! Não se lembra de mim? — Ela falava como se fossemos pessoas próximas uma da outra, mas por mais que eu tentasse me lembrar, não conseguia.
— De alguma forma eu te conheço, mas não sei quem é você. — Acabo por falar a verdade, eu não sabia como agir, tinha que ser cauteloso, mas mentiras não me ajudariam.
— Hum… Tudo bem, alguma hora vai se lembrar! — Ela sorri, por mais que não existissem motivos para tal ato. — Venha, vamos conversar enquanto comemos. Você deve estar faminto depois de tanto tempo.
Não podia negar, minha barriga doía, como se não comece nada durante anos. Ao sairmos daquela sala, passamos na frente de um espelho que em sua moldura podia-se ver o ouro do qual ela tinha sido feita, o que trazia uma impressão de riqueza e nobreza.
Paro para me observar. Minha aparência estava diferente, tinha ficado mais jovem, meu cabelo era preto e curto, vestia um sobretudo preto com uma camisa da mesma cor por baixo e os meus olhos eram vermelhos, e a íris do esquerdo tinha o formato de um losango e ele não possuía a pupila.
— Aaah…! — Eu grito assustado.
— O que foi?! — Ela me olha com dúvida.
— Eu pareço ter uns dezesseis anos, e o meu olho esquerdo… Ele… Ele… — Ela me olha com certa duvida.
— Você sempre teve essa aparência, não tem motivos para se assustar.
— Ah! É mesmo, e-eu sempre fui assim. — Solto uma risadinha, disfarçando qualquer besteira que tenha cometido.
— Certo… — Ela me olha desconfiada.
Nós continuamos a andar, até chegar a uma porta feita de madeira com vários símbolos entalhados nela, eu não conseguia entender o significado deles, eram círculos e estrelas, mas entre eles riscos que aparentavam serem palavras.
Ao entrar na sala me deparo com uma grande mesa de madeira, em cima uma grande variedade de pratos, que em sua maioria eu desconhecia.
— Então, queria falar sobre o quê? — Pergunto um pouco desleixado, após me sentar.
— Sobre nada demais, mas parece que de alguma forma a sua memória foi apagada, talvez tenham feito isso para você nem saber quem é. — Ela me olhava com um ar de preocupação. — Vamos, não tenha vergonha pode comer a vontade.
Eu começo a me servir e a comer tudo quanto era tipo de comida, até ficar satisfeito.
— Ah! Não aguento mais! — Ela ficou me olhando com um sorriso caloroso no seu rosto, enquanto eu comia.
— Que tal nós passearmos pelo jardim enquanto fazemos a digestão? — Ela não havia sequer tocado nos talheres.
— Pode ser… — Saímos da sala e começamos a caminhar indo na direção da parte central do terreno, onde era um campo aberto.
Passamos um tempo caminhando sem falar nada, a situação me deixava desconfortável, afinal, o que ela queria, e o que estava ocorrendo?
Depois de certo tempo, um objeto metálico desse a terra, ele era do tamanho de uma casa pequena, era surpreendente, como algo do tipo podia voar.
— Eles chegaram. — Ela olha para o objeto com raiva.
— Quem?! — Pergunto curioso.
O objeto metálico abre sua base, demonstrando parte de seu interior, e dele desce uma menina que aparentava ter uns dezessete anos, trajando um longo vestido branco com detalhes em prata em suas laterais, ele chegava até um pouco abaixo de seus joelhos, em sua cabeça uma tiara metálica, que remetia a um elmo, prendia seu cabelo loiro, que sequer chegava aos ombros.
— Kardurins! Você vem conosco! — Ela me olha fixamente.
— Quem é esse tal de Kardu… — Ela vem em minha direção e tampa minha boca antes que pudesse terminar a frase.
— Vamos, não temos muito tempo! — Ela me empurra até a entrarmos na nave, segurando meu braço direito em minhas costas.
— Venha me visitar quando quiser! Estarei esperando! — Fala a Morte enquanto a porta do objeto metálico se fechava.
— Podem decolar! — Grita a menina enquanto me segura.