Vigilante Eterno - Capítulo 20
— Eu não concordo com esse plano — disse o irmão imbecil. — E se eles não cumprirem com o acordo e capturarem você, ou… ou te matarem.
— Eles não seriam estúpidos a esse ponto, mas por via das dúvidas, o irmão do meio vai ficar junto comigo, escondido nas copas das árvores, para caso eles tentem fazer alguma gracinha. — O irmão do meio, a qual o mais velho se referia, era o dorminhoco, que parecia nem estar escutando a conversa.
— Não sei, irmão, não parece seguro — disse o grandalhão, ainda com rastros de sua raiva descontrolada em sua voz.
— É a nossa única possibilidade. E no fim das contas, sairemos ganhando.
— Como assim? — perguntou o irmão do meio com sua voz arrastada e sempre sonolenta. — Como sairemos ganhando com isso.
— A nossa missão, desde o princípio, era apenas espotar o inimigo, voltar para o ninho e avisar o Fang. Se tudo ocorrer bem com a troca, conseguiremos cumprir com a missão sem baixas — explicou o irmão mais velho. O irmão graúdo e bobo concordaram.
— Mas agora eles também sabem de nossa existência. E se a missão deles for igual à nossa? E se depois de deixarmos eles irem embora, eles avisarem aos seus comandantes e voltarem com um exército para nos exterminar? — indagou o irmão do meio, contestando o irmão mais velho.
— Caso isso ocorra, estaremos preparados, mais do que os humanos eu posso garantir. Fomos trainados nossa vida toda para esse momento — disse o líder com convicção, calando o seu irmão de uma vez por todas.
Maycon está postado no convés, com o resto dos vigilantes apenas a alguns metros atrás dele. Ele segurava com uma das mãos o braço do híbrido prisioneiro.
— Tem certeza que isso vai funcionar? — cochichou Vidal para Aline, que estava bem ao seu lado.
— Tenho. Caso eles escapem, a missão será comprometida e o que fizemos até agora não valera de nada — respondeu a jovem vigilante.
O líder do grupo de batedores apareceu em meio a copa de uma árvore. Possuia uma aparência semelhante ao do irmão mais novo, apenas mais esguio e alto, além do óculos com lentes fundo de garrafa.
— É um mais feio que o outro — disse Maycon, em um tom de desdem, atiçando ainda mais a fúria do prisioneiro, que se debateu em protesto. — É melhor você acalmar esse seu amiguinho aqui caso queira que as coisas ocorram bem.
— Controle-se, irmão, isso acabara logo — disse o líder hibrido.
— Irmãos?! — falou Poti supresso. — Isso explica muita coisa.
O primata desceu em direção ao barco, posando-se de frente aos vigilantes. Ele estava do jeito que havia prometido, desarmado e sozinho, ou pelo menos parecia estar sozinho.
— Certo, já cumpri com a minha parte. Podem soltar o meu irmão — exigiu o hibrido, de pé a poucos metros de Maycon, que o encarava com uma expressão fechada.
Maycon continuou encarando o líder do grupo de híbridos por longos segundos, sem trocar ao menos uma única palavra. O silêncio era agoniante.
— O que está esperando, humano? — perguntou o hibrido, sentido uma revolta crescente.
— Vamos, Maycon, ele já cumpriu com suas palavras — disse Poti, logo atrás de seu parceiro vigilante.
Era impossível saber o que se passava na mente de Maycon naquele momento, a sua face não exprimia nenhum sentimento, permanecendo estática por todo aquele período. Ele então virou a cabeça para trás, encarando a irmã, que estava de olhos fechados, em profunda concentração.
Após abrir os olhos, Aline apontou a mão em direção ao irmão, com apenas o dedo indicador levantado.
— Seu mentiroso filho da puta — disse Maycon, puxando o prisioneiro para perto de si. — Você disse que estaria sozinho, não disse? Então por que um dos seus lacaios continua aqui?
O hibrido ficou em choque. “Como eles descobriram?” pensou ele, cerrando os dentes logo em seguida. Agora, não só a liberdade do seu irmão estava em jogo, mas como a vida dele também.
— O que levou a vocês acharem isso? — perguntou o hibrido, tentando disfarçar o nervosismo.
— Nós não achamos, temos certeza que você não está sozinho — disse Aline, confrontando o inimigo.
“Então é a garota que descobriu, mas como? Bem que achei estranho ela ter ficado com os olhos fechado por tanto tempo. Ela deve ter alguma habilidade sobre-humana, afinal de contas, ela é uma vigilante.” pensou o hibrido, voltando sua atenção ao mato denso ao seu redor, em uma tentativa de achar algo que pudesse revelar a habilidade da jovem.
— Ei, não nos ignore — berrou Aline ao ver o hibrido girar a cabeça, olhando para tudo ao redor do barco atrás de alguma pista.
“Estranho, não encontro nada… será quê?” pensou o hibrido, segundos antes de voltar sua atenção para o céu, vendo uma harpia sobrevoar a embarcação.
— Essa harpia… — disse o hibrido, com a voz tremula por conta da raiva que sentia. — ela não estava aqui há alguns minutos.
— Não entendi, o que a harpia tem a ver com a sua quebra do acordo? — perguntou Maycon, suando frio. Ele sabia que o plano de Aline havia sido descoberto.
— Não se faça de idiota! — berrou o primata, liberando toda a raiva contida até então. — Animais comuns não veem até essa região a menos que eles estejam sobre o controle de alguém, que nesse caso seria essa mulher. — O hibrido apontou para Aline, que ficou espantada com a rapidez que o inimigo havia descoberto o plano. — Eu quebrei o acordo, mas vocês também quebraram ao usar a harpia para encontrar o meu aliado escondido, então acredito que estejamos quites
— Quites? Tsc! — Maycon chiou de desdem. — Você deve achar que somos realmente estúpidos, não é? Não ira rolar nenhuma troca até que aquele seu amiguinho escondido no meio do mato suma daqui.
O líder hibrido não pode aguentar. A raiva que até aquele momento estava contida dentro de seu interior, agora havia escapado abruptamente. Mesmo depois de tantos anos de treinamento, a sua primeira missão séria havia sido um verdadeiro fracasso e para piorar tudo, o seu irmão caçula estava com a vida por um fio.
— Nem eu, nem ninguém vai a lugar nenhum até o meu irmão for liberto! — berrou o hibrido com todas as suas forças, causando um espanto a todos, incluindo o seu irmão mais novo.
— Irmão… me ajuda — cochichou o prisioneiro.
— Calado! — berro Maycon, chacoalhando o prisioneiro.
— Não ouse machucá-lo, humano! — disse o líder dos híbridos em protesto.
— Isso está saindo do controle — cochichou Vidal, que até aquele momento observava a cena com tensão.
— Não, isso já saiu do controle a muito tempo — disse Poti, pondo-se em posição de combate.
O outro membro do grupo de primatas, o irmão do meio, percebeu todo o alvoroço lá em baixo. Ele tinha sido instruído pelo seu irmão a apenas agir caso alguém da equipe fosse atacado, mas estava claro que era apenas questão de tempo até o pior acontecer. Ele pós os dedos em seus lábios e com todo o ar acumulado em seus pulmões, ele produziu um assobio alto o suficiente para ser ouvido pelos seus irmãos a mais de 100 metros de distância.
O assobio pegou todos desprevenidos, incluído Maycon, que voltou a sua atenção para o som, abrindo uma brecha crucial para o híbrido caçula.
— Ah, merda! — berrou Maycon em agonia.
A atenção do resto do grupo de vigilantes voltou até os dois inimigos a bordo da embarcação. O prisioneiro havia dado uma mordida na mão que segurava seu braço direito, arrancando um dedo da mão de Maycon. Agora livre, o hibrido caçula correu em direção ao seu irmão mais velho.
— Irmão! — gritou o hibrido acorrentado, enquanto corria em direção ao seu companheiro. Seu rosto, que até então estava marcado pela alegria por ser liberto, mudou drasticamente para uma feição fazia, que não exprimia nenhum sentimento. — Irmão, me ajuda. — Essas foram as últimas palavras do jovem hibrido antes de desabar no convés do barco.