Uma Nova Lenda Surge - Capítulo 6
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- Capítulo 6 - Lembranças de um Passado Próximo, Mas Distante
Após correr em direção aos jardins externos, me encontro novamente com a Catrina, que observava o grande canteiro de flores que estavam a desabrochar sobre o luar, enquanto permanecia debruçada sobre o pequeno muro de pedras talhadas que separava um pequeno corredor que ia para o jardim do castelo.
— Porque você veio atrás de mim…? — Ela fala soluçando, mas mais calma.
— Pois sendo verdade ou não a história que você me contou, eu deveria fazer o que eu faria no passado…
— Você acha que eu estou mentindo?! — Ela grita se levantando e apoiando o seu corpo contra o muro.
— Me desculpe, mas as coisas não estão muito certas para mim ainda… Pois nada foi esclarecido desde que cheguei…
— Eu… Eu sei que o que você está dizendo é verdade, pois quando eu lhe conheci presenciei coisas que antes eu acreditava ser impossíveis… E na mesma época você me disse algo que me ajudou a evoluir.
— O que eu falei?
— “Nada é impossível, basta acreditar”, essa frase começou a fazer mais sentido anos depois, quando eu pude tornar possível o que era impossível.
— Faz sentido eu ter dito isso, obrigado Catrina, por me lembrar disso.
— Fico feliz por poder lhe ajudar. — Ela leva as mãos na direção do peito.
— Catrina, eu sei que pode ser indelicado de minha parte lhe pedir isso, mas poderia me contar o resto daquela história?
— Sim… Eu gostaria que você se lembrasse de tudo, mas eu sei que não ocorrera tão cedo… Agora que estou vendo, essa noite me lembra do dia em que você prometeu sempre estar comigo…
“— Me desculpe por ter que fazer você ver essa cena pequenina… — O homem que se apresentou como Kardurins fala sorrindo gentilmente. — Eu não deveria fazer isso, mas não posso te deixar aqui para morrer…
Logo em seguida ele me pega com os braços e me leve aos saltos, entre as arvores até um pequeno castelo que ainda estava sendo erguido, dentro dele tinha varias mesas de madeira esparramadas e vários homens e mulheres conversando, cantando, rindo e bebendo.
— Pessoal! — Kardurins grita. — Essa pequenina do meu lado se chama Catrina, eu a resgatei durante a minha exploração das redondezas e acabei por decidir acolher ela!
— Mas general… — Ele interrompe, uma jovem que aparentava ter alguns anos mais do que eu.
— Espero que todos a tratem como tratam os seus iguais!
— Sim! — Todos o respondem ao mesmo tempo.
A dona da taberna se aproxima de mim com uma tigela de caldo de carne, não era algo que eu comia quando estava no palácio, mas eu estava faminta e todos ali pareciam tão gentis e alegres, apesar do que ocorria no mundo.
— Você está se sentindo melhor pequenina? — O Kardurins fala ao se aproximar com um caneco de madeira em mãos.
— S-sim… — Responde ele no impulso.
— Eu sei que você está vivenciando uma coisa difícil, por causa do ocorrido de hoje, mas você deve olhar os seus próximos passos e segui-los, um após o outro. — Ele sorri gentilmente enquanto me encara. — Mas por agora, coma e depois vá tomar um banho e vista roupas limpas, eu já pedi para a Yuketria resolver isso para você.
— O-obrigada.
— Não precisa me agradecer, todos aqui são parecidos com você e todos possuem respeito mutuo uns pelos outros, espero que você também se de bem com os demais.
Após terminar de comer a Yuketria, a dona da taverna, me leva para uma área que possuía um lago de águas quentes e límpidas, nas quais eu poderia mergulhar e relaxar. Ela havia deixado acima de uma pedra roupas novas parecidas com as que as mulheres que festejavam vestiam, o tecido era macio e quentinho, apesar de aparentarem serem vestimentas pesadas, eram leves como plumas.
Após retornar para a entrada da pousada me deparo com o Kardurins sozinho bebendo em sua caneca. Os seus olhos que antes brilhavam como chamas, agora pareciam estar vazios, como se ele estivesse morto…
— Kardurins…
— Hum… – Ele se vira na minha direção. — Ainda está acordada pequenina?
— Eu ainda não fui dormir…
— Bom… Eu me esqueci de pedir para que mostrem o seu quarto, mas aproveitando que você está aqui, venha comigo! — A chuva já tinha parado, e eu o sigo até o topo de uma colina, perto da construção, acima dela pude ver o reino de Tundere no horizonte. — Você veio de lá? — Ele aponta na direção de Tundere.
— S-sim!
— Como eu havia imaginado. — Ele se virá para mim com um olhar sério. — Ter você conosco vai ser mais difícil do que eu pensei. — Ele olha para a lua, que brilhava em um intenso azul entre nós.
— Eu sou a princesa na verdade…
— Eu já sabia disso e essa que será a parte mais difícil…
— Mas, por quê?
— Vocês mortais são seres arrogantes, que sempre pensam em si próprios, e que apenas seguem ordens pré-definidas, como se fosse algo normal, como se fosse tudo o que vocês possuem! Vocês se prendem demais aos seus sentimentos e não seguem a busca pela “Verdade” — Ele falava animado enquanto sorria, olhando a lua que brilhava sobre nós.
— Vocês não são humanos?
— Isso mesmo, nós… Para ser mais exato os demais que estavam lá dentro, menos a Yuketria, são trevanianos, seres que em sua vida anterior foram lendas vivas.
— E você?
— Eu sou um dos sete seres supremos, para ser mais exato eu sou o representante da preguiça, o Kardurins, somos basicamente os criadores dessas terras, pode ser um pouco difícil de entender, mas somos o que os humanos chamam de deuses.
— “Sete seres supremos”? Deuses? É meio difícil de acreditar, mas acredito em você.
— Isso facilita as coisas, obrigado…
— Kardurins… Por que seu olho esquerdo é assim?
— Eu… Tem coisas que é melhor você não saber sobre o mundo, isso poderá lhe salvar algum dia…
— Certo…
— Vamos dormir agora, como você não tem quarto vou deixar você ficar com o meu.
Nós retornamos para a pousada e seguimos para dentro das ruinas que possuía um acampamento improvisado, com varias tendas onde muitos já dormiam.
— Essa é a minha, pode ficar à vontade, sei que você não deve estar acostumada a dormir no chão, mas espero que não se incomode pelos próximos dias. Eu vou voltar para a colina, então não se preocupe.
— Você não irá dormir?
— Eu não preciso, durma bem pequenina…
Ele dizia a mesma coisa todos os dias, desde que fui acolhida por eles, esse percurso ocorreu durante longos sete anos, fui criada por eles durante esse tempo. Quando os outros vieram eu pude conhecê-los, fiz amizade com uma menina que tem a minha idade, que assim como eu foi salva pelo Kardurins, que jurou fidelidade a mim.
Até que chegou a hora do meu retorno para Tundere, anos após Zailor ter o conquistado, os trevanianos me ajudaram a salvar o meu reino das mãos de meu tio, em um único dia estávamos a estender as bandeiras com o brasão da minha família. Com o termino da guerra, todos poderiam retornar a ser felizes como eram antes, mas isso só ocorre em histórias para crianças…
Naquela noite o Kardurins havia me chamado para os jardins do castelo, e eu sentia em meu peito que o assunto que ele queria tratar, era algo que eu não desejava ouvir.
— Agora é a sua vez Catrina, você deve escrever o resto de sua historia com as próprias mãos, e logo você se tornara a rainha desse povo, e eu não estarei mais aqui para te ajudar…
— O que?! Por quê?! Você prometeu ficar comigo para sempre! — Lagrimas começam a escorrer pelo meu rosto, junto da minha visão que fica embaçada.
— Eu sei o que falei, mas tem horas que por mais que você não queira, terá que deixar os outros irem. Catrina, eu lhe treinei durante todos esses anos e te ajudei a reconstruir o seu reino, para que o dia que eu não pudesse estar aqui para te proteger, você consiga se proteger. E… — Ele faz uma pequena pausa e logo prossegue. — Eu quero que você fique com isso, e só o abra quando você fizer dezoito anos. — Era um envelope lacrado com o selo do antigo rei, o meu pai.
— Mas para onde você vai?!
— Não sei, mas é bem distante daqui.
— E-e quando você volta?!
— Não sei dizer, mas talvez não demore.
— E-eu não quero te perder também, já não basta os meus pais que foram assassinados, na mesma época que você me acolheu! — Uma chama preenche o meu peito, mas não era raiva, era o medo de ficar sozinha novamente…
— Você não irá me perder, pois eu sempre estarei aqui. — Ele coloca a mão sobre a minha cabeça, como se afagasse ela. — E não se esqueça, nada é impossível, basta acreditar. — Seu olhar, que normalmente demonstrava a sua força e fúria, hoje ele estava acolhedor, como o abraço de uma mãe.
— Você promete que vai voltar? — O encaro em seus profundos olhos vermelhos.
— Eu prometo.
— Então estarei te esperando… — Eu seco as lagrimas e sorrio para ele.
No dia seguinte ele já havia partido, sem deixar rastros de sua existência ali, a não ser as lembranças que todos tinham dele e uma promessa, de que um dia estaríamos juntos de volta.”